DISCOS
Ill Blu
Meltdown EP
· 24 Fev 2011 · 10:16 ·
Primeiro documento essencial de um dos nomes mais entusiasmantes da música de dança made in UK.
Apesar dos receios em relação às vias a tomar em 2011, é forçoso reconhecer que, enquanto género, a UK Funky tem vindo a encontrar plataformas de divulgação cada vez mais eficientes. Apesar de estar ainda, essencialmente assente em freebies e meios digitais como o Juno, parece ter-se libertado da ideia de que dubplates de 30 libras e programas de rádio constituem um meio suficientemente eficaz para uma divulgação que se quer (supomos) cada vez menos restringida a um nicho de difícil concepção para quem não se encontra no epicentro dos acontecimentos. O que permite que malhas nascidas no seu seio venham a lume com uma maior incidência. Tanto melhor.
No seguimento de um desapontante 12” editado na Hyperdub (que também editou, para melhores resultados, os igualmente essenciais Funkystepz), o duo Ill Blu vem finalmente credibilizar, fora desse espectro, tudo aquilo que se lhes apontava de bom e que estava, até agora, refém de remisturas e da militância na icónica Rinse.fm. Para todos os efeitos, já tinha existido um quase clássico com a “Frontline” e a atenção dos indie darlings Hot Chip (remix para “I Feel Better” é apenas uma, entre malhas tão essenciais como “Good Times” para os Roll Deep ou “Pull It, Wheel It” para a Shystie), granjeando-lhes lentamente um papel transversal em tudo aquilo que interessa na música de dança britânica, mas faltava ainda um primeiro passo editorial que viesse a tornar factual todo este processo.
Meltdown EP é uma primeira prova cabal da magnitude de um talento inescrutável para a composição de bangers absolutamente antémicos. Com edição pela emergente Numbers (depois de nomes como Untold ou Roska), consegue encapsular de modo fidedigno a estética particular do duo londrino em três malhas, já conhecidas do éter, mas agora com direito a espaço próprio. Sem que seja necessário recorrer à voz robotizada que anuncia o seu nome em todas as suas produções e remisturas. Um indíce de tudo aquilo que faz do género uma força anímica inescapável, criando uma intrincada rede de ligações entre as premissas identitárias do género e uma marca autoral distinta.
Ponto alto (entenda-se: euforia absoluta) de todo e qualquer dj set ao longo do ano transacto, “Meltdown” é reflexo da precisão hi-tech que os Ill Blu têm vindo a lapidar. Assim que aquelas congas circulares se vão enredando, tudo converge naquela antecipação que precede algo grandioso, com os ecos a chamar a batida de uma tarola que nunca se apoia num kick 4/4, mas ocupa todo o espaço restante que interessa para a dança. Sem ceder a uma lógica estritamente crescente, deixa-se cair num sintetizador liquefeito quando já está instalado o movimento só para que a entrada consequente assuma um protagonismo ainda maior. Adensa-se para se diluir continuamente, e nunca se deixa cair numa demonstração de poderio rotineira, entrelaçando matrizes harmónicas e rítmicas num contínuo mutante. Como se a grandiosidade agreste de algumas produções do Danny Weed se visse livre do espartilho Grime para se atirar a uma disparidade de elementos alienígenas, mas de construção meticulosa.
Na senda desse mesmo ascetismo processual/rítmico, “Overdose” começa numa rarefacção de batidas crispadas e sons rasteiros que vão ganhando forma com a entrada de uma linha de sintetizador saltitante de “Blu Magic”. A chegada da linha de baixo propulsiona o tema para a estratosfera, em tangentes com o efeito galvanizador desta mesma no Jungle, para se manter por lá. Sem estagnar. A fechar, “Chelt” convoca um 4/4 subliminar para pratos de choque e bombo profundo (numa maior aproximação às matrizes do techno) em despique com as tarolas militares de um Lil Silva. Sob tudo isto fervilha em lume brando um sintetizador plácido, a fazer coabitar de modo (aparentemente) paradoxal a impenetrabilidade rítmica com uma dimensão melódica nuanceada.
Existe em tudo isto uma certa aspereza que afasta os Ill Blu da faceta tendencialmente mais comercial do género (i.e.: tácticas House), mas também uma devoção ao factor dança que leve os cabotinos da música electrónica a desdenhar. Ainda assim, se gente como o Lil Silva ou o Roska (que nunca atingiu estes níveis de grandeza) consegue tocar o corpo de públicos tão distintos, todo o savoir faire revelado em Meltdown EP tratará de lhes conferir um estatuto igualmente respeitável. Termo esse, que numa música com estas características, será o equivalente a ver o Cardozo o mandar calar os adeptos aquando de uma bomba às redes adversárias. O que será tão surpreendente quanto aceite com naturalidade. Está tudo lá/aqui.
Bruno SilvaNo seguimento de um desapontante 12” editado na Hyperdub (que também editou, para melhores resultados, os igualmente essenciais Funkystepz), o duo Ill Blu vem finalmente credibilizar, fora desse espectro, tudo aquilo que se lhes apontava de bom e que estava, até agora, refém de remisturas e da militância na icónica Rinse.fm. Para todos os efeitos, já tinha existido um quase clássico com a “Frontline” e a atenção dos indie darlings Hot Chip (remix para “I Feel Better” é apenas uma, entre malhas tão essenciais como “Good Times” para os Roll Deep ou “Pull It, Wheel It” para a Shystie), granjeando-lhes lentamente um papel transversal em tudo aquilo que interessa na música de dança britânica, mas faltava ainda um primeiro passo editorial que viesse a tornar factual todo este processo.
Meltdown EP é uma primeira prova cabal da magnitude de um talento inescrutável para a composição de bangers absolutamente antémicos. Com edição pela emergente Numbers (depois de nomes como Untold ou Roska), consegue encapsular de modo fidedigno a estética particular do duo londrino em três malhas, já conhecidas do éter, mas agora com direito a espaço próprio. Sem que seja necessário recorrer à voz robotizada que anuncia o seu nome em todas as suas produções e remisturas. Um indíce de tudo aquilo que faz do género uma força anímica inescapável, criando uma intrincada rede de ligações entre as premissas identitárias do género e uma marca autoral distinta.
Ponto alto (entenda-se: euforia absoluta) de todo e qualquer dj set ao longo do ano transacto, “Meltdown” é reflexo da precisão hi-tech que os Ill Blu têm vindo a lapidar. Assim que aquelas congas circulares se vão enredando, tudo converge naquela antecipação que precede algo grandioso, com os ecos a chamar a batida de uma tarola que nunca se apoia num kick 4/4, mas ocupa todo o espaço restante que interessa para a dança. Sem ceder a uma lógica estritamente crescente, deixa-se cair num sintetizador liquefeito quando já está instalado o movimento só para que a entrada consequente assuma um protagonismo ainda maior. Adensa-se para se diluir continuamente, e nunca se deixa cair numa demonstração de poderio rotineira, entrelaçando matrizes harmónicas e rítmicas num contínuo mutante. Como se a grandiosidade agreste de algumas produções do Danny Weed se visse livre do espartilho Grime para se atirar a uma disparidade de elementos alienígenas, mas de construção meticulosa.
Na senda desse mesmo ascetismo processual/rítmico, “Overdose” começa numa rarefacção de batidas crispadas e sons rasteiros que vão ganhando forma com a entrada de uma linha de sintetizador saltitante de “Blu Magic”. A chegada da linha de baixo propulsiona o tema para a estratosfera, em tangentes com o efeito galvanizador desta mesma no Jungle, para se manter por lá. Sem estagnar. A fechar, “Chelt” convoca um 4/4 subliminar para pratos de choque e bombo profundo (numa maior aproximação às matrizes do techno) em despique com as tarolas militares de um Lil Silva. Sob tudo isto fervilha em lume brando um sintetizador plácido, a fazer coabitar de modo (aparentemente) paradoxal a impenetrabilidade rítmica com uma dimensão melódica nuanceada.
Existe em tudo isto uma certa aspereza que afasta os Ill Blu da faceta tendencialmente mais comercial do género (i.e.: tácticas House), mas também uma devoção ao factor dança que leve os cabotinos da música electrónica a desdenhar. Ainda assim, se gente como o Lil Silva ou o Roska (que nunca atingiu estes níveis de grandeza) consegue tocar o corpo de públicos tão distintos, todo o savoir faire revelado em Meltdown EP tratará de lhes conferir um estatuto igualmente respeitável. Termo esse, que numa música com estas características, será o equivalente a ver o Cardozo o mandar calar os adeptos aquando de uma bomba às redes adversárias. O que será tão surpreendente quanto aceite com naturalidade. Está tudo lá/aqui.
celasdeathsquad@gmail.com
ÚLTIMOS DISCOS
ÚLTIMAS