ENTREVISTAS
One Might Add
Tudo à chapada no mesmo barco
· 09 Abr 2008 · 08:00 ·
O mistério maior acerca da dupla One Might Add desenvolve-se a partir da cegueira que impede alguém de saber exactamente onde termina a influência de Ruben Costa e Alberto Arruda e começa o domínio das máquinas. Sem lei que a governe, a tutela dessa terra de ninguém vai sendo, por esta altura, entregue a uma bateria missionária que sinaliza ritmicamente o espaço para que esse possa depois servir de palco a batalhas entre os vários aparelhos manipulados pelos One Might Add. À volta dessa ilha cyber-anárquica, rasga mar uma Sailing Team com uma bandeira hasteada em sinal do adiamento de um cessar-fogo que pacifique as relações entre as tais máquinas endiabradas (teclados Casio, samples, caixas de ritmos) e referências pedidas de empréstimo ao kraut-rock ou à música de dança. Em entrevista, Ruben Costa e Alberto Arruda esclareceram um pouco mais acerca da rota deste cruzeiro.
Se, em termos de percurso One Might Add, fossem obrigados a demarcar os três passos mais significantes no estabelecimento das fundações para o que viria a ser o Sailing Team, que momentos ou registos assinalariam como os mais importantes?

A.L.: Em primeiro lugar, ir comer batatas fritas ao Irish Pub, no Cais do Sodré, que foi como nos conhecemos.

R.U.: Depois, foi eu ter construído o Soundbitch - um oscilador com o qual fizemos o disco quase todo - e a falta de jeito para a bateria, que me fez ter que encontrar uma maneira de tocar. Por último, o primeiro concerto na ZDB, durante a primeira fase de OMA, da qual gravámos um pequeno registo, e em que ainda tocávamos num formato completamente diferente daquele que viemos depois a utilizar no Sailing Team. Mas já nesse deu para experimentar muitas coisas e iniciar de facto a actividade enquanto "banda"... Passámos de só ter ideias a dar corpo a alguma coisa...

E acham que essa "falta de jeito" que o Ruben refere ajudou a que desenvolvesse uma técnica peculiar que influencia as bases do que se encontra no Sailing Team? Não é, até certo ponto, um disco que parte da bateria para depois adicionar toda aquela ginástica anómala vossa?

A.L.: Sim, sem dúvida, a base para as composições neste disco foi sempre a bateria. Claro que a maneira cíclica de tocar do Ruben também foi influenciada por essa ginástica toda a que tu te referes. Ele tem de segurar a música, fazer sozinho a camada "lá atrás", já que não temos baixo. Este "lá atrás" é da música, se a tentares imaginar como feita de camadas tipo uma cebola.

E, ao vivo, caso tentem arriscar algumas versões das faixas no Sailing Team, ele vai estar sentado na bateria ou vão estar os dois de joelhos sobre a maquinaria como tem sido ultimamente?

R.U.: Acho que vou ter que estar nos dois lados - nalgumas musicas vou tocar só bateria, noutras vou estar nas máquinas, e também há as caixas de ritmos!

Ao vivo, as dinâmicas de mixtape e a colagem entre temas é algo que vos agrada explorar?

R.U.: Sim, sem dúvida, por acaso nunca tínhamos pensado nisso como uma mixtape! Mas normalmente nunca paramos! Mixtape é bom, meu!!

Quando falo em mixtape, refiro-me também à capacidade que as faixas têm de unirem as pontas entre si, comerem as caudas umas às outras.

R.U.: Sim, sem dúvida.

Sentem que o disco pode ter resultado como um corpo-campeão que reúne tudo aquilo que venceu nas várias batalhas entre as vossas predilecções e fetiches?

R.U.: Sim, acho que sim, apesar da guerra já estar vencida há dois anos, e entretanto já estarmos a trabalhar numa coisa nova!

O disco já se encontrava estruturado há mais ou menos quanto tempo?

R.U.: O primeiro master ficou pronto há dois anos.

Em relação ao vosso estado actual, não acham que se possa encontrar um pouco datado? Acham que é prejudicial o intervalo de tempo que chega a separar um disco de estar completo até ao momento em que é lançado?

A.L.: Sim, é muito o que fazíamos naquela altura. Entretanto, temos um espectro sonoro muito mais alargado. Trabalhamos muito mais nos nossos sons e nos ritmos também. Quanto a ser prejudicial, nem por isso. Aquele disco é um registo de uma das "coisas" que os One Might Add são. Havemos de fazer mais...

E fala-me um pouco dessa "coisa nova".

A.L.: A coisa nova vai ser para a Searching. O Ruben já sabe fazer breaks na bateria – fraquinhos, mas, olha, é o que há… O que até é estranho porque estas malhas estão a sair com um sentido de espaço e tempo mais amplo do que as do Sailing Team. A outra diferença é, claro, a nossa" palete" de sons que é muito mais vasta.


Vasta ao ponto de incluir o quê nesse novo material para a Searching?

A.L.: Talvez a diferença maior resida no facto de no novo material organizarmos as coisas de forma diferente e estarmos a incluir mais melodia nalgumas coisas. Não significa isso que o Sailing Team não a tenha, mas era organizada de maneira diferente.

E, além do Soundbitch, que equipamento foi crucial à feitura do Sailing Team?

R.U.: Bateria claro, um Casio "bendado", um sampler, uma caixa de ritmos e um computador.

Era lisonjeador encontrar um "edit" do "Suitable Energy" num DJ set de um tipo a passar música numa discoteca cheia de gente gira ou acham que isso vos levaria a trocar um olhar ao jeito de Este gajo que se atine...?

R.U.: Era óptimo! Até existe um “edit” mesmo techno dessa malha que não saiu no disco. Assim depois de uma malha do Plastikman, vinha mesmo a calhar…

Existe alguma faixa no Sailing Team que vos pareça ser potencialmente merecedora de uma daquelas versões "extended" que normalmente surgem em discos de 12 polegadas?

R.U.: A “Suitable Energy”, claro! Aliás, essa até foi cortada para o disco.

E foi cortada por imposição do disco ter de ser adequado ao vinil? O vinil foi uma das restrições para a duração do disco? Não acharam que um primeiro longa-duração podia ir além dos 25 minutos? Sentem que OMA pode funcionar melhor na sua forma condensada?

A.L.: Nós achamos que o disco está bom assim como está. Mas, sim, é por causa do vinil que o tema foi cortado – e o álbum acabou por nem sair em vinil -, mas não foi um corte grave, nada mesmo!

Qual era a duração original da faixa?

A.L.: Até foi adequado ao resto das faixas - assim o disco funciona melhor como um todo. Não sei quanto é que tinha antes e, para ser sincero, nem sequer me lembro quanto é que tem agora.

A edição em vinil, que é uma das marcas da Ruby Red, acabou por não se suceder por algum motivo em especial?

A.L.: Acho que não foi por nada de especial. Apenas porque o Tiago (Miranda) preferiu assim, e há mais edições em CD que saíram na mesma altura que nós. Eram todos em CD. Talvez por isso...

A "Cruising", que fez parte da compilação distribuída na Segunda Grande Noite da Filho Único, mantém algumas semelhanças com a "Suitable Energy", incluída no álbum, em termos de um andamento mais house. As faixas cedidas a compilações são quase sempre peças isoladas ou chegam a ser partes que "caem" de um conjunto de faixas de alguma forma agrupadas?

R.U..: Essa faixa estava incluída noutra versão do Sailing Team - nós mudámos muitas coisas e remisturámos. A faixa acabou por ficar bastante diferente e nós gostámos do resultado. Por isso, mandámos para a compilação.

Existem outras faixas mais próximas do registo house que possam andar dispersas por aí?

R.U.: Sim, existem, mas vamos lá ver o que é que lhes acontece…

Fico com as expectativas em alta. E como estamos de projectos paralelos e colaborações por fora?

R.U.: Há algumas coisas a acontecer. Eu ando a ensaiar com o Rafael Toral para um projecto que vai acontecer em breve, mas, para já, ainda está em fase de embrião. Estou a tocar esporadicamente com o Pcf Moya, e estamos a pensar gravar um disco este ano, só nos falta o tempo! A ver vamos.

E, tu, Alberto?

A.L.: Eu tenho um projecto com o Pedro Boavida - da antiga formação dos We Shall Say Only the Leaves – a que damos o nome de IFF. Juntamo-nos quando podemos, pois o Pedro continua em Inglaterra. Entretanto, tenho um projecto com o Jan Ferreira (aka Mosaik) e estou a trabalhar num disco a solo…

R.U.: …que está a ficar um disco filha da puta! (risada geral)
Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
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