Cebolório. É uma palavra nova para mim. É um sinónimo de "ora bolas" ou de "raios". Aplica-se na perfeição ao momento em que se acaba de ouvir este disco. "Cebolório. Porque é que esta teve de ser a última coisa que estes tipos lançaram?" Estamos em Washington, o ano é 1993. Quatro tipos, chateados com a seriedade e falta de euforia dos miúdos indie, juram pô-los todos a dançar. E, durante 10 anos, é exactamente isso que os quatro tipos, que se decidiram chamar Dismemberment Plan, fazem. Agora corre o ano 2003, e talvez pela rendição do mundo indie ao híbrido punk-funk dançável, a banda declara não ter mais nada para dizer, musicalmente falando. Sim, porque eles fizeram de tudo. Os quatro álbuns de estúdio deste quarteto são uma amálgama maníaca de sonoridades, em muito influenciados pelos gostos eclécticos do vocalista Travis Morrison. Continuam a dar alguns concertos, mas, para todos os efeitos, The Dismemberment Plan is fuckin' dead. Algures entre esta notícia e o último concerto da banda, em Setembro último, foi decidido lançar este álbum de remisturas. Mas este não é um álbum típico de remisturas. Pela boa relação que a banda sempre teve com os fãs, Travis Morrison & cia. decidem disponibilizar na sua página oficial os seus temas em mp3, divididos por pistas, lançando um concurso para descobrir os remisturadores de entre os seus numerosos ouvintes.

Parae, Drop Dynasty, Cynyc, Justin Norvell, Noise McCartney, Grandmaster Incongruous, ASCDI, Deadverse, Ev, Ender e Erik Gundel. Conhecem alguns destes nomes? Eu também não. São estes os ilustres fãs desconhecidos dos Dismemberment Plan que decidiram remisturar os temas da banda. Cex, que está ligado à sempre demente família da Tigerbeat 6, é o único "famoso" a participar neste projecto (e é também o único a aproveitar um tema que não seja dos dois últimos álbuns da banda). O disco começa com a barulhenta e perfeitamente dispensável remistura de Parae para o tema Face of the Earth, do álbum Change, fazendo-nos pensar erradamente que o resto será do mesmo calibre. Logo que passamos para a segunda faixa, a remistura de Drop Dynasty para What do You Want Me to Say?, de Emergency & I, a obra-prima da banda, arruinando por completo o refrão pop do tema que julgávamos ser o que de melhor havia nele, manipulando-o de trás para a frente e transformando-o numa faixa completamente nova, cheia de força. O terceiro tema, Academy Award, do disco The Dismemberment Plan is Terrified, remisturada pelo famoso Cex, aparece-nos com aquilo que sempre o fez ser bom: a sua demência. O disco vai correndo, com os remisturadores a trazer novos acompanhamentos aos temas, dando-lhes um cheirinho de drum'n'bass, funk, pop electrónico, até chegar a uma magnífica remistura de Grandmaster Incongruous, um nome que é uma clara homenagem a grandes nomes do hip-hop como Grandmaster Flash ou Grandmaster Melle, para Pay for Piano. Este adiciona-lhe um acompanhamento electrónico, acelerando a guitarra e outro acompanhamento roubado a Pump it Up, de Elvis Costello, mas também uns sopros e até uns gritos (aaaaaaaaaaaaaaaaaaahhhhhhhhhhhhh!). Chegados a este clímax do disco, a parte final do mesmo não tem nada de especial, adicionando a temas de Emergency & I e Change elementos electrónicos, de dub, de rock e de todo o lado, demonstrando que a mensagem da banda chegou de facto a muita gente de diferentes meios. A única remistura a notar aqui é a de Ev para The City, em que é retirado o sintetizador que serve de base para o tema original mantendo-se apenas a sua harmonia, ficando este com uma maior urbanidade. Óptimo para guiar um carro pelas luzes da cidade, contendo até um estranho solo de trompete.

A People's History of The Dismemberment Plan não é um grande disco. É um disco de remisturas, dos fãs para os fãs. Não devia ser o último lançamento da banda, mas foi o que se pôde arranjar. O facto de ignorar quase por completo os dois primeiros álbuns (! e The Dismemberment Plan is Terrified) prende-se com a relutância da banda em tocar temas desses dois discos ao vivo, e com a falta de disponibilidade de temas destes no site da banda. É difícil acreditar que não se tenha conseguido remisturas melhores, mais criativas, como as de Drop Dynasty e Grandmaster Incongruous, que são incontornáveis. Não é um disco essencial, nem o recomendaria a todos os fãs da banda, mas é um documento da variedade de pessoas que os Dismemberment Plan tocaram com a sua música. Do punk à bossa nova, os Dismemberment Plan puseram-nos todos a dançar e é isso que interessa.