Este disco revela uma estreia em duo, mas a verdade é que o pianista Vijay Iyer e o trompetista Wadada Leo Smith têm um histórico de colaborações - Iyer integrou o Golden Quartet liderado pelo trompetista entre 2005 e 2010. A solo ou ao leme do seu trio o pianista tem-se confirmado, ao longo dos últimos anos, como um dos mais interessantes pianistas jazz do nosso tempo e na sua estreia pela histórica ECM, com Mutations (2014) voltou a confirmar as expectativas.

Agora, em mais uma edição ECM, Iyer reencontra Leo Smith, figura tutelar do jazz criativo que, além de todo o peso histórico, vem mantendo um assinalável ritmo de produção, invejável não só pela regularidade, como pela continuada qualidade. Só dos mais recentes, vale a pena assinalar America (duo com Jack DeJohnette, 2009), Ten Freedom Summers (2012), Occupy The World (2013) e The Great Lakes Suites (2014), sendo Wadada Leo Smith uma presença recorrente nas listas dos melhores do ano. Smith retoma aqui uma ligação à editora de Manfred Eicher, apenas registada em dois discos: Divine Love (1979) e Kulture Jazz (1993).

Neste duo Wadada fica-se pelo habitual trompete; Vijay Iyer, além do tradicional piano acústico, serve-se também do piano eléctrico Fender Rhodes e da electrónica. Iyer e Leo Smith desenvolvem um diálogo perfeito, num álbum que é uma homenagem à artista indiana Nasreen Mohamedi (1937-1990) - sendo o título do disco uma citação do seu diário, como se expõe no “booklet”. A música do álbum assenta numa toada meditativa, num registo de elevada concentração, embora pontualmente o piano e/ou o trompete não hesitem em mostrar-se mais expansivos.

O disco abre com o tema “Passage”, original de Iyer; fecha com o tema “Marian Anderson”, composto por Leo Smith. Ao centro está a grandiosa “A Cosmic Rhythm With Each Stroke”, uma suite em sete partes, de composição partilhada. Trompete e piano fazem um inteligente uso do espaço, do silêncio, uma reforçada contenção que acrescenta intensidade emocional à música. Iyer (n. 1971) e Leo Smith (n. 1941) trabalham uma irrepreensível sintonia instrumental, piano e trompete entrelaçados. Duas gerações que se encontram, num perfeito ponto de convergência, que não é música do passado, é música do nosso tempo.