DISCOS
The Vandals
Christmas with the Vandals: Oi to the World!
· 19 Nov 2004 · 08:00 ·
The Vandals
Christmas with the Vandals: Oi to the World!
1996
Kung Fu Records


Sítios oficiais:
- The Vandals
- Kung Fu Records
The Vandals
Christmas with the Vandals: Oi to the World!
1996
Kung Fu Records


Sítios oficiais:
- The Vandals
- Kung Fu Records
É este ano que o Ambrósio morre? O velho parece cada vez mais raquítico e suspeita-se que seja um dos escassos ex-PIDE ainda vivos. Já aquele vestido dourado e o chapéu de aba larga não enganam ninguém: a burguesa tem um passado sexual mais conturbado que o da Laura Palmer! Porque nos privam do festim de fétichismo que se segue à primeira dentada? Quero lá saber como uma modelo feita campónia ordenha uma vaca... Muito mais me intriga o romance proibido vivido pelo par mais vicioso do universo publicitário. Mesmo que seja a más horas ou em regime "pay-per-view", temos o direito de conhecer o desfecho de tão longo período de preliminares, por mais intenso ou desilusivo que seja.

A antecipação cada vez mais arrojada leva-me a crer que um dia possamos vir a viver em sufoco natalício logo a partir de Agosto. Fuck Christmas, I got the blues era o rugido anti-espírito natalício do ano passado, Christmas with the Vandals: Oi to the world! será provavelmente a mais imbecil e corrosiva afronta que alguém já dirigiu ao Natal, enquanto pretexto ideal para o consumo e "silly season" por excelência.

Na pele do Grinch, os Vandals trazem à baila o que realmente importa nesta quadra: a subida da taxa de homicídios, um avô que tarda em morrer, os presentes que rodeiam a árvore de Natal protegidos pela lei da bala, um Pai Natal pouco ortodoxo - inveterado apreciador de videos "bukkake" que usa como mortalhas as cartas que recebeu das criancinhas de todo o mundo (digo eu). Estes não serão certamente temas para todos os gostos e sensibilidades, mas a verdade é que, às mãos de um sentido politicamente incorrecto apuradíssimo, o niilismo jardim-escola dos Vandals resulta e faz deste um disco obrigatório nesta época do ano.

Não há valor moral que resista à acidez de melodias subversivas como "My first X-mas (as a woman)" ou "Here I am lord". Não é tanto a fraternidade entre familiares que importa, mas a quantia e volume das prendas. Talvez seja por ser tão primário e satisfazer plenamente a necessidade pop que Oi to the world! tem direito a lugar cimeiro entre aqueles discos a que só recorremos em situações específicas.

Ao escutar-se o mais carnavalesco dos discos natalícios fica-se com a sensação de que os autores de Peace thru vandalism retiram um enorme gozo ao chafurdar na lama. Cada tomate que se atire a Warren Fitzgerald e companheiros torna-os apenas mais convictos na senda do sarcasmo a que ninguém escapa: apologistas do direito ao porte de arma (NRA e afins), transsexuais satisfeitos com o sucesso da operação, potenciais suicidas. O humor vandálico é francamente explícito e, em abono da verdade, esclareça-se que musicalmente a banda vai além da mera competência. A manutenção de uma mesma formação é outro dos aspectos que muito favorece o "output" dos Vandals de período de colheita recomendável (circa 1991-1997), e tal facto transparece no arrojo da adaptação livre de "Dance of the sugarplum fairies" de Tchaikovsky ou na paródia "Christmas time for my penis", que faria corar qualquer celebridade decadente que se tenha atrevido a lançar um disco temático centrado na quadra do consumismo.

Que outra banda se arriscaria a apresentar um cântico de Natal em que alguém evidencia eterna gratidão para com o seu pénis? O Bloodhound Gang bem poderia tentá-lo, sem nunca surtir os mesmos resultados hilariantes e dificilmente a mesma longevidade. A postura da banda californiana leva a que sejam constantemente rebaixados e há certamente quem ainda os amaldiçoe pelas primeiras partes de Pearl Jam (quase sempre com direito a nu integral). A verdade é que os Vandals são muito mais engraçados e estupidamente geniais que quaisquer comparsas de Orange County que lhes tenham seguido as passadas. São também parcialmente responsáveis por pragas como os Offspring, mas quem compõe o hino "Oi to the world!" tem direito a perdão por tão pesado crime. Limitam-se a serem os mesmos de sempre em "Thanx for nothing" ou "A gun for Christmas", mas lançam-se de cabeça a um ska evangélico em "Here I am Lord" e à balada bucólica "Hang myself from the tree". Pode-se torcer o nariz ao absurdo do conceito, mas reconheça-se sem reservas o enorme potencial lúdico do disco perfeito para arruinar o Natal.

Entretanto, nada de interessante se passou entre o mordomo suspeito e a burguesa putéfia. Este será um Natal igual a tantos outros, ou pode ser que Oi to the world! traga algum conforto a quem não suporte os enfeites pirosos que inundam as plataformas comerciais por esta altura. Satisfará pelo menos o desejo de estupidez e ímpetos infantis vários. Fará com que o sorriso do punk mais desdentado brilhe nesta Consoada. Bravo, Vandals!
Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com

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