DISCOS
Future
DS2
· 05 Out 2015 · 11:37 ·
Future
DS2
2015
Epic


Sítios oficiais:
- Future
- Epic
Future
DS2
2015
Epic


Sítios oficiais:
- Future
- Epic
Ajustem os controles para o fundo do copo.
Future é um grande filho da puta. É um filho da puta que, depois de Ciara o ter deixado por descobrir que ele andava a traí-la, gravou uma música chamada “Pussy Overrated”, com um “colega” de traíções (Wiz Khalifa). É um filho da puta que resolveu borrifar-se para tudo e todos. Sobretudo para aqueles que o viam, desde os tempo de Pluto, como uma potencial estrela pop. Depois de uma tentativa de crossover, com Honest, que não o levou até tais patamares, e de três mixtapes (Monster, 56 Nights, e Beast Mode), surge DS2, que na verdade é Dirty Sprite 2, mas decerto Future não quer arranjar problemas com a marca de refrigerantes, colocando o seu nome na capa de um disco que gira totalmente à volta de drogas e sexo desapaixonado. Dirty Sprite, aliás, é o calão para o lean, a bebida feita com Sprite, doses maciças de xarope para a tosse, e gomas, que é suposto criar um efeito de desaceleração e tontura. E cujo vício pode causar a paragem cardíaca e a morte.

Estabelecido o contexto, o disco é exactamente aquilo que se esperava. Ou seja, um disco para a colecção dos “discos drogados”. Numa época em que, no rock, copinhos de leite como os Temples ou os Unknown Mortal Orchestra são chamado de “psicadélicos” por causa de um efeito ouvido milhares de vezes nas guitarras, DS2 já há muito que deixou para trás essas definições. Future não toma drogas para fazer música para tomar drogas, como diziam os outros. Toma drogas porque parece não saber ou querer fazer outra coisa (”I just need a lot of drugs in my system”, diz na auto-explicativa “The Percocet And Stripper Joint”), e a música que lhe sai nesse estado reflecte-o. Com a ajuda de gente na produção como Metro Boomin’, Zaytoven ou Southside, rima em frases soltas e espaçadas, por entre sintetizadores que lhe tentam imitar o estado mental, e no bom sotaque da sua Atlanta nativa, engole o fim das palavras, como se não se importasse com nada senão com ouvir a própria voz. Acaba por ser como aquele amigo bêbedo que fala sozinho no caminho todo para casa, independentemente de ouvir a nossa resposta ou não.

Então é claro que apetece perguntar, porque é que quereríamos ouvir um disco assim. Basicamente, pela mesma razão que tantos outros discos de estado mental alterado conseguiram. porque o solipsismo de Future arrasta-nos consigo para o seu mundo constantemente submergido em escuridão, strobes, e discotecas escuras. Porque DS2 é “Blinded By The Lights”, de The Streets, elevada a potências desconhecidas. Tirando a última e fantástica “Fuck Up Some Commas”, é desprovido de bangers. “I Serve The Base”, “Blow A Bag” ou “Trap Niggas” ganham alguma velocidade, mas apenas a suficiente para desviar dos postes na rua. “Thought It Was a Drought”, “Rotation”, “Colossal”, “Real Sisters” ou “The Percocet & Stripper Joint” são ditas do fundo de um local onde Future até pode estar rodeado de milhares de pessoas, que nem se apercebe.

DS2 é definitivamente um disco em que o sol não brilha. Não admira que o único convidado seja Drake, outro solipsista por natureza, em “Where Ya At”. Chega a um nível de intimismo raro no hiphop, sem nos dar qualquer vontade de sentir pena de Future (um grande filho da puta). Coloca-nos no olho da tempestade. No irreal causado pelas substâncias estranhas ao corpo e mente, sem nunca passar pelo antes, ou mesmo pela ressaca posterior. Aliás, será que Future alguma vez pára o suficiente para sentir ressaca? Em suma, uma viagem fantástica.
Nuno Proença
nunoproenca@gmail.com

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