Perante a saturação que tantas vezes afecta os universos de banda-desenhada, a gigantesca Marvel lançou em 1977 uma série intitulada What If...? que descrevia ocasiões excepcionais, ocorridas num plano paralelo ao vigente (narrativa e cronologicamente linear), a partir dos relatos do Vigia Uatu, uma das figuras cabeçudas que observavam tudo e todos na galáxia habitada pelo Homem-Aranha. Os principais motivos de interesse da colecção What If...? incidiam sobre o seu desrespeito para com as regras Marvel que se evaporavam condicionalmente para que algo majestosamente improvável acontecesse. Sem que isso lançasse os destinos dos heróis por vias irreversíveis, era possível conhecer episódios isolados como a morte do Hulk às mãos da máquina de guerra Wolverine ou a proposta feita ao Capitão América para que se candidatasse à Casa Branca representando um terceiro partido (nada subtil este último argumento). O valor coleccionável dos comics What If...? nunca deixou de ser reduzido (a inflação do seu preço é bem menor), mas o gozo que oferecem é geralmente superior (e bem mais concentrado) do que aquele que se descobre a equivalentes que incidem sobre aventuras mais corriqueiras.

Ao jeito inquiridor de What If...?, perguntar-se-ia ao destino que leva o rock mais marginal o que aconteceria se Jennifer Herrema decidisse dar continuidade à imunda casta Royal Trux sem Neil Hagerty (entretanto afincado no trabalho enquanto Howling Hex)? Que benefícios sónicos poderiam resultar do rock após este deixar cair o anti que o antecedia aquando do magnificamente iconoclasta Twin Infinitives? Existirá vida além de um primeiro The Transmaniacon algo trôpego na sua articulação de ideias maciças? Não podia a resposta a tudo isso ser mais esclarecedora que Western Xterminator – segundo longo-duração da ramificação RTX, onde Jennifer, por via de agigantamento rock, mostra-se absolutamente confortável no papel de super-heroína (juro que o trocadilho é despropositado) e ladeada por uma formação bem mais musculada que qualquer uma que a unira a Neil Hagerty e ocasionais colaboradores (daí o truncamento de Royal Trux para RTX).

De modo autoritário e com um machado em cada mão, Wester Xterminator ordena a que, logo após romaria mística pelo desert rock da sua faixa-título (com direito a flauta transversal e djambé), se desdobrem de novo os dedos da mão que forçava a formar um par de chifres o incisivo Accelerator, ainda durante a era Royal Trux. Sem ter de partilhar com ninguém uma liderança anárquica, Jennifer Herrema dispõe de carta verde para afiar os dentes à carne picada acumulada a partir do que sobrou às carcaças do glam, hard, cock e stadium rock: rosna sobre solo típico de guitarra flying V em “Balls to Pass�, colhe ao seu historial doses generosas de carisma junkie e forma, em “Black Bananas�, um refrão talhado para assimilação acéfala, metaliza a armadura à sua matilha de caça numa mais brutal “Wo-Wo Din�, revisita o clássico “The Money Will Roll Right In�, dos obscuros Fang, como as L7 de Hungry for Stink o fariam. Efectua uma vistoria nómada do rock do último quarto de século sem nunca deixar de se sentir em casa.


Embora a qualidade transgressora se identifique mais imediatamente aos livros What If...? e à vontade sempre mais corrosiva de Hagerty (que, nos Royal Trux, salivava sobre um medalhão rock como um Alien perante a sua presa), é de louvar a atitude hardcore à loura pela revalidação dos seus princípios hedonistas. Sem constituir nada que se aproxime sequer do clássico ou acrescente aditamentos de maior a um género constantemente necessitado de se reinventar, o segundo disco de RTX exibe recomendáveis índices de vitalidade e hooks suficientes para manter desperto e movimentado um baile de headbangers. Perante o clamor electrizante de Western Xterminator - para todos os efeitos, chefiado e impulsionado por uma loura bombástica -, T.J. Mackey, Tom Cruise em Magnólia, não teria outra solução senão inverter os papéis ao seu sexismo atormentado:Respect the cunt and tame the cock!.