DISCOS
The Howling Hex
Nightclub Version of the Eternal
· 19 Dez 2006 · 08:00 ·
The Howling Hex
Nightclub Version of the Eternal
2006
Drag City / AnAnAnA


Sítios oficiais:
- The Howling Hex
- Drag City
- AnAnAnA
The Howling Hex
Nightclub Version of the Eternal
2006
Drag City / AnAnAnA


Sítios oficiais:
- The Howling Hex
- Drag City
- AnAnAnA
Sem rei, mas com muito rock, o iconoclasta Neil Hagerty satisfaz a sua vontade à volta de fogueira sónica, borrifando-se para a apreciação dos convidados.
Quando absolutamente convencido disso, o pretenso génio crê que não o atraiçoarão quaisquer adversidades ou condicionantes. Na virtualidade do seu narcisismo, acredita que, independentemente da falta de enquadramento, triunfará à custa de uma sempre fiável categoria e pertinência artística. Mesmo quando os sussurros maldizentes formam, em coro, uma vaia, o suposto génio acha-se no direito de continuar a insuflar a sua discografia com exercícios que fazem transbordar a paciência de todos excepto os seguidores religiosos (esses que vão legitimando muitos excessos).Em termos concretos, tais comportamentos obsessivos traduzem-se em discos incompreendidos e, logo, esquecidos, em bootlegs gravados com bandas locais no Havai e Jamaica e numa regularidade anual que, em termos de álbuns lançados, chega ultrapassar a quantidade dos meses. A verdade é que, até alguém o convencer do contrário, Greg Dulli (ex-líder dos Afghan Whigs) não deve qualquer favor sexual a Ryan Adams, até que este escreva uma grande canção e obrigue ao cumprimento do primeiro, que a um fellatio se comprometia, se, entre as mil canções que o segundo alega escrever por semana, encontrasse uma verdadeiramente inesquecível.

Apesar de tão prolífico quanto qualquer um dos mencionados, Neil Michael Hagerty não consta da lista satírica de Greg Dulli tão simplesmente porque não se pavoneia – com uma frequência intragável – acerca da quantidade insuperável de ocasiões em que a sua inspiração tocou o sino ao jackpot. A prova mais evidente desse low-profile, mantido enquanto Howling Hex, será a limitada quantidade de 500 cópias escolhida para os primeiros três lançamentos (este ano compilados em 1-2-3). Nem outra coisa se esperaria de um Neil Hagerty cuja alienação total face à tendência dos anos 90 o impediu de - enquanto antagonizava acidamente as fórmulas rock ao leme dos Royal Trux - obter dividendos à capitalização de que era alvo o fuzz nessa década (um pouco com os Destroy All Monsters haviam permanecido alheios a toda a tradição rock de Detroit com um proto-punk tão digerível como lâminas temperadas com vinagre). Com Nightclub Version of the Eternal, Hagerty renova os votos de maverick convicto de que o seu próprio rumo isolado é o mais certo. Assim é o terceiro disco dos Howling Hex (cuja formação inclui também Mike Saenz, a recorrente Lyn Madison, Dan Sylvester): despreocupadamente expandido em longas jams, estruturado de modo a parecer contínuo e uno (foi gravado em apenas 10 dias), muito mais aplicado na potenciação das propriedade psicadélicas das guitarras do que em conferir destaque à voz de Hagerty, que dá conta do recado pela margem mínima. Trata-se de um disco capaz de entreter se consumido comedidamente, mas inevitavelmente maçador quando absorvido de uma só vez (o ponto de convergência freak dos instrumentos e vozes parece invariavelmente o mesmo em todas as sete faixas).

À cerca de Nighclub Version não há mesmo muito mais a referir – não oculta truques na manga, não mina o seu terreno sónico de hooks que provoquem adição entre dependentes de melodia (embora “This Planet Sweet” mantenha um mecanismo rotativo capaz de viciar). Será provavelmente uma radiografia tão sincera quanto possível da noção que possa cultivar Hagerty de uma boa pândega na garagem da vizinhança da sua própria identidade musical. Esperamos, ainda assim, que seja também um disco de transição, porque a curiosidade e pacto não sobreviveriam a um segundo disco nesta toada. A questão decisiva: será preferível despender o tortuoso volume de quatro álbuns duplos à procura da eternamente adiada canção perfeita ou dedicar apenas um a descomprometida viagem que pode eventualmente dar de caras com o equivalente negativo dessa mesma? Mesmo que escassas, as mais significantes qualidades a descobrir a Nightclub Version of the Eternal resultam directamente da entrega nada egocêntrica que Neil Hagerty dedica a este disco muito seu. É de louvar o comportamento discreto a quem produz um disco que, por ser tão vocacionado para gozo pessoal, arriscava surtir aborrecimento entre os ouvidos externos a essa motivação.
Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com

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