Começamos a ficar (bem) habituados a algumas pedradas no charco do panorama da música electrónica com chancela lusitana. Apesar de Misstakesonlove se tratar de um primeiro mergulho na piscina dos lançamentos discográficos, os Twokindermen estão longe, muito longe de caber no departamento dos delfins provenientes do pc lá do quarto de dormir. Tanto António Contador como Nuno Antunes - além de idade para ter juízo - têm um background bastante apreciável e ecléctico enquanto DJ’s, ao mesmo tempo que reclamam influências e referências de fontes diversas como as texturas abrasivas de DAT Politics, a electrónica melodiosa de Ms John Soda ou a música de dança meritoriamente consensual de Matthew Herbert.

Para encerrar o capítulo das apresentações, sobra referir que Misstakesonlove carimba também o debute editorial de uma nova etiqueta: Kinder Of Heart. Mais que simples editora, a KOH compromete-se como veículo de uma filosofia da qual Misstakesonlove pretende ser auto-explicativo. É isso que veremos a seguir.

Misstakesonlove extravasa simplicidade, sugerida num primeiro contacto pelo artwork - dominado pelos eternos e simpáticos (mesmo que armados) playmobil - e confirmada posteriormente pelo desenrolar das sete faixas. Música de cariz minimalista, perfeitamente dançável - dominada por contrastes e associações baixo/bateria - e adornada aqui e acolá com motivos lúdicos, aparentemente imaculados e inofensivos. A conjugação destas peças viaja entre estímulos ao físico como o groove bem “esgalhado� da introdutora “Leit Mobil�, e intervalos para o recreio de que “Prize Winner� é perfeitamente ilustrativa, não tendo sido preciso esperar muito para o baptismo desta manifestação: kindertrónica, a saber “electrónica com cheiro a limpo, linhas anatómicas bem definidas, ângulos aguçados e resplandecentes, melódica, colorida.�.

Sem dúvida que tanto a kindertrónica como a Kinder of Heart nasceram bem. Misstakesonlove é apreciavelmente sólido e estanque para trabalho de estreia, e justifica o depósito de confiança nos Twokindermen. Todavia, não deixa de ser sintomático o facto de as primeiras 2/3 músicas retratarem fielmente todo o conjunto que compõe o álbum. Apesar da referida alternância entre ambientes etéreos e atmosferas palpitantes, sente-se que a definitiva ultrapassagem da (mais) complicada barreira da diversidade sonora fica, quem sabe, para a próxima aventura.