The Pyramids / Floating Points / Caribou / Four Tet - Green Ray
Lux, Lisboa
20 Jan 2012
Ensaio de reavivamento espiritual

© Emília Salta

Surgiram no primeiro piso, por volta da meia-noite, com um chamamento pagão correspondido pelos convivas, desde logo impelidos a participar no ritual, dançando pelas escadas abaixo, até ao piso térreo, onde formaram uma comunidade de circunstância – um apagão tecnológico, um desdobramento (em alternativa, mais neutra, a “retrocesso”) civilizacional, no centro da pista de dança, espaço religioso por excelência (ou um raro vestígio de confluência interpessoal no mundo pós-religioso, para além do diagrama do consumismo).

© Emília Salta

The Pyramids são uma daquelas bandas do fundo do baú, literalmente. Eclipsados desde os anos 70 mas resgatados para actuações ao vivo na velha e decadente Europa do século XXI: o cenário ideal para um ensaio de reavivamento espiritual, um novo despertar para a dimensão metafísica – não material, não económica, não tecnocrática – da existência humana.

© Emília Salta

Claro que nem todos aderiram, sobretudo os que ansiavam pela modernidade imagética dos xamãs que se seguiram na primeira noite “Green Ray” de 2012 no Lux, Lisboa, mais preocupados em actualizar o perfil nas redes sociais do que predispostos a submergir naquele festim de bizarria instrumental, tão anacrónico quanto intemporal. Mas para muitos terá sido como que uma epifania, ou uma redescoberta sensorial. Sim, ainda é possível fazê-lo através de cordas e sopros, contornando o zénite da sequenciação automatizada.

© Emília Salta

The Pyramids reencarnam o espírito de Sun Ra, ou vice-versa. São antigos mas não se deixam toldar pelo desânimo pós-moderno. No palco do Lux, sob luzes de néon e flashes de máquinas fotográficas, levaram a cabo um inebriante ritual de abstracção sonora: space jazz psicadélico, free jazz, soul, funk, improvisação. Nos piores momentos quedaram-se por uma espécie de afrobeat de casino, Roy Ayers na terceira idade, mas apenas por breves intervalos, não tardando a desconstruir a narrativa e enveredar pela cosmologia do jazz de fusão.

© Emília Salta

Arrancaram sons e sensações dos mais estranhos instrumentos, culminando numa sessão de sapateado pelo “frontman” e saxofonista Idris Ackamoor. “This is really old-school”, comentou o percussionista Kenneth Nash. Já tínhamos percebido. Enquanto Dan Snaith (Caribou) e Kieran Hebden (Four Tet) se deleitavam, ao fundo do palco. E Sam Shepherd (Floating Points) arrancava para uma deliciosa sessão de gira-discos no piso de cima, explorando os filões disco sound, acid jazz e house progressivo (terapia de desenjoo do dubstep). O resto foi “piloto automático” para as massas.

© Emília Salta
· 22 Jan 2012 · 17:45 ·
Gustavo Sampaio
gsampaio@hotmail.com

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