DISCOS
Alcest
Shelter
· 17 Fev 2014 · 11:19 ·
Alcest
Shelter
2014
Prophecy Productions


Sítios oficiais:
- Alcest
- Prophecy Productions
Alcest
Shelter
2014
Prophecy Productions


Sítios oficiais:
- Alcest
- Prophecy Productions
O black metal comer-se-à a si mesmo.
A evolução ocorre em todos os géneros. Aliás, o black metal nunca foi um género que pudesse ser facilmente definido de acordo com algo que não fosse a sua estética; mesmo dentro da segunda vaga, aquela que o catapultou para os ouvidos de gente farta de thrash e dos Nirvana, bandas com uma sonoridade tão díspar como os Darkthrone, os Mayhem e Burzum ocupavam o mesmo espaço debaixo desse guarda-chuva pintado de preto e branco. Hoje em dia é sobretudo este último que faz as delícias das novas gerações de Satanás - culpe-se o Filosofem, o disco que provou que o black metal não tinha que ser exclusivamente agressivo mas igualmente tranquilizador, tanto quanto o possa ser dentro de uma igreja em chamas.

O Filosofem acabaria por abrir as portas a muitos praticantes ao som que um bando de miúdos ingleses fazia com as suas guitarras, longe dos holofotes mediáticos e ainda antes da explosão britpop. A evolução do black metal foi assim possibilitada através do recurso às técnicas do shoegaze, dando origem a esta nova fornada de bandas, que vai dos Wolves In The Throne Room aos Deafheaven, malta que daqui bebeu e tirou notas. Tal como Alcest, que foi dos primeiros a conseguir algum reconhecimento com esta fusão, à qual os jornalistas optaram por bem chamar blackwave ou blackgaze para não cansar muito os dedos. É muito mais simples do que escrever "riffs em crescendo, vocais limpos e ocasionais blastbeats".

Porém, são cada vez menos presentes os traços do género original neste género de bandas. Os Deafheaven lançaram para muita gente o melhor álbum de black metal do ano que passou, mas a única coisa que o ligava aos noruegueses de há vinte anos era a secção rítmica; pós-rock com blastbeats e uma libelinha a guinchar, mas nada de black ou sequer de muito metal. O black metal come-se, então, a si mesmo, na ânsia de se expandir e globalizar, à semelhança dos outros géneros; salvo os idiossincráticos originais para quem O Grande Bode é tudo no estilo, não existem muitas mais bandas recém-nascidas a dar uma volta ao género sem o abandonar. Todos os experimentalismos ou são antigos - os Melechesh, por exemplo - ou não dão para mais que um bom disco ou uma risada - o psicadelismo dos S.V.E.S.T. ou o ska nos Peste Noire. Neige, enquanto Alcest, não fugiu à regra, abandonando progressivamente esse manto negro desde 2007, data em que editou Souvenirs D'un Autre Monde.

Chegamos então a este Shelter, o quarto longa-duração de Alcest, sem que o possamos enquadrar na secção "metal" a não ser que tenhamos exclusivamente em conta o passado do seu autor. Se dúvidas existissem de que tal rumo era previsível depois de termos escutado os trabalhos anteriores (incluindo os Amesoeurs), "Wings" corta-as logo à partida; uma introdução de minuto e meio feita ao estilo dos Sigur Rós, em cujo estúdio foi aliás gravado, para depois arrancar na alegria do riff de "Opale" antes de uma voz francesa adocicada começar a dar de si. Não é black metal para dias de sol. Pode ser considerado uma evolução, na medida em que Neige deitou fora um apêndice de que já não precisava. Para quem não conhecer o passado do autor ou esteja assaz desligado destas questões do que é ou não é metal, é apenas um bom álbum pop/rock. Se calhar está na altura de começar a ter estas discussões de trveness no que à pop diz respeito.
Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com

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