EDP Vilar de Mouros 2018
Vilar de Mouros
23-25 Ago 2018
O último dia do festival só se poderia ter feito com um costeletão enorme e a raiar de sangue no bucho, cortesia do restaurante O Dias, na pacata aldeola de Covas, até onde se chega depois de uma sucessão de curvas e contra-curvas que serão capazes de enjoar os maus incautos. Com a digestão, a náusea e um roadie de Luís Severo aos ombros, apanhámos o cantautor lisboeta a debitar temas já clássicos do cancioneiro moderno como "Cabeça De Vento", "Escola" (numa versão mais acelerada que a que lhe conhecíamos), "Amor E Verdade" e "Ainda É Cedo", num concerto que teve a dura missão de fazer esquecer o derby. Não eram muitos os que estavam no recinto a esta hora mas parece que o Severo conseguiu-o.

John Cale começou por dizer que era bom ver Portugal, e depois atirou-se de cabeça a um rock quebrado e dançável, a fazer lembrar David Byrne .Ou será David Byrne que nos faz lembrar John Cale? Pouco importa. Depois desse rock veio a estranheza avant-garde, com uma espécie de cântico, campainhas, algum drone e guitarras tocadas com arcos, até tudo terminar como Cale começou: com uma versão dos Velvet Underground, no caso "I'm Waiting For The Man", com o piano, repetitivo, a ditar as suas regras. Interessante, mas aquele não é palco para ele: metam-no num Semibreve.

Os Los Lobos fazem rock cantado em espanhol, o que é sempre execrável, e não se esqueceram de "La Bamba", o seu maior sucesso, que nem sequer é um original seu. Os pedidos para que o público cumbiasse encontraram eco em alguns, que provavelmente nunca viram um set do La Flama Blanca. Seja como for o Porto estava a perder, logo, este concerto - e a vida em si - foram um lixo. Ao contrário do dos dEUS, que em nova incursão por Portugal (e eles já são da casa) trouxeram um espectáculo em modo best of onde se destacou "The Architect", a toada bossa nova de "Nothing Really Ends" e a fabulosa "Bad Timing". No fundo, os dEUS tratam cada concerto em Portugal como se fosse o primeiro - e isso é extremamente louvável. Até somos pessoas para os vermos outra vez.

Quem também é da casa são os James, que levaram uma vasta multidão até Vilar de Mouros, algo no qual se calhar ninguém acreditaria - espectáculos dos britânicos por cá já são mais de trinta. Até na ponte que cruza o rio havia quem se empoleirasse para ver Tim Booth atirar-se para o meio do povo, insurgindo-se contra a omnipresença dos telemóveis logo a seguir, durante "Getting Away With It (All Messed Up)". Voltaria a repetir a proeza logo depois. «Mudamos o alinhamento todas as noites, e também durante os concertos», e é por isso que se ouviu "Curse Curse"; saímos durante uma versão mui soft de "Sit Down" e levamos para sul a crença de que Vilar de Mouros é provavelmente dos poucos festivais aos quais ainda vale a pena ir para realmente ouvir um pouco de música. É só proibir a entrada a betos. Ou não o tornar "fixe" o suficiente.
· 17 Set 2018 · 01:22 ·
Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com

Parceiros