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Magina
Menasso a sonhar com o espaço


Pedro Magina conhece a sorte de possuir um apelido que soa bem como nome para quem sonha o espaço com as mãos sobre um teclado Casio ToneBank e um pé em cima do pedal de efeitos. E ainda que esses sejam os instrumentos evidentes nesta aventura, Magina envolve outros nas suas excursões: em Nazca Lines, o EP de estreia lançado na Ruralfaune, encontramo-lo a tocar os anos acumulados no interior do Casio, e às voltas com um sincero apego nostálgico por bandas sonoras de ficção científica declaradamente pré-90 (quando Vangelis e John Carpenter eram reis). Adoptando Nazca Lines como referência, é possível acreditar que Magina elabora música de reminiscência para o homem que viaja adormecido na cápsula. Ou, se preferirmos, estas podem até ser canções dilatadas para a atmosfera de um planeta caravana (que celebra qualquer coisa de nupcial na deslumbrante “Head Across the Skyâ€).

Apetece quase dizer: dêem-lhe uma qualquer superfície e ele dá-vos um levantamento emocional da mesma. Por enquanto, os quase 17 minutos de Nazca Lines revelam tanto sobre Magina como os 34 minutos que ficam por preencher num futuro álbum. O intervalo até lá deve ser ocupado com novas canções dos Aquaparque, o duo que une Pedro Magina e André Abel numa irmandade de sentimentos à flor da pele e canções de rara intensidade. As tais novidades devem ser o prato forte da noite de 4 de Junho, no Lux, onde os Aquaparque assegurarão a primeira parte de Atlas Sound (a fantasia de Bradford Cox, dos Deerhunter). O “menasso†Pedro Magina falou-nos acerca disso e de outras introspecções motivadas por Nazca Lines.
Começava por perguntar que fundações e antecedentes levaram ao EP Nazca Lines?

Nas partes finais de Dance Damage eu agarrei-me mais ao som dos teclados e comecei a ganhar mais interesse em explorar o meu Casio… Achei limitado no início (por simplesmente se tratar de um Casio) e não sabia muito bem por onde começar até porque tinha a sensação de que já tinha corrido todos os patterns e sons possíveis, até que comecei a processá-lo e a tentar procurar algo diferente, aproveitando também o som característico e simples e basicamente isso é escutado no É Isso Aí de Aquaparque. Depois foi começar a separar e a perceber o que faria sentido para mim em Aquaparque e outras melodias ficavam de fora, porque muitas vezes o André ou a minha própria voz encarregavam-se disso. Coincide também com menos ensaios com o André, pela ida dele para Lisboa, e a minha necessidade de espremer emoções… e o velhinho Casio levou com isso e ainda se aguenta. Passei à fase de me organizar e assumir um disco com tempo definido e saber que o conseguiria fazer, porque a vontade de divagar estalava também, mas bastou-me impor um ritmo e um tempo flexível e ao mesmo tempo não massacrante e de alguma forma rigoroso e siga. O nome surgiu durante esse processo todo, com um documentário sobre land art a que assisti e não conhecendo as linhas de Nazca nem as teorias por detrás disso colei e pronto, Nazca Lines será e assim foi.

O Casio que tocas no Nazca Lines acompanha-te há quanto tempo? Sentes que o EP só podia partir daquele teclado? A essência daquelas músicas seria de certa forma irreproduzível num Casio muito mais moderno, não?

O grande impulsionador do meu gosto pela música foi o meu avô, que me ofereceu o Casio no meu oitavo aniversário, portanto há 21 anos. E sim, por toda a linha que vinha seguindo só podia ter feito o que fiz com o Casio. Até à data ainda não consegui ouvir nenhum teclado/synth/emulador que consiga reproduzir da mesma forma, quer pelo ruído da idade, quer pelo som característico.

Apesar de ser possível escutar o Casio no É Isso Aí, pelo menos na faixa “Fantasmaâ€, se não estou em erro, dirias que os meios que utilizas enquanto Magina são geralmente diferentes dos usados em Aquaparque?

Verdade. Não cantando, permitiu-me roubar o processamento da voz usado em Aquaparque e simplesmente acrescentar-lhe ao Casio e ir experimentando a partir daí.

No teledisco de “Fantasmaâ€, pareces um miúdo muito confiante e orgulhoso do seu virtuosismo no piano. Eras puto para reunir a família à volta do teu recital? Que coisa gostavas de tocar na altura daquelas gravações?

Sim, apesar de usar a demo do piano ao som de Richard Clayderman e enganar alguns, mas ainda não tocava nadinha… Só escalas e as peças clássicas que era obrigado a tocar na escola de música. Mas reunia a família mais próxima a tocar harmónica e a cantar "A Paixão" de Rui Veloso e a tentar fazer escalas à Slash mas com um cavaquinho, porque ainda era muito pequeno para ter uma guitarra. Ainda hoje, a primeira pessoa a escutar a minha música é a minha mãe.

Que qualidades do Carlos Lopes levaram a que lhe confiasses a mistura e masterização do Nazca Lines?

O Carlos, além de ser um bom amigo, é um gajo extremamente minucioso com bom ouvido e mais importante, tem uma cultura musical vasta, o que leva a que entenda perfeitamente o som que pretendo quer ao vivo quer em disco.

Como surgiu a edição na Ruralfaune? Eles já tinham algum conhecimento prévio do que fazias além de Magina?

Tive vontade que o que faço se espalhasse o mais possível e foi por contacto meu que a conversa surgiu, o Bruno gostou e decidiu editar e distribuir.

Já te aventuraste pelo restante catálogo da Ruralfaune? Destacarias algum disco?

De discos não posso falar porque não ouvi ainda, mas posso destacar alguns artistas dos quais escutei alguns álbuns e que também editam ou já editaram pela Ruralfaune, como é o caso de Oneohtrix Point Never, Stellar OM Source, Mark Bradley e Stefan Kushima.

Que tipo de relação mantinhas com “Born Slippyâ€, dos Underworld, para que surgisse a vontade de fazer uma versão da mesma?

Essa música ainda hoje me bate se alguém se lembra de a passar. Muito boas recordações, histórias comuns e uma grande parte da minha adolescência em competições de shots de Gold Strike a ver quem aguentava mais… Há muito pouco tempo prestei atenção à letra e apercebi-me que me transmitia algo forte e que parte do que eu via ou vejo em estados mais eufóricos e potenciados por outras substâncias são snapshots de coisas que o meu cérebro vai retendo e é disso que me lembro no momento posterior…e isto encaixa. A melodia acho-a tão simples quanto brilhante e em sintonia com a letra. Aconteceu de ter tocado uns acordes semelhantes numa das minhas incursões pelas melodias e de imediato deu um click e percebi que era a “Born Slippy†que por ali pairava, por isso fiz a versão. E porque nunca ouvi nenhuma versão propriamente dita, a não ser remisturas… Provavelmente existe, mas não sei.

O “Nazca Lines†tem também aquele aspecto evocativo das bandas sonoras. Até que ponto vai o teu interesse por bandas sonoras? De que forma encararias a hipótese de compor para cinema de ficção ou documental?

Gosto de bandas sonoras, sem dúvida. Cresci a ver o E.T., O Super-homem, Sozinho em Casa, Indiana Jones e aprecio imenso as composições do John Williams, mas ao mesmo tempo uma das bandas sonoras que marcaram uma geração (e eu não sou excepção ) foi a do Rocky, composta por Bill Conti, que mais tarde compôs a do Karate Kid, essa sim para mim uma das mais memoráveis. Por isso posso dizer que adorava poder compor para cinema de ficção ou mesmo documental, desde que o conteúdo fosse emocionalmente forte e desafiante.

Às vezes dou por mim a imaginar edits mais prolongados para “Bem Bom†e “Siga para bingo†de Aquaparque. Parece-te viável expandir algumas das músicas no álbum? Isso acontece um pouco ao vivo, não?

Sim, é viável e acontece ao vivo. Muitas vezes porque temos ideias mais fortes e diferentes do que tínhamos quando fizemos o disco e achamos que soa melhor ou que se enquadra bem com o alinhamento que temos previsto.

Como estão as coisas em termos de Aquaparque? Podemos esperar novidades na primeira parte de Atlas Sound?

Estamos a ensaiar temas novos e começamos a gravar o próximo disco em Agosto. Sim podem esperar novidades.

Ainda te lembras do momento em que Nirvana bateu forte para ti? Como foi começar a curtir Nirvana?

Perfeitamente… Tinha o quarto cheio de posters dos gajo e comecei a detestar Guns'n'Roses à custa disso… Agora já posso ouvir outra vez. Pela primeira vez comecei a perceber a sério o que era ser honesto quando se faz música. É o que me ocorre responder-te no momento.

Acreditas que existem futuros e verdadeiros “menassos†entre os putos que agora têm perto de 10 anos?

Há dois possíveis “menassoâ€: o Joe, que é e será sempre alto “menasso†mas não passa de um exibicionista, e o verdadeiro “menasso†que é o Menasso, igual a maninho e que deixa marca no coração das pessoas por quem passa.


Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
02/06/2010