DISCOS
Iron and Wine
The Shepherd's Dog
· 09 Abr 2008 · 08:00 ·
Iron and Wine
The Shepherd's Dog
2007
Sub Pop / Popstock!


Sítios oficiais:
- Iron and Wine
- Sub Pop
- Popstock!
Iron and Wine
The Shepherd's Dog
2007
Sub Pop / Popstock!


Sítios oficiais:
- Iron and Wine
- Sub Pop
- Popstock!
Dar uma no cravo e outra na ferradura pode bem ser a melhor solução para que Sam Beam mantenha interessantes os seus dias intermináveis.
Raros são os discos recentes que, tão declaradamente quanto The Shepherd’s Dog, aproximam o seu forro visual e a génese do conteúdo musical. O que, para já, só prova que um Álbum com “A” grande continua ainda a depender de um suporte físico que favoreça novas leituras do objecto e tudo mais. Esse debate terá de ser adiado até uma próxima vez, porque o momento pertence somente a Iron and Wine, também conhecido por Sam Beam - são da sua autoria as reveladoras pinturas incluídas na frente, verso e interior do terceiro longa-duração The Shepherd’s Dog, que pronuncia a retoma do percurso central após uma série de EPs mais aventureiros. Admitindo que a figura semelhante a Cristo - representada no verso do disco - se trata realmente de um auto-retrato, podia-se até acusar Sam Beam de uma presunção desmedida. Presunção essa que, contudo, é desmentida por tudo aquilo que permanece imutável na palete sonora de Iron and Wine: a naturalidade de quem parece não ter de se esforçar muito para obter óptimos resultados e uma muito bem balanceada essência que distingue as canções duradouras das efémeras. A vaca pode até tossir, em jeito de denunciar Iron and Wine como um objecto datado (tão 2002...), mas as grandes canções continuam por aqui.

Os milagres da multiplicação – e a ideia de um Sam Beam de Galileia - surgem só depois quando The Shepherd’s Dog “abre o livro” e oferece um recital de soluções e expansividade rock para tudo o que nos primeiros tempos era apenas solenidade folk reduzida a um ambiente intimo para usufruição de um casal amoroso. Confirma-se que agora as canções demonstram maior inquietude: anulam a ameaça da monotonia através de diversificação de instrumentos e propósitos para os mesmos, propagam a inimitável graça celestial da voz de Sam Beam por entre extensões entre o dubby e a psicadélica antes de levantar voo. Percebe-se agora que foi altamente enriquecedor o período dispendido com os Calexico nas gravações de In the Reins, pois The Shepherd’s Dog é também disco destemido no pular do arame farpado imposto pela convenção folk . Fica provado que Sam Beam não é apenas um rosto pacifico sobre uma almofada com um padrão de céu estrelado – embora as mais emblemáticas fotos promocionais associadas a Iron and Wine possam indicar o contrário.

Não sejam dados olhos a isso ou ouvidos às más línguas que conspirem contra o homem que fez de Our Endless Numbered Days uma escolha certíssima para a vaga de disco único a levar para uma ilha deserta. Disco completo, note-se – e não três ou quatro ficheiros num leitor de MP3. Uma vez mais, a blindagem que The Shepherd’s Dog adquire como um todo favorece até o bom nome de Iron and Wine, ou não fosse alguém confundir a sua música fragmentada, tal como escutada ao trailer de um qualquer filme dramático qualitativamente dúbio, com um single hipoteticamente usado numa campanha publicitária encomendada por uma empresa de telecomunicações apostada em obter o mesmo efeito lacrimoso.

Sem atraiçoar ou perturbar o aperfeiçoamento assegurado durante os dias passados, o presente Iron and Wine pode ser realmente projectado no símbolo e gravura do cão do pastor - como se, num acto que mistura rebeldia e inviolável lealdade, Sam Beam optasse por ir à caça de inéditos desafios e revestimentos para as suas canções, sem nunca abandonar por completo a lucidez de espírito e pureza bruta próprios do carácter bucólico que sempre lhe apregoaram. E, por tudo ser tão fértil neste terreno fronteiriço, não se vislumbra qualquer desprestigio a um Iron and Wine renovado e expandido.
Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com

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