DISCOS
Janek Schaefer
In the Last Hour
· 15 Nov 2006 · 08:00 ·
Janek Schaefer
In the Last Hour
2006
Room 40


Sítios oficiais:
- Janek Schaefer
- Room 40
Janek Schaefer
In the Last Hour
2006
Room 40


Sítios oficiais:
- Janek Schaefer
- Room 40
Digressão estética por ilhas sonoras antevê o vazio que sucede inevitavelmente a um clímax insuperável.
Assim que se anula em silêncio In the Last Hour, perdura incomodativamente um ecoar fantasmagórico cuja proveniência não é de toda alheia à soma de fatalismos que discorre o presente disco – esse que foi gravado a partir de uma instalação sonora elaborada pelo esteta sonoro Janek Schaefer, com o intuito específico de servir à edição do ano passado do Huddersfield Contemporary Music Festival e usufruir ao máximo das condições oferecidas pela gigantesca sala onde a ocasião teve lugar. Ocorrido o momento único, sobra para posterior escuta o documento possível disso e o maldito rasto surdo que, após a conclusão do todo, teima em afirmar por In the Last Hour o quão inevitável era à partida a sua gradual peregrinação sonora até ao “nada” - como se o disco fosse uma entidade amnésica sem noção exacta dos esboços narrativos resultantes de manipulações crepitantes arrancadas à agulha do gira-discos (instrumento afecto ao britânico), incursões mais plácidas pelos meandros dos field recordings e tudo mais. A partir de um posicionamento deus ex-machina, Janek Schaefer encadeia esses como se fossem províncias dispersas de um imaginário condenado a afundar-se em espiral ao longo do opus que encerra In the Last Hour (mas, a seu tempo, lá iremos).

Imediatamente identificáveis como coordenadas de um objecto conceptual, as quatro partes do disco, que lança a australiana Room 40, mereceram os títulos recuperados a uma linha de The Bridge -escrito por Iain Banks - que cativou particularmente a atenção de Schaefer: “In the Last Hour”, “Between the Two” (a transição manifesta-se por esta altura), “Half Submerged By Each”, “The Ruined City”. Ele, que assume ter neste o seu trabalho predilecto, optou de imediato por suspender a leitura e adoptar cada um desses complementos da frase como mote temático para as respectivas quatro faixas. Sendo que era inevitável desembocar na ruína, algo havia de ser erigido para então tombar. E é precisamente nesse preenchimento que Janek Schaefer se revela superior - no ditar estratégico de fados e sinas por todo o tipo de texturas drasticamente orgânicas e enegrecidas por tons fúnebres ou por outras mais celestiais, abrilhantadas por solenidade sacra e subtraídas de alguma gravidade por intervenção de electrónica impalpável. Dispostas em pólos, perfazem o mar que submerge, até metade, a tal cidade em ruínas que mais não é do que o assolador opus conduzido em órgão de igreja que não envergonharia o magnânime La Monte Young ou a vontade macabra dos produtores do clássico de culto Carnival of Souls.

A verdade é que o tempo tudo destrói. Apesar de ser fragmentariamente cinemático na sua composição, In the Last Hour aparenta duas capacidades essenciais para manter uma carreira estável (e rentável) em televisão: sabe sofrer com uma compostura nobre e morrer em plena graciosidade. Janek Schaefer persiste em dar forma a castelos de areia, para, logo de seguida, nos privar do afeiçoamento às paredes dos mesmos. Pela segunda vez este ano, faz da ausência a sua arte, obtendo fascinantes resultados com isso.
Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com

Parceiros