DISCOS
Khan
Who Never Rests
· 03 Mai 2007 · 08:00 ·
Khan
Who Never Rests
2007
Tomlab / Flur


Sítios oficiais:
- Khan
- Tomlab
- Flur
Khan
Who Never Rests
2007
Tomlab / Flur


Sítios oficiais:
- Khan
- Tomlab
- Flur
Khan ao cubo oferece tudo para ser adorado triplicadamente ou recusado com a mesma intensidade.
Who Never Rests leva a que sejam reconsideradas as hipóteses sobre o que terá segredado Bob Harris (encarnado por Bill Murray) aos ouvidos de Charlotte no muito Antonioni final de Lost in Translation – O Amor é um Lugar Estranho. Caem por terra as suspeitas de que o trunfo publicitário do whisky Suntory terá sugerido que num futuro próximo poderia o casal vir a consumar aquele flirt. Com Who Never Rests em mente, aumentam as probabilidade de terem sido as suas palavras semelhantes a estas:Devíamos ter perdido mais tempo em clubes de karaoke, desembaraçados do ridículo a que estávamos sujeitos na reinterpretação de temas do Brian Ferry. Tiveram propósitos meramente estéticos aqueles teus passeios por templos budistas e sentada à janela tendo a paisagem urbana de Tóquio como fundo.

É preciso alguém com a energia inesgotável de Khan (o mais proeminente dos disfarces que assume Can Oral) para inverter o sentido ao argumento romântico de Sofia Coppola da mesma maneira que aplica as técnicas de repetição assimiladas à electrónica para a feitura de um disco de atitude bem mais rock. Posto isto, prontamente se constata que Who Never Rests é disco de criativo inquieto disposto a confiar à demência a gestão da sua reinvenção permanente, um objecto comprometido a morrer electrocutado se necessário na missão da pintar a néon os bares europeus com a mais dúbia clientela. Daí que seja puramente retórica a questão que coloca “Do You Party?” ao house viciosamente kitsch que deixa num rebuliço a cabeça dos putos que festejam a decadência nas mais desactualizadas discotecas de Lloret del Mar e Benidorm.

Espera-se por parte de alguém com o nome de Can Oral que seja capaz de tudo mais além daquilo a que se compromete o seu nome de baptismo. O hiperactivo que foi contratação luxuosa da Matador, numa altura em que a gigantesca label importava electrónica Europeia como cerejas, afoita-se a assumir por completo as vocalizações provocadoras e imperativas, quando na Babel multi-colorida de No Comprendo havia encarregado gente tão respeitável como Julee Cruise ou Diamanda Gálas de cantar nas suas criações essencialmente electrónicas. Desta vez, só Khan pode ser responsabilizado pelo interrogatório feito a um impulso masturbatório herético executado no lounge automatizado de “Satan Backwards” ou pelo charme de herói porno de início da década de 80 que cresce no peito muito Brian Ferry (mais uma vez) da faixa-título “Who Never Rests...”. A culpa ou mérito respeita apenas a Khan num disco que só a ele pertence.

Who Never Rests encontra-se tão encharcado de perfume patcholy (Khan tem como pseudónimo El Turco) como de slogans sexualmente convidativos: Favor after Favor malha persistentemente no ferro quente de uma "Honey, it's been a journey" pós-climática e com a repetição infinita do título no refrão vai assumindo que assim se sucedeu a festa e deboche e que assim continuará a ser daqui em diante. Apesar de prometer mais celebração e sensações intensas para um futuro próximo, Who never rests favorece mais os caprichos pessoais de Khan que propriamente as escutas que aqui caírem de pára-quedas.

Os devotos que aceitarem a megalomania criativa de Khan aqui elevada ao cubo, podem desde já render-se a este ponto a favor da filosofia get dumb que é cada vez mais perceptível nas pistas de dança. Os restantes podem recuar até No Comprendo ou 1-900-Get-Khan e, dependendo dos resultados, arriscar despir incondicionalmente toda a roupa ao som de Who Never Rests, que, afinal, representa algo muito semelhante ao que nos oferecia o início de Lost in Translation: uma curvilínea ostentação de sexyness capaz ou, pelos menos, convencida de que mudará o mundo.
Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com

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