DISCOS
Mécanosphère
Limb Shop
· 01 Set 2006 · 08:00 ·
Mécanosphère
Limb Shop
2006
Raging Planet


Sítios oficiais:
- Raging Planet
Mécanosphère
Limb Shop
2006
Raging Planet


Sítios oficiais:
- Raging Planet
Os Mécanosphère não voltam porque nunca estiveram ausentes, mas lançam mais um disco onde se pode aceder ao submundo das máquinas durante algum tempo. Aconselhável colocar as máscaras de oxigénio.
Sabe-se pela escuta dos dois primeiros registos e pela força das actuações ao vivo que Mécanosphère, embora comandado por humanos, é um maquinismo com força própria e com perfeito domínio do seu futuro. É um organismo robusto, vivo e auto-suficiente, ainda que conte com o auxílio de Adolfo Luxúria Canibal, Benjamin Brejon e Scott Nydegger (e de habituais ajudantes extra). O contributo de cada um deles faz com que a máquina se mova um pouco mais na busca de um objectivo, etapa por etapa, capítulo por capítulo. O quarto, Limb Shop, é o resultado de uma reconstrução e junção de excertos de sessões de gravação resgatadas no tempo e ao tempo. No total é pouco mais de uma hora de estilhaços metálicos, paisagens cinzentas e fragmentadas, excertos do som roubado a um mundo subterrâneo a que poucos têm acesso, constituído 90% de máquinas e 10% por humanidade (cuidadosamente filtrada).

Na face mais visível, Adolfo Luxúria Canibal continua a apresentar a sua visão de um mundo caótico que em “Phantom Limbs”, o tema de abertura, se faz de ambulâncias e de membros que se sentem erguer mas cujo futuro (das acções) se desconhece. “Phantom Limbs” parece sugerir um cenário de pós-guerra ou qualquer outro em que a humanidade se mutila e estropia a si mesma. Os destroços sonoros que se podem avistar ao longo tema servem de apoio a essa visão catastrófica. Adolfo Luxúria Canibal continua a fazer desfilar o seu spoken Word noir e catastrofista. Em “Mutilation site” juntam-se ao cenário traçado pela voz beats (acompanhadas de ruído) que desde logo confirmam a insistência (boa) no rol de opções deste novo disco – com efeitos visíveis. Nota-se um som cada vez mais polido e seguro dos caminhos que pode e deve seguir – mais industrializado que nunca. As beats continuam logo em “Coagulate”, com bastante sucesso.

Mais à frente encontramos “Types of Aberration Dub”, que começa da mesma forma que termina: um sample de uma voz que fala ao mundo de aparências grotescas, de malformações e de aberrações. Durante toda a faixa há um fluxo de percussão simples e justapostas deitam-se várias camadas mais ou menos finas de ambientações sonoras onde se parece juntar por vezes uma voz (por entre outras com menos impacto) que transporta angústia, parecendo sugerir a alienação criada pela diferença, pela desconformidade. Este é o século XXI visto pelos olhos de quem comanda os destinos dos Mécanosphère. Com o auxilio do colaborador fetiche dos Mécanosphère, Steve Mackay, o lendário saxofonista dos Stooges.

Limb Shop é um disco carregado de mensagens para além da música; mensagens mais ou menos encriptadas às quais dificilmente se escapará – o maior deles será porventura o pré-aviso do que pode acontecer se a autodestruição continua a ditar leis. Os Mécanosphère continuam a provar neste terceiro lançamento que são uma das unidades mais interessantes da música feita em Portugal. Limb Shop será eventualmente o disco onde os Mécanosphère conseguem melhor expor a mistura de mundos que propõem – uma fusão cada vez mais interessante.
André Gomes
andregomes@bodyspace.net
RELACIONADO / Mécanosphère