DISCOS
Lil Wayne
Tha Carter III
· 14 Nov 2008 · 15:51 ·
Lil Wayne
Tha Carter III
2008
Cash Money / Universal


Sítios oficiais:
- Lil Wayne
- Cash Money
- Universal
Lil Wayne
Tha Carter III
2008
Cash Money / Universal


Sítios oficiais:
- Lil Wayne
- Cash Money
- Universal
Lil Wayne não é só um rapper. É uma estrela do rock. Tha Carter III é a consagração. Um clássico. Ou não?
O que é uma puta de um clássico? Um disco que, do início ao fim, seja só só bangers, nada dispensável, nada de restos. E, hoje em dia, isso é completamente impossível no hip-hop. Já nem se espera. Um fã de hip-hop aprendeu a não esperar e não exigir clássicos. Ou são os skits que se tornam irritantes depois de cinco ou seis audições, ou a auto-indulgência, ou a falta de bom gosto na escolha dos beats, há sempre qualquer coisa a estragar um disco. Tha Carter III não é, portanto, um clássico. Só que, 500 anos depois – já se passaram alguns meses desde que apareceu por aí, mas a data de saída ainda interessa para alguma coisa? –, ainda soa muitíssimo bem.

Lil Wayne, claro, é um extraterrestre e provavelmente a última estrela de rock propriamente dita que temos. E é um rapper, não um roqueiro. "We are not the same, I am a martian", diz ele, numa das suas rimas. Rimas que quase não passam de livre associação de ideias, pouco sentido, um flow versátil mas sempre Wayne a que custa habituar, em que o ritmo e as palavras são alongadas a seu bel-prazer, com muita mestria e algum cuidado, apenas quase sempre em stream-of-consciousness. Se Jay-Z nunca escreve os versos em papel, Wayne provavelmente nem sequer pensa neles. Saem-lhe do nada. E são quase todas sobre ele próprio, sobre como é o melhor rapper do mundo. Todos são os melhores rappers do mundo, basicamente, e ele é-o enquanto o disco dura porque nos consegue convencer disso. É aí que reside a mestria.

Há um beat monstro aqui, "A Milli", das maiores malhas filhas da puta do ano, por cima da qual TODA a gente rimou, do Jigga à Lil Mama, do Kells ao Ne-Yo. É pouco mais que uma batida minimal e a voz do Phife Dawg dos A Tribe Called Quest numa remistura obscura de "I Left My Wallet in El Segundo" desacelerada. É inescapável. Não se cala. "A milli, a milli." O consenso geral é que as rimas de Wayne nessa canção não são as melhores. Basta ouvi-lo dizer "Even Gwen Stefaaaaaaaaani" para perceber que isso é mentira. Depois, há outros destaques, como "Mr. Carter", que joga com o facto de ter o mesmo apelido de Jay-Z (Lil Wayne é Dwayne Carter e Jay-Z é Shawn Carter) e um uma voz soul acelerada. Dois dos grandes numa malha grande. Há uma canção lamechas com Robin Thicke, aquele gajo que pegou em "A Fifth of Beethoven", a versão disco da Quinta Sinfonia de Beethoven por Walter Murphy que ficou imortalizada no Saturday Night Fever, há uns bons seis anos e andava de bicicleta por Nova Iorque num vídeo a cantar "When I get you alone", há uma espécie de "This is Why I'm Hot" de M.I.M.S. (pelos beeps de teclado) em "Lollipop", com um refrão em que se diz "Shawty wanna thug" que é das melhores coisas do ano e muito, muito mais. Esse "muito, muito mais" vai do extremamente dispensável ao bom, passando pelo assim-assim.

O que é uma puta de um clássico? Tha Carter III não é uma puta de um clássico, mas Lil Wayne é uma puta de um monstro, um extraterrestre, uma figura impossível de ignorar, uma estrela do rock (vê-lo com uma guitarra eléctrica a tocar três notas numa espécie de solo péssimo não é bem ver como ver Hendrix, mas fica perto) e é o mais perto de um clássico que alguma vez teremos. Nunca haverá bom gosto e filtragem suficiente para haver uma obra-prima. Nunca, especialmente num gajo que lançava, até há bem pouco tempo, uma mixtape de 50 faixas por dia, sensivelmente. Não podemos esperar mais, não podemos exigir mais. É o que há. É aproveitar ou largar.
Rodrigo Nogueira
rodrigo.nogueira@bodyspace.net

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