DISCOS
Yumi Zouma
Yoncalla
· 28 Out 2016 · 12:41 ·
Yumi Zouma
Yoncalla
2016
Cascine


Sítios oficiais:
- Yumi Zouma
- Cascine
Yumi Zouma
Yoncalla
2016
Cascine


Sítios oficiais:
- Yumi Zouma
- Cascine
Quase perfeito.
O fim dos Air France não ditou apenas a morte precoce de uma das grandes bandas da era Pitchfork. Foi também uma golpada no romantismo; a dupla sueca pôs termo à sua actividade porque não conseguiu ser perfeita - pelo menos, nas suas cabeças -, porque apesar de todas as suas tentativas não conseguiu dar seguimento a dois dos EPs mais importantes do século XXI, On Trade Winds e No Way Down, pérolas que reluziam mais alto do que as estrelas no mar gigante da música independente. Pop sem complexos, de influências infinitas, carregada de alegria e emoção e melodias espantosas; dois amigos que nos estendiam os braços quando a depressão batia mais forte, mais preguiçosa. Anda lá, o mundo é melhor que aquilo que vês.

Foi um choque, mas não para todos, é certo. Só para os que tiveram a coragem - a bênção - de os escutar ao longo de meia dúzia de anos. E se há quem se tenha afogado novamente na tristeza ou tentado reencontrar nos Saint Etienne essa inocência perdida, outros seguiram à risca os seus ensinamentos e apressaram-se a dar novo fôlego à ideia de que tudo pode ser maravilhosamente belo - basta acreditar que o é. Pelo menos, parece ser essa a premissa dos Yumi Zouma, banda neozelandesa que desde 2014 tem apostado em criações pop que, não podendo ser perfeitas, continuarão a buscar essa qualidade inspiradas pelo sonho ou pela OCD. Seja como for, nós agradecemos.

Depois de no ano passado terem lançado uma compilação com todos os seus trabalhos até então (e na qual figurava, lá está, uma versão de um dos temas mais bonitos dos Air France, "It Feels Good To Be Around You"), os Yumi Zouma respiraram fundo e fizeram um disco. Yoncalla é o resultado de uma miríade de sonhos, talvez todos os sonhos do mundo; é obra de um grupo de miúdos crescidos que não desistiu de olhar para o futuro sem ser pelas lentes grossas de um apocalipse eminente. É um coração imenso e quente que atravessou oceanos só para nos deixar bastante mais felizes.

Pop sempre, e eis os seus ramos: os anos 80, a balearic beat, algum funk sintetizado, AOR, tudo o que seja simples e bonito como um beijinho. Just breathe, just breathe, canta Christie Simpson logo a abrir, em "Barricade (Matter Of Fact)", o mantra que os Télépopmusik deram ao mundo aqui repetido de forma sedutoramente enternecedora. Não que os Yumi Zouma não tenham por vezes os pés no chão, não falem da condição humana - "Text From Sweden" é sobre relações à distância, sobre a mágoa que fica sempre presente, mas também podia ser sobre eles próprios: os quatro Yumi Zouma estão, hoje em dia, espalhados pela Nova Zelândia, Estados Unidos e França.

Yoncalla poderá ser visto à primeira como um disco melhor saboreado no verão, mas experimente-se esta melancolia em qualquer outro período do ano e o resultado é o mesmo. A alma inspira-se e renova-se. O pé vai querendo dançar, suavemente, quase com receio antes de se entregar à ditadura do beat. O stress desaparece como que por magia. As guitarras sonolentas de "Haji Awali" puxam a lagrimita antes de ir deitar, os teclados de "Remember You At All" soam a uma euforia rave perdida algures na memória, "Drachma" fecha com a subtileza de uma folha caída no outono. Yoncalla é quase perfeito, apetece concluir depois dos pêlos se eriçarem à primeira escuta. O seu maior problema é ter apenas 33 minutos de duração. A sua maior virtude é poder rodá-lo duas, trinta, centenas de vezes seguidas.
Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com

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