DISCOS
Matt Sharp
Matt Sharp
· 19 Mar 2005 · 08:00 ·
Matt Sharp
Matt Sharp
2004
In Music We Trust


Sítios oficiais:
- Matt Sharp
- In Music We Trust
Matt Sharp
Matt Sharp
2004
In Music We Trust


Sítios oficiais:
- Matt Sharp
- In Music We Trust
Há pitada de sebastianismo na quebradiça aura que envolve Matt Sharp. Ele que se costumava perder nas noitadas das grandes cidades turísticas de Espanha, parece também ter perdido o rasto ao sexto sentido pop que fez dele co-autor de dádivas como Weezer (Blue Album) e Pinkerton (onde as evidências do seu contributo são ainda mais notórias), enquanto baixista dos Weezer. No período intercalar que separara os dois discos, Sharp – na companhia de Petra Haden das simpáticas That Dog. – encontrou escape criativo na new-wave solarenga dos Rentals, que lançaram em 1995 o promissor debut The Return of the Rentals pela Maverick. O que parecia ser apenas um “affair” de uma só noite acabou por abalar o matrimónio Rivers Cuomo / Matt Sharp, agravado pela prematura estigmatização de Pinkerton (mal amado à nascença, hoje aclamado como farol de um novo EMO) e irritante sucesso das faixas de Return que vinham merecendo cerimónias de single.

Sucedeu-se um meio-eclipse (em tudo semelhante ao que ameaça actualmente os Blur), a disputa de egos afastou Matt Sharp dos Weezer e o segundo disco dos Rentals tropeçou na sombra de conquistas recentes, apesar de contar com a participação do Excelentíssimo Damon Albarn. Insatisfeito, o ex-baixista dos Weezer fez-se à estrada e partiu em busca da quimérica essência que serve de norte aos bardos dos tempos modernos. Passou de iluminado a exilado. A estreia (se excluirmos o EP) homónima é produto de cinco anos a preto-e-branco passados em Leipers Fork, Tennessee.

Vede-se a arame floreado a entrada aos que até aqui vêm na senda dos irresistíveis iscos que, noutros tempos, Matt Sharp lançava ao mar auditivo. Distante vai o tempo áureo dos refrões batráquios, agora é tempo de procurar no brilho da fogueira e no odor do feno inspiração campestre que permita a Sharp transpor para o disco o moroso processo de digestão emocional que o manteve em cativeiro no Tennessee. Sobram do passado a omnipresença do encanto californiano e a amena temperatura de um registo musical que nunca desce abaixo dos 32 graus Fahrenheit. Tudo o resto muda. O arco revela-se ascendente no que a intensificação de intimidade diz respeito e, dependendo de cada apreciação, descendente na perspectiva da pertinência e potencial de singrar na sobrepovoada área do “songwriting”. Matt Sharp esforça-se demasiado em dar a ver os poros da sua nova pele de herói romântico.

Ainda assim e apesar de todos os “rodriguinhos” que traz cravados à superfície, Matt Sharp aparenta a grandeza dos discos laborados com inofuscável paixão. Surge como sintonia ideal para guiar os passos dos sonâmbulos diurnos. Sharp conhece bem os mecanismos do conto (“Thoghts From a Slow Train” é postal “beat”) e sabe como projectá-lo no pensamento de quem escuta. Conhece também a melhor forma de insinuar a presença do piano e guitarra acústica sem sufocar a respiração da mencionada apetência para a narrativa. Onde falha então o músico? A cada escuta adicional. Já percorri o disco umas sete vezes e somente “Goodbye West Coast” (que já conhecia lugar no EP Puckett's versus The Country Boy) se salienta de todo um conjunto que, quando não satisfaz os padrões minímos de exigência, chega a ser redondamente aborrecido.

E escreve um incondicional acólito dos Weezer e partidário da teoria de que o adeus de Matt Sharp foi fatal para a carreira da banda que o tornou famoso. O percurso musical do desertor encontra paralelo no encadeamento de três bebidas muito apreciadas: Coca-Cola, Vodka Limão e o Whisky Jack Daniels. Agora resta-nos esperar pelo envelhecimento da terceira.
Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com

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