DISCOS
Ty Segall
Ty Segall
· 20 Jan 2009 · 09:43 ·
Ty Segall
Ty Segall
2008
Castle Face


Sítios oficiais:
- Ty Segall
Ty Segall
Ty Segall
2008
Castle Face


Sítios oficiais:
- Ty Segall
O diabo e Ty Segall enterram o compromisso técnico e despertam o mais travesso cadáver rock numa espécie de funeral eléctrico invertido.
Gozar da bênção dos Sic Alps (com quem já tocou) e de John Dwyer (que o edita na sua própria Castle Face) é meio caminho andado para que Ty Segall não seja apenas mais um segredo local a boiar no caldeirão guarnecido pelo rock corrosivo de São Francisco. Ter a aparência e a pujança de um Buddy Holly cuja vida depende de Jack Daniel’s e café puro faz o resto. Para estar ao nível da etiqueta nerd fundada por Buddy Holly, falta apenas uma lente nos óculos que Ty Segall usa no alucinado teledisco de “Pretty Baby (You’re So Ugly)”. As credenciais são convincentes.

De resto, são muitas as cartas que faltam no baralho daquele que por aqui se estreia em nome próprio. Falta-lhe vontade de encarrilar a canção numa via ortodoxa (a do aprumado verso-refrão-verso). Em conformidade com isso, o rigor e a complexidade são valores descartados (os temas são porcamente directos). Foi também esquecida qualquer preocupação em manter a mínima higiene do pegajoso reverb, que é cada vez mais uma praga apreciável oriunda de São Francisco.

Ou seja, os Sic Alps não surgem na primeira linha só por acaso. Ty Segall cose o seu rock com retalhos e franqueza semelhantes ao da dupla de U.S. Ez. Ambos são igualmente avessos à ideia de que o rock, enquanto entretenimento, deve ser industrializado e tecnicamente impressionante. Ty Segall não poderia parecer menos preocupado com as oscilações na bolsa de popularidade da Billboard. Provavelmente não saberá distinguir uma Solange Knowles de um Lil Wayne. Só a guitarra, bombo e pratos importam para alguém que, em modo de one man band, obtém o mais vigoroso estardalhaço vendendo a alma aos Cramps e aos Ramones (homenageados numa versão de “You Should Never Have Opened That Door”, que consegue estupidificar o que parecia “inestupidificável”). Isto quando os Traditional Fools (banda mantida por Ty a par dos Epsilons) já gritavam Gabba Gabba Hey! como quem reclama o direito a ser incondicionalmente imbecil em “Davey Crockett” (Oh Davey Crockett, watcha got in your pocket?).

Estava afinal enganado quem não acreditava ser possível existir um intermédio entre o ataque no-fi dos Guitar Wolf (RIP) e a combustão operada pelos Beatles quando – logo na estreia Please Please Me - revisitaram “Twist and Shout” dos Topnotes (criando assim a música que torna ainda mais inesquecível determinada cena do filme de culto O Rei dos Gazeteiros). Ty Segall também faz gazeta: baldou-se a todas aulas de etiqueta e tem neste o disco que o pode afirmar como aspirante ao lugar do anticristo que prega o fim da fé merecida pelo rock bem comportadinho e polido. Atirem-lhe água benta.
Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com
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