Ouvir Portal pela primeira vez levou-me de volta a quando comecei a escutar metalada. Na altura, não percebia nada daquilo que para ali se passava. Barulheira infernal (literalmente), um tipo ou tipa aos guinchos arranhados em invocações aparentemente infrutíferas de Satanás ou Belial ou Belzebú. Depois comecei a distinguir as guitarras, o baixo, as diferenças vocais, enfim, toda uma aprendizagem pela qual se passa apenas com a predisposição - e idade - certa.

Portal é um pouco assim. Quando se acha que já se ouviu tudo o que havia a ouvir dentro do género, vem uma enxurrada sonora, um autêntico incêndio auditivo que nos leva de arrasto: está por todo o lado, não há como o controlar, mas visto de fora até tem a sua beleza. Ouvir Vexovoid é como se tivesse uma trovoada dentro de casa. Está sol lá fora, mas as paredes tremem e a mesa onde escrevo trepida. Dentro dos ouvidos só sinto graves.

O que fica de qualquer álbum destes australianos não é um eventual riff ou letra, mas o ambiente em que nos envolve. Imaginem o monstro de fumo de Lost em nosso redor, a agarrar, sufocar e despedaçar. As letras são irrelevantes, conjuntos aleatórios de palavras nos quais não devemos procurar explicações. A música é altamente e inesperadamente técnica e era, até aqui, menos polida, mais rasgada e profunda. A entrada na editora Profound Lore, não por acaso a mais bem sucedida dos últimos tempos no campo das metaladas, representa um som mais polido e límpido. O ambiente sofre por causa disso, mas o filme de terror permanece.

Na semana em que o Fantasporto começa, nada como ouvir Vexovoid de luzes apagadas antes ou depois de um bom filme de horror. Querem transcendência? Ei-la.