Ainda hoje se ouve na música de Ian Simmonds o espírito irrequieto que caracterizava o som transversal dos The Sandals. Uma inquietude resultante da incessante indagação por paisagens irregulares, padrões geometricamente imperfeitos ou texturas abstractas. E se alguns da sua geração desistiram por cansaço de procurar por novos portos onde atracar, Ian Simmonds, inconformado, seguiu em frente procurando sempre dar o passo seguinte na sua vida pessoal e artística. Foi então que há dois anos encontrou na Alemanha um discreto lugar chamado Jena. Lá, conquistado pela pacatez de uma pequena vila, procurou um novo estilo de vida que se adequasse à constante pulsação do nervo criativo. The Burgenland Dubs reflecte essa mudança de latitude, colocando o nível da música de Simmonds num patamar de difícil assimilação, tal a visão retorcida que tem da música contemporânea.

Por regra, os sons de Simmonds nunca são de fácil apreciação - com isto não querendo dizer de amor impossível. Uma vez entendidos os propósitos que o movem como músico e descodificados os misteriosos puzzles sonoros em que nos envolve instintivamente, a mescla ambígua fruto de ensaios especulativos, acaba por se transformar em eloquentes demonstrações artísticas repletas de belas e nublosas harmonias acompanhadas por cadências atónitas divididas entre o sincopado e o linear quatro por quatro. Um som vivo, altivo e desassossegado, merecedor de cuidada exploração, capaz de resistir, como poucos, à passagem tirana do tempo.

Isto é o que se descobre uma vez mais no novo disco de Ian Simmonds. Está tudo aqui o que esperávamos dele: os algoritmos matemáticos engendrados em laboratórios gelados e confusos, o techno retorcido e camuflado, a urgência de afirmação de um jazz de dupla face, a pop melancólica sussurrada ao ouvido entorpecido, harmonias tunisinas, ritmos africanos pseudo-cibernéticos e o dub calculista como acabamento para as imperfeições. Tudo aqui, consequência da ambição de fazer mais e melhor, muito distante da genialidade de Last States Of Nature (1999), mas mesmo assim um som intrigante, fascinado pela concepção de paisagens de contornos erráticos e interessante pela moldagem assertiva e corajosa de diversas facções estéticas. Música complexa capaz de criar resistência em ouvidos empedernidos e pouco tolerantes a este tipo lufadas modernistas. The Burgenland Dubs é um disco de ambientes duros e frios que se aprende a gostar uma vez eliminado o emaranhado formado nas primeiras audições. Leva tempo, mas chega-se lá.