DISCOS
V/A
Cais do Rock Vol.4
· 14 Set 2003 · 08:00 ·
V/A
Cais do Rock Vol.4
2002
Lowfly Records


Sítios oficiais:
- Lowfly Records
V/A
Cais do Rock Vol.4
2002
Lowfly Records


Sítios oficiais:
- Lowfly Records

A priori de qualquer análise sobre «Cais do Rock Vol. 4», a compilação, partamos de uma suposição: se, de facto, existe uma cena de música independente nacional, deve-se o feito em grande parte, sobretudo pelo pioneirismo e pelo desempenho revelados, a uma editora - a Lowfly. A ela vimos associada, desde 1994, a realização do Festival Cais do Rock, em Póvoa de Varzim, no qual actuaram, entre outras, bandas como os Zen, os Primitive Reason, os Pinhead Society, os Coldfinger, os Supernova ou os Astonishing Urbana Fall, nomeadamente no exórdio das suas carreiras. À Lowfly deve-se ainda, por exemplo, a edição internacional do single «I Confess» de Bonnie Prince Billy ou a edição de álbuns de gente como os Dr. Frankenstein e os Clockwork. A divulgação de novos projectos de origem nacional, independente de géneros estilísticos, parece ser desde sempre, aliás, a principal preocupação da editora nortenha e qualidades como honestidade e empenho terão contribuído certamente para o crescimento de uma editora que não vive propriamente numa mansão com piscina e com campo de golfe.

«Cais do Rock Vol. 4» conta, no alinhamento, com alguns dos projectos que actuaram no Festival Cais do Rock nas edições de 2000 e 2001 e com outros que a Lowfly planeou levar ao palco do Festival Cais de Rock no ano de 2002, projecto esse que viria a ser interrompido pela Câmara Municipal de Póvoa de Varzim que deixou, nesse ano, de apoiar o evento por motivo de «contenção de despesas». Deste modo, «Cais do Rock Vol. 4» surge num período conturbado da editora mas nem por isso o denuncia. São vinte e cinco os temas que percorrem a compilação, propriedade de dezasseis projectos nacionais e de nove internacionais - com sede em países como Espanha, México, Inglaterra, Itália, Bélgica, Suécia e Estados Unidos da América.

Do extenso leque de sons e temas, a melhor parte é-nos oferecida por Old Jerusalem que, em «So Developed in Our Serfdom», nos apresenta a sua folk de teor acústico e delicado, pelos Alla Polacca que em «2:59:57m» investem numa mini banda sonora simultaneamente trágica e confiante à la Philip Glass depois de ter ouvido OK Computer, pelos Dr. Frankenstein que traçam um brilhante momento musical para acompanhar uma cena de assalto num filme de série b em «Road To Tabasco» e pelos Fingertrips que espalham, tão sabiamente, o seu humor negro sobre uma toada ska triste em «Mr. Freddy». Curiosamente são também nomes recentes como Bypass, Fat Freddy, Stealing Orchestra, Americans Are Dangerous e Glory Vox – todos eles de origem nacional – a marcarem os melhores momentos do disco, a par dos nomes já citados. Os veteranos More Republica Masónica e Cello, ironicamente, cumprem a mediania.

O principal senão do disco será, porventura, o facto da qualidade musical decrescer consideravelmente a meio da viagem, quando projectos como Old Jerusalem, Bypass, Alla Polacca, Fat Freddy, Stealing Orchestra e Dr. Frankenstein, todos de seguida e anteriormente, elevaram grandemente as expectativas. Projectos como Fifty Foot Combo (Bélgica), Lost Acapulco (México) e The Nuggets (Suécia), apesar de remeterem-nos, sem grandes acidentes, para uma tradição rock’n’roll e surf, não conseguem imprimir no ouvinte a sensação de novidade e muito menos de diferença. Por sua vez, no campo do morno, deparamo-nos com uns Deluxe (Espanha) a cantar Beatles com a voz de Beck e uns Kryptonics (Portugal) a recordarem-nos o rock bem disposto dos Presidents Of USA.

Finalmente a coisa volta a aquecer com os Glory Vox que, simpaticamente, cruzam a música dos Paradise Motel com a voz de uma Polly Jean Harvey mais contida (verificar em «Eternal Love»). De súbito, surge o pior. Alex Lowe (Inglaterra) e Galáctica (Espanha) conseguem assinar os piores momentos de uma compilação repleta de bons exemplos. Sensaboria será um termo adequado à sensação que é ouvir estes dois temas. No entanto, não há nada que não nos salve de tamanho trauma: Cello e The Fingertrips assinam os derradeiros rebuçados da compilação, marcados por uma sensibilidade pop – elegante, no primeiro caso, e calorosa, no segundo – de fazer roer as unhas a muitos projectos que andam por aí à procura desse valor que não se compra: a autenticidade.

Apesar de alguns instantes inconsequentes, a compilação revela-nos grandes surpresas, nomeadamente de origem nacional, que nos remetem para uma constatação: Portugal é, cada vez mais, um receptáculo de novos projectos com pernas para andar mas falta-lhe, muitas vezes, a existência e a consistência de meios de edição e divulgação. Salvo seja, assim, o trabalho desenvolvido pela Lowfly há cerca de uma década e de novas editoras como a Bor Land, a Nylon, a mono¨cromatica, a Lisbon City Records e a Independent Records. Tiago Carvalho

The FingerTrips The FingerTrips
2003
Lowfly Records

A pretexto da compilação Cais do Rock Vol. IV da independente Lowfly Records, aproveitamos para dar conta da edição do single de estreia do projecto do Porto Fingertrips, também editado pela editora de Rui Ricardo e Esgar Acelerado. Formados em 2001, e compostos por Purple na voz, Necko na guitarra, Xamax no baixo, Pedro na bateria, Figas nas teclas, Nanda no saxofone alto e Hélder no saxofone tenor, os Fingertrips criaram todo um imaginário cenográfico que muito contribui para uma personalidade bem vincada. Nos concertos, dizem, atingem o seu expoente máximo de festa. Puros delírios de mostra de talento nato, em canções de gangsters que vagueiam por uma noite com tons pouco definidos. O single é constituído por dois temas, “Mr. Freddy” e “Guilt”, sendo que o primeiro também se encontra na compilação em cima analisada, embora numa versão diferente. Ambas as músicas devaneiam por entre uma toada ska festiva e um cenário que lembra dinheiros sujos e “garotas” à espera de companhia, pertencente ao imaginário criado pela banda. Uma boa surpresa. Tiago Gonçalves


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