DISCOS
Antony & The Johnsons
Swanlights
· 27 Abr 2011 · 09:53 ·
Antony & The Johnsons
Swanlights
2010
Rough Trade / Popstock


Sítios oficiais:
- Antony & The Johnsons
- Rough Trade
- Popstock
Antony & The Johnsons
Swanlights
2010
Rough Trade / Popstock


Sítios oficiais:
- Antony & The Johnsons
- Rough Trade
- Popstock
A falta de identidade, a morte enquanto mudança, mas sobretudo as canções.
Antony é um dos corpos mais estranhos da pop actual. Tanto enquanto Antony Hegarty, que não se define segundo os moldes tradicionais daquilo que constitui uma "pessoa" ou um "homem", como enquanto Antony & The Johnsons, o grupo por detrás de canções maravilhosas cantadas por uma voz dolorosamente andrógina. Naturalmente, há que constatar que um não pode existir sem o outro; as vivências de Antony são as canções dos The Johnsons. Quando cantava em 2005 for today I am a child, for today I am a boy / one day I'll grow up, I'll feel the power in me, ou mais tarde tornava suicida a pérola exuberante que é "Crazy In Love", existia, ao contrário do que é habitual na música pop (habitualmente, um terreno fértil para a imaginação) um enorme fundo de verdade. A indefinição de Antony - invariavelmente construída por uma maioria social (ou quem somos nós, brancos heterossexuais, para "definir" o que é o "indefinido"?) - é o que o leva a desnudar-se perante o mundo que, salvo boas excepções, não o compreenderá.

Porque tentar inserir Antony num grupo pré-criado ou tentar saber quem ele é constitui um choque; assim como constituiu um choque ter ouvido a sua voz pela primeira vez, no álbum homónimo de 1998; assim como a capa de Swanlights, um urso polar morto para que um grupo de cães no Árctico não passasse fome, é um choque. Mais do que qualquer outra pessoa, ele saberá a beleza terrível que se esconde na tristeza. Uma tristeza que nos atinge logo de início com "Everything Is New", onde a voz e um piano entram de rompante, confessam I cried everything / everything is new - faltando talvez o «because» ali no meio - e desaguam em "The Great White Ocean", onde se torna perceptível que o "novo" será a morte; uma morte omnipresente em todo o disco, ela que não deixa de ser bela, ele que não se torna depressivo (Swim with me my Sister when I die / In the great white ocean we must try / Try to find a way that we can see / See each others faces in the sea).

É fácil, demasiado fácil, elogiar a voz de Antony Hegarty, e descurar o trabalho excelente desempenhado pelos instrumentalistas que o acompanham. Tentemos então não o fazer, e exaltar de igual modo os arranjos dos The Johnsons especialmente em faixas como "Ghost" (incrível), "The Spirit Was Gone" ou o bonito dueto com Björk, "Flétta". Mas a voz, porque parte de quem pensou as canções, é e será sempre o motor deste disco e dos anteriores; porque impede que uma canção seja fraca, porque tem o pendão de fazer esquecer um momento menos bem conseguido, musicalmente falando, como a faixa-título. Salva vidas enquanto se tenta salvar a si.

Swanlights termina como começou; com o novo. "Christina's Farm", e o constatar de que everything was new, mostra uma certa adaptação à morte. Ou, tendo em conta as palavras de Antony no artbook que acompanha alguns lançamentos do disco, a uma nova vida: I don't want your future. I hope when I die, that I never return to your world. I will go where the trees go. De novo o desfasamento, a indefinição. Fica-se então, escutando este disco e pensando igualmente nos anteriores, com a dúvida: que acontecerá se alguma vez Antony se encontrar, descobrir o seu espaço entre nós? Não saberemos responder, se não com algum sadismo - quase desejamos, ao ouvi-lo, que nunca seja feliz.
Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com

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