DIA 1 |
Sentimos a brisa, as bandeiras ao vento e, desorientados, perguntámo-nos se, para lá da nossa percepção, um rei estaria a observar-nos ou se ele iria desencadear alguma batalha.
A irregularidade do piso para dançar salta à vista, eu temo os desníveis. A decoração do castelo é deveras singela, a iluminação a cargo de projectores, carpetes vermelhas, um espaço feito de plástico transparente (D-Latex) e extensões a apontar para o mar.
Apesar das dimensões do castelo falarem mais alto, é motivo de alegria o plantel promissor mas reduzido de bandas de alto calibre.
Nota dissonante: o WC constituía uma réplica quase perfeita do filme “Westward the Women”, com efeitos fantasmagóricos cada vez que alguém pressionava o botão do secador eléctrico das mãos.
TRADUÇÃO Helder Gomes
01/08
Pós-rock: uma designação pequena
para uma noite variada
Notes
to Myself
Os
espanhóis e estreantes Notes to Myself apresentaram guitarras, ritmos
e melodias, cumprindo com dignidade a função para que tinham sido
destacados: a inauguração do Avant 003 no Castelo de Sohail. O
aperitivo rock-clássico-contemporâneo foi bem servido.
Velhocido
Elegância,
evocação, desafio da beleza? São, entre outros, os postulados
com que estes três rapazes albergam e fazem apelo ao trabalho que desenvolvem
com a sua música.
O vídeo que exibiram durante a actuação foi, no mínimo,
revelador. Um primeiro plano das suas faces, vistas num alargado modo traveling
focado a partir de perspectivas distintas, gestos frios e acres, em consonância
com um estilo experimental há muito do meu agrado.
A
formação espanhola, perita em mesclagens difusas, deixou-nos com
vontade de pedir de novo o menu e analisar à lupa os ingredientes deste
misterioso prato que degustámos.
Hood
Talvez seja esta, para os Hood, a forma mais simples de prestar homenagem a tão brutal descarga de melancolia, aos reflexos da sua Yorkshire natal, o seu habitat natural, a sua fábrica de música.
Pouco importa que sejam incluídos na expansiva onda do pós-rock. Os Hood soam a Norte, a sol tímido, a casas sem aquecimento e a janela que filtram um frio danado. Guitarras dissonantes, mesclas de instrumentos pouco frequentes, uma voz seca e ecos inquietantes situam-nos no extremo de um vanguardismo intangível, delimitado por traços grossos, como as texturas de Munch. As projecções que escolheram para a sua actuação evocavam a sensação circular de infinita tristeza dos Invernos ingleses.
Tortoise
Ali, nada estava fora do sítio e respirava-se o entendimento e a coordenação admiráveis. O desfile de luzes e sombras, para os que desfrutavam de um bom enquadramento, conduziu-nos a um dos momentos de maior tensão de todo o festival. Uma jornada mística digna de um capítulo memorável de um bom livro de ficção científica. John McEntire, o líder da banda, pode sentir-se satisfeito.
Mogwai
Assistimos à estreia em Espanha do novo disco “Happy Songs For Happy People”, de que chegam ecos de decepção de muitas frentes. Assimilados estes rumores, pudemos desfrutar das suas guitarras torrenciais, cadentes e melódicas.
Os Mogwai desconjuntaram-se em sugestivos e húmidos movimentos, semelhantes a pequenas descargas eléctricas. Este pequeno aprendiz de masoquista esqueceu-se do tempo, prolongou o concerto e adormeceu uns quantos da assistência, feito que poderá juntar à sua lista de execuções enquanto mago da sugestão.
Para os Mogwai nada disso importa, nem para os que os consideram droga dura que não bate. Eles parecem dispostos a tudo e, para todos os que os viram num contexto exclusivamente musical, foi unânime a crença nos seus incríveis e fulminantes poderes anestésicos.
antonia@bodyspace.net
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