DISCOS
Party of One
Caught In The Blast
· 02 Mai 2003 · 08:00 ·
Party of One
Caught In The Blast
2003
Fat Cat


Sítios oficiais:
- Fat Cat
Party of One
Caught In The Blast
2003
Fat Cat


Sítios oficiais:
- Fat Cat
Alguém, a certa altura, disse algo do género acerca de Nico: “Não é fácil gostar de Nico. Mais, despistando o natural orgulho inerente à raça humana, nem ela própria gostaria que apreciássemos a sua música”. A frase pode parecer um tanto ou quanto excessiva, mas é natural que possa ser aplicada aos Party Of One. Sim, a música dos Party of One não é fácil. Não que seja esquisita, desconexa ou diferente, até é o contrário de tudo isso. Mas rói, entra pelos ouvidos como um grito de amparo, faz-nos ouvintes - ardentes pela queda - e remexe “cá dentro” como um segredo muitas vezes revelado.

“Caught In The Blast” é o registo de estreia do trio Geoff McCusick, Terrika Kleinknecht e Eric Fifteen (com as atenções a penderem maioritariamente sobre este último), tendo sido feito num 8 pistas. Houve um tempo em que a música era gravada em cassetes, entre os que apenas amealhavam o dinheiro necessário para o indispensável. A qualidade era má, mas os fãs perdoavam e até gostavam. Haviam guitarras distorcidas, o som era primitivo, mas não se imaginava na altura que a evolução da tecnologia levasse muitos a querer voltar a esses tempos, e a gravar música propositadamente com poucos meios. Foi assim com diversas bandas nos 80’s, e com muitas outras nos 90’s. Foi assim, já em 2003 com os The Kills e com alguns outros, e é assim agora com os Party Of One. Daí que o som rude que ouvimos ao longo de todo o disco seja desarmante. Daí que seja já um hábito catalogar estas músicas como indie/lo-fi.

Apesar de vindo ao mundo em 2003, este álbum é, na realidade, um filho de toda a história da música popular (principalmente a partir dos anos 60, principalmente rock). Confluência única de momentos, é impossível não ir à caixa-forte do nosso corpo (ler memória) e ali associar cada tema a um momento particular do que foi a história musical da última metade do séc. XX. É impossível não ficar marcado pela beleza de “Belgrade Sends Its Regards”, e é impossível não ficar com pena por ser apenas um minuto. E ficamos esmagados quando, com os últimos acordes desse tema a fecharam, surgem de forma antitética guitarras a fazer (tendo em conta o que vinha detrás) “barulho”. Contraponto fundamental em todo o disco, momento maior de um álbum que não cessa facilmente na nossa memória.

Olhe-se para a capa: quase que dispensa as palavras, mas convém sublinhar alguns pontos. A imagem não é bem definida e apresenta uma negritude relativamente densa. Vê-se uma criança (ou o que parece ser uma criança) com um ar relativamente assustado como que quase a dizer “Ajudem-me!”. Espelho perfeito de um disco longe da perfeição, retracto de uma música obscura e eminentemente perto do colapso.

Os sons tornam-se automaticamente terapia física (como despertadora de sentidos) e mental (como reflexão transcendental ao que se ouve) para o corpo. Longe de Strokes, White Stripes e afins (sem lhes estar a retirar, como e óbvio, todo o mérito), os Party Of One representam para 2003 algo grande, maior ainda que a essência que emanam. O que também faz sonhar.
Tiago Gonçalves
tgoncalves@bodyspace.net

Parceiros