ENTREVISTAS
Magina
Menasso a sonhar com o espaço
· 02 Jun 2010 · 00:02 ·
Pedro Magina conhece a sorte de possuir um apelido que soa bem como nome para quem sonha o espaço com as mãos sobre um teclado Casio ToneBank e um pé em cima do pedal de efeitos. E ainda que esses sejam os instrumentos evidentes nesta aventura, Magina envolve outros nas suas excursões: em Nazca Lines, o EP de estreia lançado na Ruralfaune, encontramo-lo a tocar os anos acumulados no interior do Casio, e às voltas com um sincero apego nostálgico por bandas sonoras de ficção científica declaradamente pré-90 (quando Vangelis e John Carpenter eram reis). Adoptando Nazca Lines como referência, é possível acreditar que Magina elabora música de reminiscência para o homem que viaja adormecido na cápsula. Ou, se preferirmos, estas podem até ser canções dilatadas para a atmosfera de um planeta caravana (que celebra qualquer coisa de nupcial na deslumbrante “Head Across the Sky”).

Apetece quase dizer: dêem-lhe uma qualquer superfície e ele dá-vos um levantamento emocional da mesma. Por enquanto, os quase 17 minutos de Nazca Lines revelam tanto sobre Magina como os 34 minutos que ficam por preencher num futuro álbum. O intervalo até lá deve ser ocupado com novas canções dos Aquaparque, o duo que une Pedro Magina e André Abel numa irmandade de sentimentos à flor da pele e canções de rara intensidade. As tais novidades devem ser o prato forte da noite de 4 de Junho, no Lux, onde os Aquaparque assegurarão a primeira parte de Atlas Sound (a fantasia de Bradford Cox, dos Deerhunter). O “menasso” Pedro Magina falou-nos acerca disso e de outras introspecções motivadas por Nazca Lines.
Começava por perguntar que fundações e antecedentes levaram ao EP Nazca Lines?

Nas partes finais de Dance Damage eu agarrei-me mais ao som dos teclados e comecei a ganhar mais interesse em explorar o meu Casio… Achei limitado no início (por simplesmente se tratar de um Casio) e não sabia muito bem por onde começar até porque tinha a sensação de que já tinha corrido todos os patterns e sons possíveis, até que comecei a processá-lo e a tentar procurar algo diferente, aproveitando também o som característico e simples e basicamente isso é escutado no É Isso Aí de Aquaparque. Depois foi começar a separar e a perceber o que faria sentido para mim em Aquaparque e outras melodias ficavam de fora, porque muitas vezes o André ou a minha própria voz encarregavam-se disso. Coincide também com menos ensaios com o André, pela ida dele para Lisboa, e a minha necessidade de espremer emoções… e o velhinho Casio levou com isso e ainda se aguenta. Passei à fase de me organizar e assumir um disco com tempo definido e saber que o conseguiria fazer, porque a vontade de divagar estalava também, mas bastou-me impor um ritmo e um tempo flexível e ao mesmo tempo não massacrante e de alguma forma rigoroso e siga. O nome surgiu durante esse processo todo, com um documentário sobre land art a que assisti e não conhecendo as linhas de Nazca nem as teorias por detrás disso colei e pronto, Nazca Lines será e assim foi.

O Casio que tocas no Nazca Lines acompanha-te há quanto tempo? Sentes que o EP só podia partir daquele teclado? A essência daquelas músicas seria de certa forma irreproduzível num Casio muito mais moderno, não?

O grande impulsionador do meu gosto pela música foi o meu avô, que me ofereceu o Casio no meu oitavo aniversário, portanto há 21 anos. E sim, por toda a linha que vinha seguindo só podia ter feito o que fiz com o Casio. Até à data ainda não consegui ouvir nenhum teclado/synth/emulador que consiga reproduzir da mesma forma, quer pelo ruído da idade, quer pelo som característico.

Apesar de ser possível escutar o Casio no É Isso Aí, pelo menos na faixa “Fantasma”, se não estou em erro, dirias que os meios que utilizas enquanto Magina são geralmente diferentes dos usados em Aquaparque?


Verdade. Não cantando, permitiu-me roubar o processamento da voz usado em Aquaparque e simplesmente acrescentar-lhe ao Casio e ir experimentando a partir daí.

No teledisco de “Fantasma”, pareces um miúdo muito confiante e orgulhoso do seu virtuosismo no piano. Eras puto para reunir a família à volta do teu recital? Que coisa gostavas de tocar na altura daquelas gravações?

Sim, apesar de usar a demo do piano ao som de Richard Clayderman e enganar alguns, mas ainda não tocava nadinha… Só escalas e as peças clássicas que era obrigado a tocar na escola de música. Mas reunia a família mais próxima a tocar harmónica e a cantar "A Paixão" de Rui Veloso e a tentar fazer escalas à Slash mas com um cavaquinho, porque ainda era muito pequeno para ter uma guitarra. Ainda hoje, a primeira pessoa a escutar a minha música é a minha mãe.

Que qualidades do Carlos Lopes levaram a que lhe confiasses a mistura e masterização do Nazca Lines?

O Carlos, além de ser um bom amigo, é um gajo extremamente minucioso com bom ouvido e mais importante, tem uma cultura musical vasta, o que leva a que entenda perfeitamente o som que pretendo quer ao vivo quer em disco.

Como surgiu a edição na Ruralfaune? Eles já tinham algum conhecimento prévio do que fazias além de Magina?

Tive vontade que o que faço se espalhasse o mais possível e foi por contacto meu que a conversa surgiu, o Bruno gostou e decidiu editar e distribuir.

Já te aventuraste pelo restante catálogo da Ruralfaune? Destacarias algum disco?

De discos não posso falar porque não ouvi ainda, mas posso destacar alguns artistas dos quais escutei alguns álbuns e que também editam ou já editaram pela Ruralfaune, como é o caso de Oneohtrix Point Never, Stellar OM Source, Mark Bradley e Stefan Kushima.

Que tipo de relação mantinhas com “Born Slippy”, dos Underworld, para que surgisse a vontade de fazer uma versão da mesma?

Essa música ainda hoje me bate se alguém se lembra de a passar. Muito boas recordações, histórias comuns e uma grande parte da minha adolescência em competições de shots de Gold Strike a ver quem aguentava mais… Há muito pouco tempo prestei atenção à letra e apercebi-me que me transmitia algo forte e que parte do que eu via ou vejo em estados mais eufóricos e potenciados por outras substâncias são snapshots de coisas que o meu cérebro vai retendo e é disso que me lembro no momento posterior…e isto encaixa. A melodia acho-a tão simples quanto brilhante e em sintonia com a letra. Aconteceu de ter tocado uns acordes semelhantes numa das minhas incursões pelas melodias e de imediato deu um click e percebi que era a “Born Slippy” que por ali pairava, por isso fiz a versão. E porque nunca ouvi nenhuma versão propriamente dita, a não ser remisturas… Provavelmente existe, mas não sei.


O “Nazca Lines” tem também aquele aspecto evocativo das bandas sonoras. Até que ponto vai o teu interesse por bandas sonoras? De que forma encararias a hipótese de compor para cinema de ficção ou documental?

Gosto de bandas sonoras, sem dúvida. Cresci a ver o E.T., O Super-homem, Sozinho em Casa, Indiana Jones e aprecio imenso as composições do John Williams, mas ao mesmo tempo uma das bandas sonoras que marcaram uma geração (e eu não sou excepção ) foi a do Rocky, composta por Bill Conti, que mais tarde compôs a do Karate Kid, essa sim para mim uma das mais memoráveis. Por isso posso dizer que adorava poder compor para cinema de ficção ou mesmo documental, desde que o conteúdo fosse emocionalmente forte e desafiante.

Às vezes dou por mim a imaginar edits mais prolongados para “Bem Bom” e “Siga para bingo” de Aquaparque. Parece-te viável expandir algumas das músicas no álbum? Isso acontece um pouco ao vivo, não?

Sim, é viável e acontece ao vivo. Muitas vezes porque temos ideias mais fortes e diferentes do que tínhamos quando fizemos o disco e achamos que soa melhor ou que se enquadra bem com o alinhamento que temos previsto.

Como estão as coisas em termos de Aquaparque? Podemos esperar novidades na primeira parte de Atlas Sound?

Estamos a ensaiar temas novos e começamos a gravar o próximo disco em Agosto. Sim podem esperar novidades.

Ainda te lembras do momento em que Nirvana bateu forte para ti? Como foi começar a curtir Nirvana?

Perfeitamente… Tinha o quarto cheio de posters dos gajo e comecei a detestar Guns'n'Roses à custa disso… Agora já posso ouvir outra vez. Pela primeira vez comecei a perceber a sério o que era ser honesto quando se faz música. É o que me ocorre responder-te no momento.

Acreditas que existem futuros e verdadeiros “menassos” entre os putos que agora têm perto de 10 anos?

Há dois possíveis “menasso”: o Joe, que é e será sempre alto “menasso” mas não passa de um exibicionista, e o verdadeiro “menasso” que é o Menasso, igual a maninho e que deixa marca no coração das pessoas por quem passa.
Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
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