Festival da Ilha do Ermal 2004
Vieira do Minho
25/27 Ago 2004

Reportagem de Pedro Rios
Fotografias de Carlos Oliveira

25/08

Crónica do vale negro

Chegar ao festival da Ilha do Ermal não se revelou fácil. Ou melhor, o trajecto é simples, mas um pedido de explicação a “local people” (à la Britcom) revelou-se complicado. O atraso já era assinalável e aumentou consideravelmente. Resultado: escriba e fotógrafo chegam ao “vale negro” (as t-shirts, as barbas, o espírito) atrasados, a tempo apenas de apanhar algumas canções dos Soziedad Alkoholika.

O Ermal é um festival diferente. A homogeneidade cromática supra-referida é apenas parte dessa diferença. Tudo ali respira distorção e isso não é especialmente bom. Aquele local (o rio, as montanhas, o pinhal denso) merecia um festival para mais gente e menos exclusivo. À falta de outros passatempos – há apenas meia dúzia de tendas e havia um carro para transportar de volta a casa -, podemos sempre dedicarmo-nos à detecção das diferentes faunas.

Num festival “generalista”, as faunas vão desde o freak (espécie super abundante e que parece surgir, como cogumelos, por estas ocasiões), ao betinho (nova espécie em festivais de Verão; faz-se acompanhar de produtos de beleza e usa sandálias havaianas; fuma charros uma vez por ano) e, obviamente, o bom velho punk sujo e o metaleiro de barriga farta.

No Ermal, reduzimos o âmbito de análise para um único género: o metaleiro e as suas variadas espécies. Com a globalização do metal via MTV, assiste-se a uma democratização do género. É fácil ter os acessórios, fazer os símbolos, sacar os álbuns da net. Neste Ermal, pude encontrar novos espécimes, entre um clone de Chester Bennington dos Linkin Park, para além dos novos meninos bonitos do emocore (entre o povo descortinei a trupe More Than a Thousand).

Bem, mas vamos à música.

Primitive Reason
Os Primitive Reason são um caso crónico de meio termo. Em disco não são maus, mas ao vivo perdem-se entre metal grunhido, reggae mal feito e tribalismos chatos. “Shadowman”, por exemplo, perde a força dançável que tem em disco; “Hipócrita” é uma sombra do que era nos tempos de Brian Jackson e “Kindian” torna-se rap-rock desinteressante. Mesmo assim, os Primitive Reason conseguiram levantar algum pó no mosh pit.

Malevolent Creation
Clássicos do death metal, os Malevolent Creation deram o concerto que arrisca ser o mais pesado do certame. A receita é a do costume: riffs técnicos, descargas de agressão, urros/guinchos, bateria complexa com pedaleira dupla. Brett Hoffmann berra muito bem, há que dizê-lo, mas ao fim de mais de uma hora o death metal brutal, sem espaços para outras aventuras, cansa.

Ratos de Porão
Ratos de Porão é puro entretenimento. Fazem um som tão quadrado – punk/hardcore e crust à velocidade da luz, com alguns riffs mais metaleiros – que é extremamente previsível. E isso funciona a favor deles: abana-se o rabo, mexe-se a tola, espreita-se o mosh pit (totalmente de loucos), vê-se pessoas a aterrar redondas no chão depois de voar (oh!). O povo sabe as letras de cor. Há clássicos como “Crucificados pelo sistema”, “Beber até morrer”, “Aids, Pop e Repressão” e o tema “Caos” (nove segundos de “caooooos”). Gordo está mais magro, mas continua a criticar o que vai mal no Brasil (e no Mundo, já agora). Conclusão: "Ratos é foda", como eles dizem.

Moonspell
Em dia de aniversário (“30 invernos”, disse ele), Fernando Ribeiro e os seus Moonspell deram um concerto memorável. A maior banda de metal portuguesa visitou a sua longa carreira, com destaque para o último disco The Antidote, porventura o álbum mais rock e menos gótico (menos teclados, mais guitarras e riffs potentes). “In and above men” e a sequência (como em disco) “From lowering skies” abriram o concerto. O hino metaleiro português, “Alma Mater”, arrancou a primeira ovação. Depois há uma série de clássicos: “Vampiria”, “Opium”, “Mephisto” e a fechar, antes do encore, “Full moon madness”.
· 25 Ago 2004 · 08:00 ·
Pedro Rios
pedrosantosrios@gmail.com
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