DISCOS
Tobacco
Maniac Meat
· 05 Jul 2010 · 23:06 ·
Tobacco
Maniac Meat
2010
Anticon


Sítios oficiais:
- Tobacco
- Anticon
Tobacco
Maniac Meat
2010
Anticon


Sítios oficiais:
- Tobacco
- Anticon
Morte por afogamento em sundae de caramelo psicadélico. Beck faz uma perninha quase inútil.
Os grandes álbuns feitos a partir de vastas colecções de discos devem ser sempre ligeiramente estúpidos para que não pareçam demasiado sábios. Além da extraordinária vitalidade psicadélica que apresentam, Paul’s Boutique (1989), dos Beastie Boys, Odelay (1996), de Beck, e Beauty and the Beat (2005), do desvairado Edan, mantêm algo mais em comum: todos envolvem um certo grau de estupidez como ingrediente. Os primeiros dois partilham também da produção dos Dust Brothers, que, na penumbra e ao lado do génio Matt Dike, muito contribuíram para que algumas franjas musicais (o mais esclarecido hip-hop branco principalmente) entendessem o enorme valor que o psicadélico podia desempenhar em discos de absoluto entretenimento. A pergunta torna-se inevitável: existirá maravilha mais divertida que Paul’s Boutique?

As respostas para Paul’s Boutique conhecem livros inteiros e a atenção de vários teóricos. Por agora, o disco que deve avançar na inspecção é Odelay, até porque já empregava em 1996 tudo aquilo que faz mexer este Maniac Meat, o segundo dessa misteriosa figura que é Tobacco (ou Tom Fec). Ou seja, a ponte entre os dois álbuns faz-se com breakbeats desavergonhados, a dose certa de cretinismo e uma alegria generalizada na pilhagem de ouro psicadélico espalhado pelas tais colecções de discos. Tobacco explora os limites shoegaze do hip-hop (ouvir para crer) e espera que as canções apareçam por obra da santinha num processo vagamente absurdo. Mas Maniac Meat tem um cobertor curto para o tamanho dos seus pés, e, a partir de certa altura, arrasta como pode os seus mil vocoders e sintetizadores pelo corredor de uma segunda metade realizada em puro estado vegetativo.

Não é de admirar que Beck participe fugazmente (2 faixas de 2 minutos) num disco que recebeu o seu apadrinhamento espiritual há muito tempo. Com tantos discos de versões por fazer, Beck não tem muito tempo a perder em Maniac Meat: dá-lhe forte no flow fragmentado que rasga o fuzz de “Fresh Hex” e é só mesmo um fantasma de passagem em “Grape Aerosmith” (onde a sua voz soa a sobra de Modern Guilt). É muito pouco. O “olá e adeus” de Beck não chega sequer para fazer esquecer a pouca substância de um objecto de laboratório que podia muito bem ter permanecido na gaveta.

Isto também acontece porque Maniac Meat sofre de uma doença que se alastra a grande parte do catálogo da Anticon (hip-hop futurista agora condenado ao passado): é um disco evidentemente deslumbrado consigo próprio e disposto a morrer por via da saturação que produz. Além disso, os recursos e adjectivos utilizados para descrever Tobacco não diferem assim tanto dos que possam recair sobre um disco de Black Moth Super Rainbow (o colectivo mais sonhador e menos hip-hop de Tom Fec). É extremamente difícil perceber onde acaba a gula psicadélica de Tom Fec e começa a sua capacidade de escrever canções ou armar uma excelente melodia. A estupidez é um utensílio, mas há que saber aplicá-lo.
Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com

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