DISCOS
Cave In
Perfect Pitch Black
· 16 Nov 2005 · 08:00 ·
Cave In
Perfect Pitch Black
2005
Hydra Head


Sítios oficiais:
- Cave In
- Hydra Head
Cave In
Perfect Pitch Black
2005
Hydra Head


Sítios oficiais:
- Cave In
- Hydra Head
Já sabemos que bom filho à casa torna, mas fica por esclarecer o destino reservado para o filho que um dia virou às costas a quem o viu crescer para sozinho rumar a uma quimera de ouro. Os Cave In cumpriram o percurso do rebelde que, com as suas primeiras demonstrações, reuniu sólido culto, para depois o alienar com o pulo para a major RCA (onde lançaram um Antenna que, inexplicavelmente, lhes valeu lisonjeiras comparações aos – respire fundo – Radiohead circa – expire fundo - OK Computer). Agora o rebelde permanece às escuras numa encruzilhada onde o futuro incerto o impede ver um palmo à frente do nariz. Confuso, ensaia à porta do lar um discurso que expresse um pretexto convincente para a atitude tomada há uns anos. Os Cave In de hoje são uma grotesca figura bicéfala (que contrapõe as esperançosas vocalizações asa-delta de Stephen Brodsky ao grunhido laminado do baixista-vocalista Caleb Scofield) e Perfect Pitch Black uma fábula horrenda para ler a meninos com medo do nu-metal-papão.

Quando é o mais puro dos desleixos a sabotar a feitura do objecto, não há justificação possível para o descalabro. Quando há uns anos o público português se ressentiu da provocação invisual de Branca de Neve (o maldito filme de João César Monteiro que durante raros momentos exibia outra imagem que não um mosaico totalmente negro), houve um ou outro déspota que se deu ao trabalho de vir para a praça pública teorizar sobre as mudanças de tonalidade no negro absoluto do polémico filme. Não ter alegado que o sotaque brasileiro coincidia com uma maior intensidade do negro ainda salvou esses senhores do ridículo. Infelizmente, nada parece salvar Perfect Pitch Black do desespero em que mergulhou com a sua variância espalhafatosa de registos. O Bodyspace atribui menção honrosa a quem surgir com uma explicação capaz de resolver o enigma “Porquê o sumiço do equilibrante uivo gutural na segunda metade do disco?”. Culpem as obrigatoriedades do conceito. Branca de Neve ainda conseguia ser um capricho de autor. Perfect Pitch Black é o prenúncio de um colapso que fará a terra finalmente desabar sobre a cave.

E nestes casos sobra sempre um bom riff para constar no epitáfio. Lá se encontra lapidado o riff de “Off to Ruin”, que chicoteia o disco até à ruína. Aquela que se escuta a “Paranormal” – Liam Gallagher (por aproximação entre a sua e a voz de Brodsky) num violento episódio de Ficheiros Secretos alongado até à marca tortuosa dos sete minutos - e “Tension In The Ranks” – valsa estilizada pronta a vender a alma ao demónio por um dedo de Maynard James Keenan (ele que tão bem sabe insuflar o metal com credibilidade arty). Espera-se dos Cave In uma vontade de renovar que os leve a articular o disco com algum arrojo, mas aconselha-se uma medição ponderada ao passo a dar para que os autores de Antenna não tropecem na pretensão do exercício.

Após a curta digestão, sobra a fome. A mesma que ronca quando a miopia de recursos nada encontra ao breu indistinto. Ironicamente, Perfect Pitch Black representa na exactidão o que designa o seu título: um buraco-negro de boas intenções e fraca execução das mesmas.
Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com

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