ETC.
LIVRO
Black Metal: Evolution Of The Cult
Dayal Patterson
· 19 Mai 2014 · 23:31 ·
Black Metal: Evolution Of The Cult
Dayal Patterson
2013
Feral House
Black Metal: Evolution Of The Cult
Dayal Patterson
2013
Feral House
Um olhar detalhado sobre um dos mais importantes períodos da história do metal, contado por quem o viveu.
Desde o seu surgimento enquanto sub-género musical e sub-cultura dentro do heavy metal nos anos 80 e 90, com os seus próprios códigos éticos e filosóficos, com uma estética diferente de tudo quanto tinha sido feito até então e com os seus próprios círculos e/ou clãs, que o black metal se expandiu um pouco por todo o mundo, evoluindo consideravelmente não só a nível sonoro como cultural e deixando um legado enorme não só dentro do metal como dentro de outros campos e tribos, urbanas ou anti-urbanas, mainstream ou underground. De facto, o género hoje em dia não se cinge apenas ao trilho percorrido pelas bandas que foram aparecendo na Noruega no início da década de 90; muitos outros pegaram no modelo desenhado por artistas como Mayhem, Burzum ou Darkthrone e percorreram o seu próprio caminho a partir daí, nunca esquecendo a máxima primeira do black metal, o individualismo acima de tudo, o do what thou wilt Crowleyiano que inspira e continua a inspirar dezenas de fãs e músicos.

De certa forma, o black metal pode ser encarado como um outro punk: uma mão cheia de jovens alienados, delinquentes ou simplesmente en route da psicopatia encontra uma forma de ultrapassar ou pelo menos esquecer momentaneamente todos os seus problemas pessoais ou mentais e influencia, visual ou musicalmente, dezenas de outros na mesma situação. Tal como existiu um pós-punk, existe hoje um pós-black metal que aglomera conjuntos incrivelmente díspares, mais ou menos de acordo com a filosofia original, mas todos eles partindo da mesma premissa DIY de que é possível fazer algo se assim realmente quisermos. Hoje em dia existe no círculo metálico, mas não só, toda uma discussão sobre o que consiste ou deixa de consistir o black metal. Dayal Patterson acaba por chegar à conclusão lógica de que o género/sub-cultura é ao mesmo tempo um olhar sobre o passado e um template para o futuro, para a inovação, tal qual o foi o punk. Ao longo de quase quinhentas páginas, sem contar com uma secção dedicada a fotografias e imagens várias, Patterson dá voz aos que originaram o movimento, aos que o influenciaram, e aos que em seu turno foram influenciados por ele, naquele que é um livro essencial se se quiser entender de onde veio o black metal ou para onde irá de seguida e leitura obrigatória para fãs do género.

Livro assumidamente histórico, Black Metal: The Evolution Of The Cult acaba por se cingir maioritariamente - e provavelmente não o poderia fazer de outra forma - às bandas surgidas na chamada "segunda vaga", a maioria proveniente da Noruega, não entrando (felizmente!) pelo cliché habitual de que só Varg Vikernes e Øystein Aarseth interessam. O caso trágico envolvendo os dois indivíduos é, até, como que relegado para segundo plano: este é um livro sobretudo sobre a música e os músicos, não sobre ideologias e actos criminosos, com o próprio Patterson a dar as suas opiniões pessoais, quando o texto assim o permite, sobre um ou outro determinado disco ou canção. Não só isso, como coloca quase todas as bandas em pé de igualdade, sejam elas os inspiradores Venom ou Bathory, os "lendários" Burzum ou Darkthrone ou os provenientes da nova vaga, sendo que se entende o maior destaque atribuído a certas bandas como os Mayhem (três capítulos ao todo) pela evolução clara, estética e musicalmente falando, ao longo da sua carreira. Pelo meio, capítulos sobre NSBM (black metal nacional-socialista), o círculo francês Les Légions Noires ou o impacto da música folk e industrial em algumas das bandas surgidas pós-1995 oferecem também uma história mais detalhada do que aquilo que é costumeiro quando se escreve sobre black metal.

Em suma, Patterson (acima de tudo um grande fã do género: isso nota-se, e ajuda a que escreva de uma forma tão precisa e sem rodeios, até com algum humor) é bem capaz de ter redigido aquele que é o livro a ler e deter sobre este movimento, tendo recorrido a entrevistas com praticamente todos os músicos e figuras que fizeram nome no black metal e por conseguinte do black metal um nome. Embora nos pareça que poderia ter dedicado mais algum tempo a falar dos movimentos recentes - não é bem compreensível, por exemplo, a atribuição de um capítulo inteiro aos Lifelover renegando bandas como Xasthur, Wolves In The Throne Room e Alcest quase a notas de rodapé e esquecendo por completo casos como os Liturgy ou os Deafheaven -, talbém há que compreender que, se o fizesse, provavelmente só editaria este registo em 2017, e entretanto surgiriam outras e outras bandas a levar a blueprint do black metal ainda mais longe... e o ciclo continuava. Não: Black Metal: Evolution Of The Cult, como o próprio género, é um livro sobre o passado que traça igualmente um futuro. Continuar-se-à a discutir o que é black metal, o que não é, o que deixou de ser; só isso prova a vitalidade de um género pelo qual ninguém, em 1991, diria vir a ser tão potenciador e inspirador como o tem sido.
Paulo Cecílio
pauloandrececilio@gmail.com

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