CANÇÕES / Setembro 2012
"California Boy"
Lil B
· POR Bruno Silva · 24 Set 2012 · 11:25 ·
Em 2008 e no seu ponto mais maníaco, o Lil Wayne faz algo tão desastroso quanto “Prom Queen” depois de alguns anos a espalhar genialidade e idiotice em igual medida em incontáveis mixtapes e álbuns. Não que isso lhe desse carta branca para atrocidades como Rebirth ou “She Will”, mas os devaneios de um louco são uma tradição secular que, não sendo desculpável pelo peso do legado precedente, tem o seu lugar nesse mosaico de desvios inusitados movidos pela força de um ego em constante fricção. Para já, e apesar de um trajecto curioso, o Lil B ainda não tem a cavalagem necessária para tais investidas. É uma persona intrigante, algo difusa nas suas premissas base – o que é mesmo o based world? - e com o devido rol de disparates a dar lugar a algum brilhantismo pontual. Depois do misticismo new age de Rain in England ou homenagens ao Elliott Smith, o auto-intitulado Based God deixa – suponho que por momentos – o rap para abraçar sem o mínimo de vergonha o seu lado indie em “California Boy”. Um exercício twee completamente imbecil, solarengo e cantarolável das piores formas possíveis, “California Boy” tem todo aquele ar de primeira tentativa de um qualquer miúdo que acabou de descobrir o Crooked Rain, Crooked Rain ou aquelas canções que ninguém se recorda do Frank Black. Mas consegue ser ainda do que isso, graças ao desconforto que é ouvir o Lil B a gaguejar linhas como ”I l-l-love you, yes I do”. Isto para não falar no quão deslocada soa qualquer tentativa de cantar. Sem especular muito sobre as razões que o levam a querer gravar um “disco de rock” - exercício de estilo? puro gozo? marketing? - “California Boy” só poderia ter algum valor enquanto piada. Com o problema acrescido de que, numa era de vídeos virais feitos ou não para esse efeito, esta canção falha redondamente em ser engraçada. Para isso, mais vale ler os comentários ao vídeo no Youtube ou, sei lá, a “Gangnam Style”.
"Flowers"
Andrew Ashong
· POR Rafael Santos · 21 Set 2012 · 23:15 ·
Quando se fala de Sound Signature, fala-se basicamente de Theo Parrish e do seu house enviesado, possuidor de um rico e complexo DNA tomado por todos clássicos soul jamais feitos. A sua ambígua abordagem ao género, tem – à semelhança de Moodymann – valido os mais apoteóticos elogios. E nem se trata de uma qualquer transcendente coragem em ignorar as convenções tipológicas ou procurar inovar só pelo simples sentido da palavra; trata-se sim – e para todos que se dedicam à arte, o principio nunca deveria ser abandonado – de seguir o instinto e permitir que os dedos esculpam formas determinadas pela impetuosidade da alma. O tema aqui em destaque não é assinado directamente por Theo Parrish. Andrew Ashong é o seu nome e é com "Flowers" que se apresenta formalmente no catálogo da Sound Signature. Ao fim da primeira escuta, difícil será ignorar o indelével toque na produção do mestre Parrish, a forma algo mutante como o baixo se arrasta sem parcimónia por um beat escaldante que convoca todos os espíritos do melhor groove planetário. Andrew Ashong não se podia apresentar melhor acompanhado num tema que tem uma cadência tão quente e sensual – incrível! –, absolutamente merecedora de um Verão caliente. Assoma-se a voz quente de Andrew, a discreta guitarrinha folk, reconfortantes teclados Rhodes e muita, muita vontade de distribuir a mais luminosa soul pelo planeta. Bela apresentação. Grande canção.
"Running"
Jessie Ware
· POR Paulo Cecílio · 21 Set 2012 · 23:14 ·
Há quem lhe chame a nova Sade – porque nem seria pop em 2012 se não existisse essa preocupação tosca com o passado – mas Jessie Ware merece mais que um mero rótulo, que a forcem a assumir uma identidade alheia; não só porque Devotion se revelou um belíssimo disco no seu todo como pelo fulgor de canções como “Night Light” e esta “Running”, justíssimo primeiro single do seu disco de estreia, onde encontramos a fórmula daquilo que define a sua música: sofisticada, elegante e plena de soul, seja através da sua voz ou do suave registo dançável, capaz de esbater – ainda mais! - a ténue linha entre o que é underground ou mainstream, e não precisando de gerar em seu torno discussões sobre autenticidade para que se fale sobre ela. Ware é para ser tida em conta não só neste como nos anos futuros.
"Angels (Four Tet Remix)"
The XX
· POR Simão Martins · 21 Set 2012 · 22:17 ·
Kieren Hebden, que usual e respeitosamente tratamos por Four Tet, tratou uma vez mais de retocar os XX, trio felizmente retocado em inúmeros remixes. Desta vez, em “Angels”, um dos temas menos interessantes do novo Coexist, Hebden optou por seguir de certa forma a orientação da banda, deixando-se embrulhar na sua electrónica orgânica mais intimista, com poucas ou nenhumas referências rítmicas, sendo ainda assim o suficiente para tirar os XX daqui para outro lado qualquer, dando-lhes atitude, à semelhança do efeito produzido por qualquer remix que lhes tenha sido feito. Four Tet é mestre na arte de samplar, sabe como ninguém (vá, Herbert, tu também) enveredar por texturas que parecem decalcar o paraíso ao milímetro e só isso chega para merecer a referência em dia de apresentação do novo look da webzine mais bonita do mundo.