RETRO MANÍA / Novembro 2015
Yasuaki Shimizu, disco à frente do tempo
· POR Nuno Leal · 30 Nov 2015 · 22:50 ·


Não vou ser snob e dizer que já conheço este disco há anos. Nada disso, conheci-o ontem, digging no youtube. Atrás da pista Yasuaki Shimizu e do disco com a capa do gatinho. Este:



Mas esperem, esperem lá, já o ouvem todo. Isto é para ler de uma assentada. Descrevo-vos o disco do gatinho. Kakashi . Arigato, arigatão. Uma pérola new wave japonesa com pistas que remontam a Peter Greenaway e à banda sonora do “The Pillow Book” – “Suiren”, logo o 1º tema – e um enigmático japonês que hoje faz jingles para TV e no passado trabalhou com Towa Tei, Sakamoto, Nam June Paik, Helen Merrill, Karin Krog, Van Dyke Parks ou Bill Laswell. Este portfólio impressionante não seria nada sem o gatinho de traços sonoros que nos levam a fazer a ponte direta entre umas notas de Curtis Mayfield versão dos Tuxedo Moon com os Tortoise (ouvir para crer: vão logo para os 4:30 na link em baixo). A colaboração impossível mas que à primeira audição irão vislumbrar o casamento sonoro perfeito. Claro que ao ouvir o disco todo haverá quem se lembre também de This Heat ao barulho, com muito dub-pan-mundialismo à la Hector Zazou e K. Leimer metido ao barulho também, melhor, à melodia. Mas nessa tarde nada longínqua (anteontem!) a maior surpresa estava para acontecer. Com um disco fabuloso assim, será que o Yasuaki tem mais? Hummmm... tinha uma banda antes... os Mariah... Ah, lembra logo Carey, nome engraçado... deixa ouvir, como é do mesmo ano, vai na volta é diferente, talvez punk ou industrial, será? Hummm... Não...Não... Nope...



É dope, porra. Lá vem o chavão do à frente no seu tempo mas desta vez não fui eu: mostrei isto a um colega de trabalho aqui ao lado que pensou que era uma derivada de Grimes ou assim. Não é de agora? Então?(...) 1983?!. Nunca mais o vi desde essa tarde. Provavelmente usou uma máquina do tempo e foi verificar. Bom demais para ser verdade, e é (ler “yeah!”). Não tenho em meu poder um LP que o comprove, apenas um CD carregado de música mais tribal, mais electro, ainda mais inesperada. E o sax marca presença nesta versão de YMO menos “yellow”, mais “dark”.



Tanta coisa indie japonesa de hoje encontra explicação nesta obra-prima de electro-pop psicadélica digna do Japrocksampler (não está lá, com 99% de certeza). No império dos grandes Haino, Hosono, Sakamoto, há Yasuaki, o Desconhecido. Um especialista em variações de Bach nos dias de hoje, que na altura criava esta mescla zigue-zagueana sonora pontuada ainda mais surpreendentemente com a voz de Julie Fowell, uma alma enigmática que de vez em quando debita em arménio (!) para o efeito pangea total. Globalização em CAN revertido (Japonês canta em japonês em banda alemã vs. Bifa canta em arménio em banda japonesa).



Software, Digital Dance
· POR Nuno Leal · 09 Nov 2015 · 15:08 ·


Os Software são Peter Mergener e Michale Weisser, um duo germânico muito interessante e bastante desconhecido (that’s how we like it!), que começaram a lançar peças de electrónica a partir do ano de Orwell e da Apple: 1984. No início, divididos entre se chamar Mergener & Weisser ou Software, trilharam caminhos Tangerine Dreamícos, como parte da herança hardware berlinense, nada fácil de fugir, ou não estivessem eles numa editora que lançava discos de Klaus Schulze, a Innovative Communication. Mas o ripa na rapaquecatrónico e raison d’être deste artigo é uma pecinha de 1988. Digital Dance . Aqui já assumida e enigmaticamente chamados de Software, fizeram talvez o primeiro artefacto vaporwave da história. Se por enquanto não o consigo provar, a verdade é que o que provei é saboroso.

Trópicos pixelizados de vai e vens marítimos infinitos banhando-nos os circuitos lounge dos neurónios, avenida plena de dopaminas sintetizadas. Sintetizadores, saxofone, percussão minimal. Um disco que é na sua essência e objectivo claramente à frente do seu tempo, numa altura onde o ambient caminhava entre folclores new age umas vezes bem, outras mal, e o techno implodia dentro da cena industrial e noise, a caminho de uma década minimal e raver (os noventas). Em 1988, as bandas sonoras dos jogos também eram apenas bandas sonoras de jogos, e ainda não se apreciava tanto ficar a olhar de cocktail na mão para um electrodoméstico horas a fio a funcionar como hoje.

Contemplar uma ventoinha incansável num dia quente de Miami terra de Vice, oh panca nossa de hoje. Na altura não. Era apenas pormenor de uma série fixe. Hoje, retromaníacos deste e de outros mundos, é um pormaior como dizia o outro. Se Vektroid, James Ferraro, Saint Pepsi, Oneohtrix Point Never, Sun Araw, Com Truise, entre outros, alimentaram o estilo cunhado por Vaporwave com base em premissas retro de recuperação de imaginários digitais e yuppies oitentistas, no fundo, é exactamente a música deste duo Software que recuperaram. Sem este Software, de 2010 em diante não teria sido a mesma coisa e com esta me evaporo...



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