Warm-Up Paredes de Coura
Praça D. João I, Porto
12-13 Abr 2013
Embora a disposição para ver uma banda que vai pelo nome de "Sensible Soccers" não fosse a melhor - virtude de um certo resultado num jogo desse mesmo soccer a ocorrer à mesma hora - a verdade é que o quarteto não desilude nunca, conjugando grosso modo a melodia etérea das suas guitarras com a finesse do beat balear (ou: como encher uma frase com jargão absurdo na secreta esperança de voltar a ser insultado aqui), proporcionando um concerto sobejamente agradável, ainda mais para quem destes sensíveis viu já tudo e mais alguma coisa. Faltou "Fernanda", e, claro, uma qualquer cover dos Smiths, indiferentes que estavam aos cartazes de uns quantos fãs mais acérrimos nas primeiras filas (ou talvez não), mas existiu um concerto fenomenal a abrir da melhor forma a segunda noite do Warm-Up. Para que, um dia, o cinquentão de ontem se pergunte: os Sensible Soccers eram do caralho, não eram?

As Stealing Sheep são três meninas fofinhas que fazem música de acordo com a sua personalidade; tão leve que poderia encher uma almofada onde deitássemos a cabeça e adormecêssemos um sono profundo, indiferentes ao que nos rodeia - e principalmente às Stealing Sheep. Mais uma banda indie que por algum motivo adorna os discos rígidos das crianças da audiência (sim, que ninguém no seu perfeito juízo lhes há de ter comprado um disco) e que provoca desenfreados suspiros asmáticos de bajulação. Com tantas coisas de maior assunto por aí a circular esperemos que alguém tenha aproveitado a dica e ido jantar. Além do mais, que pessoa de má rês roubaria uma ovelha?

Os Linda Martini marcaram uma geração; se os Ornatos Violeta são para os ex-fiéis do mIRC aquela banda que proporcionou ternos momentos na juventude (o primeiro beijo à séria, a primeira saída nocturna, o primeiro chumbo escolar, esse género de situações) o quarteto lisboeta é-o para os que ainda chegaram a tempo de se maravilhar com o falecido MSN - dado o imediatismo das suas letras, dos versos corta-e-cola, das palavras sujeitas a aparecerem como um graffiti numa qualquer rua suja do Bairro Alto. O primeiro concerto dos Linda Martini deste ano foi um belíssimo exercício de memória, seja porque "Dá-me A Tua Melhor Faca" ainda existe amargamente no nosso imaginário (belíssima canção, embora demasiado suicida para quem já tenha chegado aos 26) ou porque "Nós Os Outros" parece fazer hoje mais sentido do que nunca (a idade não é um posto, diz-se). E ainda houve "Este Mar", "Cronófago", "A Severa", "Cem Metros Sereia" e "Belarmino", para além de uma canção nova (!) para nos fazer crer que os Linda Martini continuarão a ser tão grandes em 2013 como o eram em 2005. O hedabanging furioso de muitos comprova-o. As letras da ponta da língua de outros idem. E, porque não dizê-lo, a excitação feminina com a barba de Hélio Morais também. Mereceram uma vénia.

Vénia, igualmente, a Omar Souleyman. O sírio apresentou-se novamente no Porto para apresentar canções cujas letras ninguém naquela tenda saberia traduzir, canções que se fossem tocadas por um qualquer artista pimba da nossa praça seriam esculachadas e deitadas ao lixo - tidas, até, como música para gente ignorante, canções que só são aprovadas pela intelligentsia porque o "exótico" ainda vende. Independentemente dos estudos que se possam efectuar acerca da aprovação ocidental de um artista como Omar Souleyman, a verdade é que esta música cumpre o seu pleno propósito: fazer dançar, fazer mexer, existir exclusivamente para aquele momento de festa e de loucura (e tantos que eram os loucos!), sem necessidade de pedir algo mais. Apenas que Souleyman continue a existir dentro da bolha do hype, porque se trata daquelas coisas que não só não se podem perder como são obrigatórias em todo e qualquer festival que se preze. Tão gigante que nem existe vontade de preencher uma "crítica" com adjectivação moderadamente xenófoba, mas lá terá de ser: foi um set explosivo.

Foi um pequeno erro de casting: não teria sido melhor para todos que Lee Ranaldo tivesse trocado de horário com Souleyman, para que a festa antes iniciada pudesse prosseguir sem interrupções? Não que o ex-Sonic Youth (ou melhor: os ex-Sonic Youth, visto que Steve Shelley o acompanha na bateria) não tenha dado um bom concerto; foi-o, de facto, tendo apresentado em palco canções de rock puro e vertiginoso, algures entre os restos de criatividade dos SY e a procura de algo novo. O entusiasmo foi, isso sim, menor do que poderia ter sido, o que não impediu que a Praça D. João I se enchesse de gente para ver um dos maiores veteranos alternativos em acção. Mas talvez esses mesmos que a encheram não tivessem abandonado em massa o recinto quando Matias Aguayo sobe ao palco... se bem que, admitamos, o set deste foi bastante execrável - e as tentativas dos poucos presentes para tentar avivar a festa foram travadas por uma certa autoridade a mais. Neste primeiro Warm-Up (espera-se que de muitos) foi principalmente este o ponto negativo; não deixarem a miudagem curtir a festa. Provavelmente pensarão que o que faz falta é um Bashar Al-Assad em cada esquina.
· 14 Abr 2013 · 01:09 ·
Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com

Parceiros