Optimus Primavera Sound
Parque da Cidade/Casa da Música, Porto.
07-10 Jun 2012
“Com ou sem chuva, vamos divertir-nos”, disse Jerry The Cat ao iniciar o concerto dos Gala Drop no Domingo. Claro que nunca seria possível fazer uma grande festarola com aquele tempo, e inclusivé os Gala Drop não são propriamente um Manu Chao ou uns Buraka Som Sistema. Não deixam, ainda assim, de ser um óptimo convite à dança, graças a uma música que explora sabiamente os espaços por onde colocar o ritmo, quer seja mais krautrock/motorika, psicadélica ou de paladar tropical. Não há aqui qualquer ímpeto mais pós-rockeiro ou IDMico. Se há um ponto cinético a atingir, é para lá que se segue de imediato. Desejamos-lhe melhor sorte com o tempo nas próximas edições, porque cheira-nos que vão voltar. Nuno Proença

Com a chuva que atingiu em força o Parque da cidade no terceiro dia de festival (daquela forma que só o Porto sabe chover), a Palco Club tornou-se especialmente desejado. Foi lá que deu para bater o pé com o rock ‘n’ roll dos espanhóis Mujeres apesar de ainda viajar pela memória a intensidade dos The Oh Sees na noite anterior. Pode parecer estranho, mas foi apenas simpático passar meia hora a ver mujeres. Também foi na Tenda Palco que foi apenas simpático ver Veronica Falls não cair mas também não sair do sítio. O rock destes britânicos é demasiado certinho e formatado para deixar memórias muito profundas.

Debaixo de uma chuva insistente, os Spiritualized subiram a palco e com “Hey Jane” quiseram dizer a todos que aquilo que fazem é demasiado intenso para desaparecer com o tempo. Com disco novo, os Spiritualized foram aquilo que sempre são: veículo prioritário para testemunhar o doce encontro do rock espacial com a soul e o gospel – “vocês sabem do que eu estou a falar”. Jason Pierce não engana. Dadas as circunstâncias, dá vontade de rir quando se ouvem os primeiros acordes de “Lord Let It Rain On Me” mas o que vem a seguir é demasiado sério para brincadeiras. O único problema é a duração da coisa: é verdade que Ladies and Gentlemen We Are Floating in Space, e etc., mas passada uma hora a viagem acabou e deu vontade de pedir o livro de reclamações. Mesmo com “Come Together” já no bucho.

Spiritualized © Angela Costa

O caos foi-se instalando com a ajuda da chuva. A luta pelos impermeáveis tornou-se feia, os Death Cab For Cutie cancelaram o concerto (ainda não se percebeu totalmente porquê), James Ferraro desapareceu em combate. Quando a chuva parou, os I Break Horses convenceram bastante povo a arriscar nova molha com canções como, ironia das ironias, “Winter Beats”. O que deu para ver deixou na boca apetite para mais. E por falar em apetite, sobretudo perante a excitante mixtape House of Balloons, tornava-se irresistível ver como seria The Weeknd ao vivo e como é que Abel Tesfaye se safava a gerir as duas mixtapes menores que se seguiram à estreia. E a verdade é que não se safou nada mal. É certo que o alinhamento não teve nada tão entusiasmante como “High for this”, “House of Balloons / Glass Table Girls” ou “The Morning” (colheita House of Balloons), mas o todo teve a intensidade certa e uma banda que deixou-nos cair em tentações mas livrou-nos do mal (desculpem qualquer coisinha) que deu para adivinhar Youtube fora. Apesar de todos os receios, a estreia de The Weeknd merece nota acima da média. Às vezes deu vontade que as batidas tivessem a força que se ouve em disco (algo que nem sempre conseguido pelo banda que acompanhou Abel Tesfaye), mas deu para bater.

The Weeknd © Angela Costa

E agora algo completamente diferente. Enquanto os Kings of Convenience abriam o seu simpático cancioneiro para muito milhares de simpatizantes, os Dirty Three confirmavam o Palco ATP como o mais arrojado e desafiante dos palcos. Warren Ellis, Mick Turner e Jim White surpreenderam a todos os níveis. Não que não se soubesse que construíram uma carreira de belíssimos discos (o último, Toward the Low Sun, não é excepção). O que não se sabia é que um concerto do trio australiano pudesse ser tão intenso, tão ruidoso, tão memorável. Warren Ellis é um espectáculo dentro do espectáculo: salta e levanta a perna no ar, conta histórias mirabolantes, deixa-te no palco. Não deu para perder um segundo daquela hora; nem para atender a necessidades biológicas prementes. Arredar pé daquele palco seria deitar fora segundos preciosos de alguma melhor música que se fez no Parque da Cidade durante aqueles três dias. Quem sabe nunca esquece, e quem viu os Dirty Three naquela noite dificilmente esquecerá.

Dirty Three © Angela Costa

Dirty Three © Angela Costa

Ouvir o concerto de Forest Swords no mesmo Palco ATP não foi tarefa fácil, muito por culpa da batida dançante dos Saint Étienne que vinha do Palco Primavera. E está aqui uma das arestas a limar na próxima edição: os palcos estão demasiado próximos e por vezes, quando o peso sonoro é demasiadamente desnivelado, isso torna-se evidente. Diz que até os Kings of Convenience se queixaram disso ao vivo e em directo. Apesar disso, os Forest Swords, um dos maiores OVNIs do Primavera Sound, confirmaram o estatuto de surpresa e assinaram um concerto interessante na gestão de uma massa sonora algo inclassificável mas sedutora. Imaginem um sítio onde se encontram batidas, drones de perder a vista, guitarras lânguidas e vozes mergulhadas em delay. É cerebral sem ser aborrecido, e expansivo sem ser dançável. É música estranha e apetecível. É um enigma a ser confirmado em episódios futuros.

Forest Swords © Angela Costa

Eram já perto das 2 da manhã quando os “favoritos” The XX subiram ao Palco Optimus para euforia generalizada do público que os escolheu para fechar a noite. Do que deu para ver, foi possível confirmar a pouca profundidade camuflada de minimalismo das canções dos britânicos: soa tudo muito bem, é tudo muito atraente, mas também incipiente, aborrecido e qualquer tipo de chama. Pelo menos até ao primeiro disco. Quem também tinha disco de estreia para apresentar no Primavera era John Talabot, um músico residente em Barcelona que tem em ƒin um dos melhores discos lançados em 2012. Ao início do concerto (Talabot apresentou-se em formato live com Pional) o Palco Club tinha apenas umas dezenas de pessoas: mas depois aquela música extremamente física e sensorial foi ganhando o seu espaço e o público foi chegando trazido pelas batidas esclarecidas e pelas ambiências exuberantes.

John Talabot © Angela Costa

É certo que, à semelhança do que acontece no seu disco de estreia, foi com “So will be now” que a actuação de John Talabot atingiu o pico de satisfação, mas tudo o que se ouviu durante aquela hora confirmou a elegância e o apuramento estético de ƒin. Perante toda aquela música negra e densa, o público que escolheu ver John Talabot respondeu da única forma possível: com sorrisos intermitentemente escondidos pelas luzes e com a celebração que ƒin exige. No fim, ficou no ar aquela sensação inevitável de prazer “queimado”, de luxúria, de êxtase gasto. Tal como na primeira e na segunda noite, o Primavera Sound soube fechar em nota alta. Fechar como quem diz, uma vez que DJ britânico Erol Alkan deu música até ao nascer do dia. André Gomes
· 13 Jun 2012 · 00:49 ·

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