ENTREVISTAS
Equations
Pesar o Sssooolll
· 12 Jun 2015 · 15:06 ·
Olha para eles tão crescidos: ainda ontem eram jovenzinhos aprumados, cabelinho cortado, barba feita; hoje são rockers saídos dos anos setenta, dos excessos não só das drogas mas também dos sons - Hightower, o segundo disco dos Equations, abandona a bojarda math rock e hardcore assinalada em Frozen Caravels e transforma-se num disco prog para acabar com todos os discos prog... ok, exageramos: mas o que é certo é que o quinteto já não é, como se ouvia há tempos num vídeo gravado à porta do Ateneu, "execrável". São grandes, muito grandes, quase tanto como "SSSUUUNNN", a faixa onde quebram e requebram o ritmo e acabam a acelerar como nunca o haviam feito. Estes são os Equations em 2015 e nós não os merecemos.
© Vera Marmelo
Quando é que o Zezé é canonizado pelo Papa?

Vítor Barros: [risos] O Zezé já estava à espera destas merdas da Internet...
Zezé Cordeiro: Deixem-me em paz!

Os Equations são pessoas religiosas?

Zé Pedro: Não.

Nunca foram baptizados?

VT: Sim... aliás, pelo menos três quintos desta banda tiveram educações católicas, mesmo a sério.
Bruno Martins: Com reguada...
VT: Imagina o catolicismo naquela freguesia do Minho... nós ainda ligámos muito à Páscoa, e essas merdas.

Usam terços, alguma coisa do género?

Zezé: No carro, só...

À emigrante?

VT: Sim, aquela moda da t-shirt em "V" e terço...
Bruno: Essa moda é muito fixe...

Portanto este disco não é sobre Deus, é sobre o Carl Sagan.

VT: Se é a mesma coisa, sim.

Com que naturalidade é que passaram de um disco mais virado para o math rock e para o hardcore para uma coisa mais prog?

VT: Bastante, acho eu.
Zezé: Muita.

O bichinho de fazer uma coisa mais... não diria "adulta", mas existe essa noção de que o punk e o hardcore é uma coisa mais juvenil e o prog é mais para adultos. Sentem-se mais adultos do que há três anos atrás?

VT: Sem dúvida. Mas em todos os aspectos.

Até porque deixaram crescer o cabelo.

VT: Também.
Bruno: E não só... isso é o principal.
VT: Em primeiro lugar, o Frozen Caravels foi um disco que saiu em... 2010, não foi? [n.a.: 2012, pela Lovers & Lollypops] Mas que já tinha muito mais antiguidade do que isso. Já tinha dois ou três anos [no que diz respeito aos] temas.
Zezé: Inclusive antes de eu e o Gonçalo [Duarte] sequer entrarmos.
VT: Exacto, ainda com um membro antigo. Portanto, desde esse momento até ao Hightower, se tu fizeres as contas passou quase meia década.

Isso quer dizer que o passado é para renegar?

VT: Não é para renegar...

Mas vocês não têm tocado esse material ao vivo.

VT: Ao vivo renegamos, sim... mas é por uma questão de logística; aliás, eu acho que nós nunca conseguimos concretizar bem o Frozen Caravels ao vivo.

© Vera Marmelo

Sim, eu recordo-me que em termos de qualidade de som, vi p'raí um bom concerto vosso... mas agora têm aqui um técnico de som [n.a.: Luís Lucena, que é lindo e charmoso] a tratar disso.

VT: Sim, o Lucena viu muitos concertos maus nossos...
Luís Lucena: Não vi muitos concertos maus vossos...

Foi mais difícil trabalhar no Hightower que no Frozen Caravels? Em termos de gravação, de composição...

Zezé: Foi muito diferente. O Frozen Caravels foi uma cena muito espontânea.
VT: E muito mais a três do que a cinco. Aliás, foi um processo bastante a três: antes do Zezé ter entrado na banda, eu, o Bruno e o Zé Pedro ensaiávamos no Stop, onde compusemos os temas que depois saíram no Frozen Caravels. O Hightower já é uma coisa muito mais pessoal, de nós cinco.

Já têm mais facilidade em juntarem-se os cinco? Continuam a morar longe uns dos outros...

Zezé: Sim, mas a facilidade é relativa...
VT: Para este disco, compusemos algumas bases, depois o Gonçalo veio [ao norte] uma semana inteira, esteve a trabalhar connosco, acrescentou as partes dele, refizemos partes... acho que conseguimos [criar] essa facilidade e ao mesmo tempo conseguimos dar um cunho pessoal, um cunho de cada um de nós, ao disco. Que é uma coisa que não tinha acontecido com o Frozen Caravels.

Onde foi gravado?

VT: Nos Estúdios Sá da Bandeira [Porto].

Quatro anos após o vosso documentário, mudou alguma coisa na situação carrosseleira em Portugal?

VT: Já teve dias melhores...

Para quando uma actuação nas festas de São Mamede do Coronado?

VT: Já aconteceu!

Mas não foi a abrir para Nel Monteiro...

VT: Não... foi no dia de "variedades".
Zezé: Mas nós agora estamos a ensaiar num edifício da junta de freguesia, portanto...
Bruno: Brevemente, tencionamos abrir um concerto do Marante.

É o artista pimba para quem gostariam de abrir?

Bruno: Sim.
Zezé: Ainda temos que seleccionar...

Porque é prog?

Bruno: Porque é o Marante, claro. E porque é prog... e tem sentimento. Acima de tudo tem muito sentimento. É um artista que sabe colocar sentimento na música que faz.

É o mesmo sentimento que colocas na tua voz?

Bruno: Sim. Penso constantemente em Marante.
VT: Saiba que o meu grande amor hoje vai-se casar / Mandou uma carta p'ra me avisar...

Com esta mudança estética, vão deixar de ter gente nua em cima do palco?

VT: [É algo] Muito improvável de acontecer... mas, quem sabe.
Bruno: Já na altura foi um raio de luz que apareceu ali...
VT: Sabes que a cada dia que passa o Zezé está mais livre...
Zezé: Não ponhas isso na entrevista... [n.a.: claro que pus, porque sou uma besta]
Lucena: Acho que o problema não é a mudança nos Equations, é a mudança no público.

Sentem que conquistaram um público diferente, ou um novo público, com este disco?

VT: Acho que há mais pessoas a ouvir o Hightower, mas ao mesmo tempo não alienámos o nosso público antigo. Aconteceu, se calhar, num ou noutro caso pontual.

Preferem o público do sul ou o público do norte?

Zezé: Gostamos de toda a gente.
Lucena: Querem que me vá embora para responderem a esta pergunta?
VT: Nah, o Gonçalo está aí...
Zezé: Margem sul!

Vão ter quatro datas a sul: Lisboa, Cascais, Setúbal e Beja. No caso particular do Hightower, acham que obtêm um melhor som ao vivo num sítio mais pequeno como o Musicbox ou num festival ao ar livre como o Summer Fest?

VT: Pá, soa melhor num estádio.

Em que estádio é que gostavam de tocar?

VT: Todos.

Filho da puta, devias ter respondido "Dragão"!

VT: Todos, menos a Luz!
Zé Pedro: Todos os estádios, todos os estádios...
Zezé: Todos os estádios do Euro 2004...
Bruno: Eu gostava de tocar no de Aveiro, porque é arrojado...

...por outro lado, não terias lá ninguém a ver.

Bruno: Sim...
Lucena: Têm o de Braga, entre as montanhas...
Zezé: O de Guimarães esteve no Euro 2004?
Bruno: Claro que 'teve. Não me desrespeites.
VT: Sabes que o Bruno jogou no Guimarães, e isto há aqui algumas tensões...

Em que posição?

Bruno: Médio-avançado.

Tipo o Deco?

Bruno: Só que melhor... [risos]
Zé Pedro: Número dez...
Bruno: Fui lesionado e desisti de jogar futebol... por causa de um jogo contra o Braga! Daí que eu e o Zezé, ao início, tenhamos tido uns problemas...

© Vera Marmelo

Podias ter sido uma grande estrela e agora estás aqui a tocar prog...

VT: ...já o Helton podia ser uma grande revelação musical e está a jogar futebol...

Que ideias estiveram por trás da BD?

Gonçalo Duarte: O Bruno pensou numa história para acompanhar a narrativa do álbum... e eu, que estudo BD e ilustração, [achei que fosse] um projecto interessante, na altura, até mesmo para a escola.

Tens alguma influência de maior, no que toca ao desenho?

GD: Tento sacar tantas influências que nem te sei responder... cá em Portugal tens tantos ilustradores fixes, pessoal que faz BDs fixes, que às vezes até parece que essas pessoas que te são mais próximas são a maior influência que tens. O João Afonso, o Rudolfo...

Mas vocês lançaram a BD separadamente do disco... nunca existiu a ideia de juntarem as duas coisas?

GD: Nunca pensámos nisso.

A BD deve ser encarada como uma coisa indissociável do disco ou é algo diferente?

Zé Pedro: Acho que no fundo é uma ilustração [da narrativa] do Hightower.
VT: A capa do disco foi desenhada pelo João Maio Pinto, e [achámos que] seria um bocado complicado estar a juntar um trabalho dele com um trabalho do Gonçalo... especialmente quando a BD saiu um pouco depois do lançamento do disco físico em si. Portanto, não são indissociáveis - como o Gonçalo disse, o Bruno criou uma narrativa que vai do início ao fim do álbum. Ele tentou ilustrar isso ao mesmo tempo que o Bruno a desenvolveu. Não de uma forma lírica, aplicável em canções, mas dentro do formato BD.

Porque é que só editaram o Hightower em vinil e digitalmente?

Zezé: Porque o CD 'tá morto.
Bruno: Ninguém compra CDs...

Ninguém vos comprou o Frozen Caravels?

Bruno: Pá, vendemos uns cinco... havia um no Olx a 3,5€!
Zezé: Eu comprei-o! Estava a 50 cêntimos!
VT: Estava a haver um dumping de preços de mercado e o Zezé teve que meter mão nisto...
Zezé: Estava a 50 cêntimos, eu ofereci um euro, e como não queria o CD para nada falei com o Pedro Primo Figueiredo [n.a.: um dos grandes] e ele ficou com o disco por 2,5€...
Zé Pedro: Bom negócio!
Bruno: Há aqui jogadas externas...
Zezé: Não ganhei nada com isso, foi tudo a acrescentar ao preço original...
São fetichistas do vinil?

VT: Eu acho que não somos. Quer dizer: eu, pessoalmente, sou. O Bruno também é. Os restantes membros também o são à sua maneira, [mas isso não implica ser] fetichistas do vinil... nós achámos que, como a estética do álbum é um bocadinho a puxar mais para o retro, para o prog... ao início, fez logo sentido ser em vinil. Ainda por cima porque o disco tem muitas passagens entre canções, é uma coisa contínua. Mas quisemos, ao mesmo tempo, apelar aos coleccionadores - com o Frozen Caravels foi muito complicado vender CDs...
Bruno: Em tour foi quando vendemos mais...
VT: E mesmo assim o nosso stock era pequeníssimo, uns 300 exemplares...

Em termos de tour: está planeada mais alguma coisa pela Europa fora?

VT: Está. Uma em França, em Paris, e vamos ao Liverpool Psych Fest. A ideia é fazer ida e volta.

Sentem que o público lá fora é receptivo?

VT: Sim, sem dúvida. Nós com o Frozen Caravels tivemos situações incríveis... datas em sítios improváveis, em cidades improváveis...

Falem-me do vosso futuro agro-industrial.

Bruno: Gostamos da Trofa.
Zezé: O McDonald's tem uma campanha de apoiar os produtores agrícolas...

Em que medida é que a agricultura influencia os Equations?

Bruno: Bastante. Todos nós temos aquele gostinho por plantar a terra com tractores.
Lucena: Havia um grupo da Coronado que era o Coronado Farmers, para tu veres o quão fundo isto vai...
Zé Pedro: Havia e há... o pessoal era muito entusiasta por John Deere's...
Bruno: Ainda hoje estive na Internet a ver se arranjava uma tote bag da John Deere...
Lucena: E o Penacho também era alto entendido...
Bruno: E sabe conduzir tractor! Tem carta de tractor...
VT: Uma vez levou atrelados o GD e o Zé Pedro...

Qual é que é a vossa sopa preferida?

Zezé: Alho francês.
VT: Eu gosto de canja...
Zé Pedro: Eu gosto de caldo verde...
Bruno: Feijão...
GD: Gostamos todos muito de sopa...
Bruno: Adoramos sopa.

Para acabar: já ninguém dá no Gin da Morte?

Zezé: Estive com ele no Primavera...
VT: Eu lembro-me do Gin da Morte aparecer no Porto depois de um concerto do Hightower... uma garrafa de água do Luso.
Zé Pedro: O Gin da Morte não vai morrer.
Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com
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