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20: |
Amélia Muge Não Sou Daqui |
| Vachier & Associados |
Não sou Daqui, maravilhosa indefinição geográfica, tem de ser um dos regressos do ano. Anda aqui Amélia Muge a saltar de fronteira em fronteira, a fazer da canção um lugar deliciosamente livre e quem tem a ganhar com isso somos nós. Este que é o primeiro capítulo de uma trilogia é também provavelmente o melhor disco de sempre de uma senhora que faz da canção gato-sapato, confrontando-a consigo mesma, deixando-a seguir o seu rumo próprio no final. Tantos países, tantos cheiros, tantos sentidos. O destino destas canções nunca esteve escrito; foi a liberdade que as construiu. Só se pode esperar o melhor dos dois restantes capítulos deste tríptico. Que venham o mais depressa possível. André Gomes
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19: |
Wilco Sky Blue Sky |
| Nonesuch |
Depois de uma obra-prima absoluta, Yankee Hotel Foxtrot e um disco que também andava lá perto, A Ghost is Born, os Wilco, na sua formação mais consistente (Jeff Tweedy passa a vida a expulsar pessoas quando acaba a sua utilidade) decidiram mostrar os dotes instrumentais em canções que foram feitas para serem tocadas ao vivo. O que não quer dizer que sigam a postura de estádio que pautou o disco ao vivo Kicking Television, já que isto é tudo demasiado deprimente (se bem que com esperança) para multidões. Os Wilco mantiveram Jim O’Rourke a seu lado, mas deixaram para trás a experimentação em estúdio, ficando-se por canções (Tweedy escreve sempre tão bem) e solos de guitarra (é o primeiro disco com o versátil Nels Cline).
É um disco menor de uma das melhores bandas dos anos 2000, o que faz com que não seja possível deixar de ser muito especial. Rodrigo Nogueira
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18: |
Beirut The Flying Club Cup |
| 4AD / Popstock! |
Cativaria o oportunismo do próprio Don King a formalização de um duelo que colocasse frente a frente, de um lado, Sufjan Stevens e os seus discos enaltecidos à imagem dos estados norte-americanos, e, do outro, Zach Condon e as suas reproduções nostálgicas de cenários onde o romance é o fruto mais proibido. Sem Sufjan Stevens e Final Fantasy na corrida, e com Devendra adormecido na banda-sonora de um filme erótico do Cantiflas (elogio), o ano em termos de canção pomposa e vocacionada para resistir impune ao avançar do tempo passa muito por Beirut e pela confirmação assinalada com um The Flying Club Cup cujos quase 39 minutos correspondem a igual número de sinónimos para o termo “classe”. Miguel Arsénio
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17: |
João Paulo Memórias de Quem |
| Clean Feed |
Se dúvidas houvesse, o disco a solo Memórias de Quem confirmou o pianista João Paulo como um dos mais notáveis improvisadores em território nacional. A sua identidade única, a capacidade de pegar em temas origem popular para magníficas revisões e o brilhantismo das composições/improvisações fazem dele um caso raro em Portugal. A intensidade que coloca na interpretação de cada melodia transborda as fronteiras do jazz ou da música improvisada e esta música afirma-se numa tocante universalidade. Magnífico. Nuno Catarino
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16: |
Robert Wyatt Comicopera |
| Domino / Edel |
As grandes obras não necessitam de explicações: são-no apenas. Comicopera alheia-se de conceitos relativos; é uma peça fundamental para quem não quiser passar ao lado de uma das mais brilhantes figuras da cultura popular moderna. Tudo parece estar entregue à fragilidade de um trabalho deixado a meio. Percebe-se depois: em vez de terminarem, as canções desdobram-se noutras, nelas próprias, numa voz que quase tudo abarca. Comicopera faz-se de uma imensidão de possibilidades deixadas em aberto; de estruturas menos densas que as dos seus antecessores mais chegados, mas nem por isso de diferente calibre ou menor pluralidade interpretativa. É, tal como as demais obras do cavalheiro, um objecto de absoluta genialidade. Samuel Pereira
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15: |
Electrelane No Shouts, No Calls |
| Too Pure / Popstock! |
2007 viu nascer o melhor disco das Electrelane, moças de Brighton, Inglaterra, amantes de órgãos omnipresentes, guitarras de rock afiado em riffs igualmente circulares, vozes que os cépticos apelidam de "desafinadas" (perdoe-lhes, Senhor, pois não sabem o que dizem). Se Axes era já entusiasmante (foi o sexto melhor álbum de 2005 para o Bodyspace), No Shouts No Calls revela-se mais coerente, saboroso como um todo, delícia romântica em tempos desavindos. Pedro Rios
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Magik Markers Boss |
| Ecstatic Peace / Ananana |
De um lado a luminosidade indie pateticamente épica, do outro os subterfúgios noise em postura confrontacional. Numa altura em que o rock independente americano se situa essencialmente nestes dois pilares pouco coadjuvantes, coube aos Magik Markers convocar para si o espírito de editoras como a Blast First ou a SST nos dourados anos 80 americanos. Que "Axis Mundi" seja a melhor música que os Sonic Youth não fizeram nessa década ou que Elisa Ambrogio se tenha deixado encantar em "Empty Bottles" são apenas algumas das razões em forma de canção para agradecer que Boss exista, e que bem mais interessante do que a euforia descontrolada de partir a cabeça é utilizá-la para pensar. Bruno Silva
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13: |
Blonde Redhead 23 |
| 4AD / Popstock! |
23 deve ser um dos álbuns pop/ indie mais etéreos de sempre. Ao ouvi-lo, parece que tudo à volta se torna nevoeiro e que D. Sebastião está à espera de surgir na esquina mais próxima. Apesar de terem sido comparados aos Sonic Youth de forma algo insistente nos anos 90, os Blonde Redhead nunca permaneceram estáticos, e os anos 00 têm sido um período de constante reinvenção. Desta vez calhou-nos na rifa um disco de subtilezas electrónicas e guitarras fantasmagóricas, sublinhadas pela voz aguda de Kazu Makino. Aqui, a banda italo-nipónica é acessível e brilhantemente minimalista, cedendo à tentação de ocupar tudo o que é espaço vazio com “tralha” sonora. João Pedro Barros
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12: |
Common Finding Forever |
| Geffen |
Embora não venha ainda quebrar o enguiço das duvidosas opções estéticas transversais às capas de muito dos discos conhecidos ao MC de Chicago, Finding Forever adequa-se à superação de todos os restantes aspectos que Common deve manter por cima se quiser manter-se de pé no fulminante e feroz campeonato hip-hop. Porém, essa fome de perseverança nem sequer chega a afectar um Finding Forever que, à distância de apenas dois anos do pergaminho sagrado Be, consegue ser um álbum tematicamente contemplativo e existencialista, impregnado de ideias musicais amadurecidas pelo acariciar da soul (à flor da pele na introdução de “Misunderstood”) e implacavelmente aplicadas pela sagacidade de rua conhecida a Common. Mais que tudo isso, Finding Forever descobre o mais longo caminho rumo à eternidade ao conseguir domar e atribuir bons propósitos às produções de Kanye West, o desertor universitário que ultimamente se tem sufocado com o seu protagonismo. Mais nobre é o estatuto de Common quando transforma um disco que só podia ser seu num empreendimento que salienta as qualidades dos seus colaboradores mais familiares. A eternidade é-lhe devida. Miguel Arsénio
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11: |
Andrew Bird Armchair Apocrypha |
| Fat Possum / Ananana |
Em 2007 Andrew Bird ganhou coragem finalmente e assumiu de uma vez por todas a sua personagem de pássaro no mundo da música. Depois do surpreendente The Mysterious Production of Eggs, editado em 2005, havia muita coisa a provar. Armchair Apocrypha, deliciosamente certeiro, confirma tudo e mais alguma coisa. Canções como "Plasticities", “Fiery Crash” e "Heretics" são um primor nos arranjos e na imaginação, na concretização do sonho, na forma tão característica que Andrew Bird encontrou para transformar as suas fantasias em coisas palpáveis. A voz, o assobio, o violino, o metalofone em – encontro em constante transformação. O homem pássaro encontrou finalmente a mina de ouro e está de bem com a vida – resta esperar que venham aí mais discos como este. André Gomes
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