DISCOS
V/A
The Golden Apples Of The Sun
· 10 Dez 2004 · 08:00 ·
V/A
The Golden Apples Of The Sun
2004
Bastet
Sítios oficiais:
- Bastet
The Golden Apples Of The Sun
2004
Bastet
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V/A
The Golden Apples Of The Sun
2004
Bastet
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The Golden Apples Of The Sun
2004
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Escrever sobre música à medida que os fenómenos decorrem pode levar a conclusões precipitados. Apetece, porém, como outros já fizeram, traçar um paralelo entre The Golden Apples Of The Sun, edição limitada a 1000 cópias distribuÃda com a revista Arthur, e um documento como No New York, compilação curada por Brian Eno e essencial para a visibilidade da no wave nova iorquina dos finais dos anos 70.
Em 20 nomes, escolhidos por Devendra Banhart, da actual teia "freak folk" (onde cabem a psych, a free e outros anexos à essência folk), filão gerador de alguma da melhor música recente, descobrimos algumas facetas da nova folk. Estamos perante a visão apaixonada de Devendra - muitos artistas são seus amigos e colaboradores - e não de escolhas frias e laboratoriais.
"Angel's share" dos Vetiver dá o mote para o tom pachorrento e luminoso da compilação - um raro exemplo de uma recolha que não soa a uma manta de retalhos - com as vozes saÃdas da cama de Hope Sandoval, dos Mazzy Star, e Andy Cabic em harmonia perfeita e os dedilhados sonhadores de Banhart a cozinharem um hino à doçura. "Farm, CA" de Jana Hunter traz outra voz de embalo, um suspiro amoroso e o violino a puxar os limites do sonho num todo tão "lo-fi" como fora do mundo. "Look at what the light did now" dos Little Wings é o sol californiano, o cantarolar imperfeito de amigos em torno de uma guitarra num calmo fim de tarde. Descobrimos em Josephine Foster (ajudada pelo muito em voga banjo) uma provável fonte de inspiração para as manas Cocorosie, também presentes nesta compilação.
Menos ortodoxos, os White Magic, com "Don't need", a canção mais aparentada com a folk do promissor mini-CD de estreia Through The Sun Door. "Don't need" orquestra uma valsa demonÃaca, com "reverb" eléctrico celeste e o tom estranho de Mira Billotte entre o cinismo e a doçura. A folk ingénua e a voz de criança - ora deliciosa, ora birrenta - de Joanna Newsom surge em "Bridges and balloons" no melhor momento do recomendável disco de estreia The Milk-Eyed Mender. O som mágico da harpa de Newsom não destoa das restantes propostas e mostra outra forma de fazer a folk.
Six Organs Of Admittance, Jack Rose e Matt Valentine representam a nova geração de guitarristas virtuosos, inspirados na escola Takoma de John Fahey. A inédita "Hazy SF" de Ben Chasny (Six Organs Of Admittance) é um dos momentos altos da compilação e aproxima-se do registo de canção que "Compathia" evidencia. Chasny não faz nada mal e esta é apenas mais uma prova (as restantes estão espalhadas em várias edições). "White mule" de Jack Rose é Fahey no seu lado mais duro - "fingerpicking" exploratório, uma guitarra a desdobrar-se, curta "trip" acústica de três minutos.
The Golden Apples Of The Sun é também pródiga em referências directas ou indirectas ao psychfolk britânico dos anos 60. "Crosses" dos Viking Moses inspira-se no medievalismo de uns Fairport Convention, subtrai-lhe o rock e repete um verso de romantismo teimoso e utópico, à maneira antiga: "Without love life is gone / without life love goes on and on". A flauta em "Byss and abyss" - o momento mais negro do disco homónimo editado este ano - dos ESPers recorda o bucolismo de Just Another Diamond Day de Vashti Bunyan, álbum-pérola da folk britânica datada de 1970. Bunyan é aliás um dos Ãdolos de Devendra Banhart e aparece num dueto com ele em "Rejoicing in the hands" - guitarra, xilofone e flauta num exercÃcio de contenção que dura pouco tempo.
A compilação encerra com beleza em carne viva. IncluÃda no split ao vivo com Current 93 de 2002, "The lake" de Antony merecia ser descoberta por uma plateia mais ampla. Imagine-se Jeff Buckley ou Nina Simone num só ser andrógino, sozinho, ao piano, numa interpretação imaculada e de ir à s lágrimas do poema de Edgar Allen Poe. "So lovely was the loneliness / Of a wild lake, with black rock bound / And the tall pines that towered around", na voz de Antony, mexe com as almas já devastadas e ajuda a corroer as outras.
O relativo sucesso de Banhart ainda não gerou a reedição deste objecto raro. Por enquanto, a dita "freak folk" conserva o seu aspecto "underground", caseiro e pouco populoso. Seja qual for o seu futuro, apetece vaticinar que esta compilação será citada como representativa da colheita de 2004.
Pedro RiosEm 20 nomes, escolhidos por Devendra Banhart, da actual teia "freak folk" (onde cabem a psych, a free e outros anexos à essência folk), filão gerador de alguma da melhor música recente, descobrimos algumas facetas da nova folk. Estamos perante a visão apaixonada de Devendra - muitos artistas são seus amigos e colaboradores - e não de escolhas frias e laboratoriais.
"Angel's share" dos Vetiver dá o mote para o tom pachorrento e luminoso da compilação - um raro exemplo de uma recolha que não soa a uma manta de retalhos - com as vozes saÃdas da cama de Hope Sandoval, dos Mazzy Star, e Andy Cabic em harmonia perfeita e os dedilhados sonhadores de Banhart a cozinharem um hino à doçura. "Farm, CA" de Jana Hunter traz outra voz de embalo, um suspiro amoroso e o violino a puxar os limites do sonho num todo tão "lo-fi" como fora do mundo. "Look at what the light did now" dos Little Wings é o sol californiano, o cantarolar imperfeito de amigos em torno de uma guitarra num calmo fim de tarde. Descobrimos em Josephine Foster (ajudada pelo muito em voga banjo) uma provável fonte de inspiração para as manas Cocorosie, também presentes nesta compilação.
Menos ortodoxos, os White Magic, com "Don't need", a canção mais aparentada com a folk do promissor mini-CD de estreia Through The Sun Door. "Don't need" orquestra uma valsa demonÃaca, com "reverb" eléctrico celeste e o tom estranho de Mira Billotte entre o cinismo e a doçura. A folk ingénua e a voz de criança - ora deliciosa, ora birrenta - de Joanna Newsom surge em "Bridges and balloons" no melhor momento do recomendável disco de estreia The Milk-Eyed Mender. O som mágico da harpa de Newsom não destoa das restantes propostas e mostra outra forma de fazer a folk.
Six Organs Of Admittance, Jack Rose e Matt Valentine representam a nova geração de guitarristas virtuosos, inspirados na escola Takoma de John Fahey. A inédita "Hazy SF" de Ben Chasny (Six Organs Of Admittance) é um dos momentos altos da compilação e aproxima-se do registo de canção que "Compathia" evidencia. Chasny não faz nada mal e esta é apenas mais uma prova (as restantes estão espalhadas em várias edições). "White mule" de Jack Rose é Fahey no seu lado mais duro - "fingerpicking" exploratório, uma guitarra a desdobrar-se, curta "trip" acústica de três minutos.
The Golden Apples Of The Sun é também pródiga em referências directas ou indirectas ao psychfolk britânico dos anos 60. "Crosses" dos Viking Moses inspira-se no medievalismo de uns Fairport Convention, subtrai-lhe o rock e repete um verso de romantismo teimoso e utópico, à maneira antiga: "Without love life is gone / without life love goes on and on". A flauta em "Byss and abyss" - o momento mais negro do disco homónimo editado este ano - dos ESPers recorda o bucolismo de Just Another Diamond Day de Vashti Bunyan, álbum-pérola da folk britânica datada de 1970. Bunyan é aliás um dos Ãdolos de Devendra Banhart e aparece num dueto com ele em "Rejoicing in the hands" - guitarra, xilofone e flauta num exercÃcio de contenção que dura pouco tempo.
A compilação encerra com beleza em carne viva. IncluÃda no split ao vivo com Current 93 de 2002, "The lake" de Antony merecia ser descoberta por uma plateia mais ampla. Imagine-se Jeff Buckley ou Nina Simone num só ser andrógino, sozinho, ao piano, numa interpretação imaculada e de ir à s lágrimas do poema de Edgar Allen Poe. "So lovely was the loneliness / Of a wild lake, with black rock bound / And the tall pines that towered around", na voz de Antony, mexe com as almas já devastadas e ajuda a corroer as outras.
O relativo sucesso de Banhart ainda não gerou a reedição deste objecto raro. Por enquanto, a dita "freak folk" conserva o seu aspecto "underground", caseiro e pouco populoso. Seja qual for o seu futuro, apetece vaticinar que esta compilação será citada como representativa da colheita de 2004.
pedrosantosrios@gmail.com
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