DISCOS
Guru’s Jazzmatazz
The Mixtape – Back to the Future
· 25 Mar 2008 · 07:00 ·
Guru’s Jazzmatazz
The Mixtape – Back to the Future
2008
Rapster / Popstock


Sítios oficiais:
- Guru’s Jazzmatazz
- Rapster
- Popstock
Guru’s Jazzmatazz
The Mixtape – Back to the Future
2008
Rapster / Popstock


Sítios oficiais:
- Guru’s Jazzmatazz
- Rapster
- Popstock
O Guru de outros tempos carrega agora o seu prĂłprio fardo ao longo de uma Mixtape de hip-hop de segunda apanha.
Com a reputação baleada pelos anos que passaram, Guru continua, mesmo assim, a ser a prova viva de que, no hip-hop, o timing e influência valem quase tanto como um estilo inconfundível ou uma pontinha de genialidade. Isto porque, no que respeita ao seu desempenho como MC, Guru tem-se mantido em jogo – na Liga de Honra, vá lá - muito à custa dos mesmos recursos de sempre: um cimentado registo monótono e invariavelmente constante (sem travagens ou guinadas) e o característico domínio enciclopédico de uma sabedoria de rua reflectida no aspecto sagaz da reluzente careca do próprio. Ainda assim, terá sido a visão e capacidade estratégica de Guru a fazer com que, desde o final da década de 80 até ao final do milénio, estivesse várias vezes no lugar certo à hora certa. Durante a impressionante ascensão da dupla Gang Starr, conheceu a sorte de ter como passadeira para o seu flow, as quase palpáveis armações urbanas produzidas por um inestimável DJ Premier, cujo nome serviu também como roldana elementar para uma nova era dourada do hip-hop nova-iorquino consagrado em verdadeiras obras-primas como Ready to Die de Notorious B.I.G. e Illmatic de Nas.

Em nome próprio, Guru colocou em prática o seu bom gosto e invejáveis atributos de gestor na série Jazzmatazz que, de forma quase inédita e com o primeiro volume lançado em 1993, arriscava o híbrido entre jazz e hip-hop, recorrendo à presença instrumental de lendas do primeiro género e deixando a porta aberta a outros tantos MCs e vocalistas convidados para a ocasião. A par dos US3, que dispunham de carta verde para samplar o guarnecido catálogo da Blue Note (ao qual pertenciam de início), Guru foi responsável pelo despertar de uma geração de aficionados mais interessada na fusão do que nas partes individuais. A saga Jazzmatazz haveria de se prolongar por quatro capítulos de qualidade decrescente. A Mixtape, baseada no quarto e último desses volumes, não vem adiantar muito ao legado e transparece mesmo alguma decadência que pode não ser estranha ao facto de Guru ser actualmente um peão datado nestas andanças.

Os mesmos métodos e movimentações mantidos por Guru representam agora um fardo para o veterano: igual a si próprio, continua a ser o observador insone e letal, imparável no desenhar dos contornos ao quadro urbano, auto-proclamado, a certa altura, como um “Ali” dos tempos modernos. A exposição ao repetido “fluxo de consciência” de Guru piora quando a Mixtape se sujeita aos bitaites de um anfitrião – o carrasco DJ Doo Woop – que apresenta os temas encadeados como se estivesse diante de um microfone numa pista de carrinhos de choque instalada em Queens, Nova Iorque, e reservando sempre tempo à publicitação descarada dos sites da 7 Grand (a label de Guru) e tudo mais. Podia alguém até julgar que a presença honrosa de Common em “State of Clarity” serviria para abrilhantar este cenário fragilizado, mas o homem mais cool de Chicago dispõe apenas de tempo para repetir o mesmo refrão cinco vezes, sendo depois abruptamente interrompido no freestyle. Incompreensível.

A Mixtape promete bangers e cumpre com relativo sucesso essa missão – em “Stand Up (somethings’ll never change)”, o produtor Solar cospe atrevimento no isco dancehall e resgata, ao terreno minado de Jamrock, o sempre incendiário Damian Marley que aquece a temperatura durante a estadia que lhe permite a tômbola rotativa. Contudo, o equilíbrio do objecto parece mesmo estar irreversivelmente condenado aos caprichos peculiares do formato mixtape, que cede e aniquila com a mesma mão implacável, tentando, com isso, oferecer o mesmo tempo de antena a todos os intervenientes. O timing que um dia colocou Guru no mapa é o mesmo que, de forma completamente diferente, o afunda um pouco mais na indiferença.
Miguel Arsénio
migarsenio@yahoo.com

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