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Hint
Portakabin Fever
· 18 Jul 2004 · 08:00 ·
Hint
Portakabin Fever
2003
Hombré/Ninja Tune


Sítios oficiais:
- Hombré/Ninja Tune
Hint
Portakabin Fever
2003
Hombré/Ninja Tune


Sítios oficiais:
- Hombré/Ninja Tune
O hype não é como o sol – este, dizem os optimistas, nasce para todos, enquanto o hype (justificado ou não, é irrelevante) só chega para indivíduos que inventem propositadamente uma linguagem para cantar de olhos fechados e pés descalços sobre o palco (sim, como os Sigur Rós), ou que lambem as axilas entre assunções orgulhosas de uma condição mundana confinada ao tempo que dura uma actuação da Peaches, desviando a atenção geral para longe de um oceano de pequenas pérolas que teimam em passar despercebidas. Jonathan James, inglês, 23 anos, já era responsável por um punhado de EPs antes de Portakabin Fever, uma dessas discretas preciosidades, chegar aos escaparates, através de uma parceria entre a Hombré (editora da Bristol que aguça o apetite dos devoradores de trip-hop e quejandos desde inícios dos anos noventa) e a seminal e eclética Ninja Tune.

No “conforto” do pré-fabricado que inspirou o título do disco, James foi colhendo pequenos exercícios seus na guitarra, no baixo e nos teclados, para então se virar para o sampler. O processo parece simples mas o resultado não defrauda. Aparentado com os trabalhos de Four Tet, também eles fruto do encontro orgânico-electrónico, Portakabin Fever é um disco fácil e imediato, cujo grosso das faixas evolui com um ou dois instrumentos (guitarra e piano, frequentemente) em torno de batidas pouco aventureiras. “Re:Percussions”, cinemática, é música quase tão exótica e viajada como o Bulllet da casta The Lost Tapes, mas por outros destinos andou “You Little Trooper”, com a Viena de DJ DSL na palma da mão. “Quite Spectacular”, de tão cristalina, lembra pastos intermináveis onde apetece rebolar, ou uma ascensão ao paraíso vigiada por anjos cantando em coro - uma espécie de “Endlessly” de uns Mercury Rev sem vocalista. “Count Your Blessings”, por sua vez, podia ser um dos exercícios mais melancólicos do RJD2 de Since We Last Spoke. Só fica a faltar ao namedropping um Blockhead de manga curta, bem disposto e desprovido do smog, para termos o quadro emoldurado – hip-hop, funk e folk, desfilando pacatamente para deleite auditivo. Com pouco para ensinar, mas abrindo à boa disposição janelas de par em par.

Não veste roupas da moda - mais depressa seria aquele primo do campo que fala de forma esquisita e arranja com as mãos qualquer aparelho que nos faria desistir sem uma caixa de ferramentas por perto. Portakabin Fever não devia ter passado ao lado dos rescaldos de 2003, mas na verdade era previsível que isso acontecesse. Nele tudo é simples e transparente.
Carlos Costa

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