O drone vai crepitando vagarosamente sobre a cidade negra, submergindo do lodo e da escuridão, das vielas e das fábricas abandonadas onde os fantasmas, ou quaisquer outros seres paranormalmente semelhantes, aterrorizam a populaça. Não há subida de tom e só a custo - por entre o medo - se constata algo mais além do óbvio. É "Chamber", a primeira faixa do novo disco de Avoidant, um dos monikers utilizados pelo madeirense-em-Lisboa Nelson P. Ferreira, um quarto do Colectivo Casa Amarela.

Esse mesmo drone retoma o seu eco na segunda faixa, "At First, The Separation From Your Body Was Harmful", juntando-se-lhe um outro - uma voz ao longe, um grasnar metálico e arrastado, um sussurro ectoplásmico - até se ficar com a sensação que todo o negro nos cairá em cima como uma avalanche. O medo. O único vislumbre de um ser humano é a marca que deixaram nestas torres mortas e a própria imagem mental que criamos ao escutar AVDN; tanto quanto sabemos, a cidade física não pensa. Mas nós, que criamos muros e votamos autofagicamente em patos laranja, nada sabemos. Não sabemos o que discutem as presenças de "Describe Her In Sound" ou a quase-orquestra que se levanta em "Perpétua".

AVDN encaixota-se em muitas categorias: música drone, dark ambient, noise em estado ambiente ou avant-garde electrónico. Mas como em quase tudo o que não seja demasiado óbvio, é uma escuta muito mais interessante pelo despertar de mil prosas pontuadas por electricidade estática que possibilita. Não estamos aqui para vos dizer que este álbum é óptimo, porque o é; estamos aqui para vos mostrar que, ao escutá-lo, poderão ser assomados por mil pensamentos e paisagens diferentes. Cada um de nós tem o seu espectro pessoal ao ouvir música. Saibamos alimentá-lo.