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Tigrala
Tigrala
· 15 Set 2010 · 09:13 ·
Música da terra por Norberto e amigos.
Não será necessário referir, pela milésima vez, o brilhantismo de Norberto Lobo. Guitarrista de uma técnica espantosa, herdeiro da tradição dedilhada de John Fahey até Carlos Paredes, Lobo já deu provas mais que suficientes em nome individual com os discos Mudar de Bina e Pata Lenta. Aqui, neste trio chamado Tigrala, Norberto tem a companhia de dois músicos com os quais à partida poderíamos adivinhar poucas afinidades: Guilherme Canhão, guitarrista dos Lobster, especialista de rock barulhento, e Ian Carlo Mendoza, homem de percussões variadas, com aparentes ligações com a “world music”.
O disco arranca de forma estranha: vozes fantasmagóricas, mergulhadas em percussões, até que chegam finalmente cordas. Atmosfera cinzenta, tenebrosa. Início revelador: não se espere, portanto, apenas mais um tomo do virtuosismo de Norberto, este mundo é inconfundivelmente outro. Isto é terra, música de campo, onde não há hierarquias, as pequenas percussões têm tanta importância como as guitarras - ou os outros instrumentos, que servem a música. Por vezes é o vibrafone (pelo multifacetado Mendonza) a controlar as cores, com as cordas em fundo. Outras vezes são as guitarras (e a tambura) que, apesar das sonoridades diferentes entre si - Lobo e Canhão são oriundos de mundos distintos - se entrelaçam, deixando em fundo percussões leves que vão marcando o ritmo com a discrição do vento.
Deste saudável flirt inter-instrumental, explorado nas suas diversas combinações e variações possíveis, resulta uma música simples, que no fundo evidencia meia dúzia de melodias, de ambientes. Entramos na música e somos absorvidos num ritualismo oriental, pouco depois sentimos retalhos de extrema portugalidade. O disco tem a curiosidade de, à sexta faixa, incluir um dos mais extensos títulos de que há memória: “Aunque no sepa cantar mi corazón es lleno como una ola que se levanta temprano conectada a los misterios primordiales más profundos.” Bonito. Ainda que não saibamos bem ao certo o que temos por aqui, sabemos que estamos a ouvir uma música pura, que ataca directamente as emoções, que não se perde em voltas desnecessárias. No final voltam as vozes assombradas, mas por essa altura já não temos medo, sabemos bem que isto é a verdadeira música da terra.
Nuno CatarinoO disco arranca de forma estranha: vozes fantasmagóricas, mergulhadas em percussões, até que chegam finalmente cordas. Atmosfera cinzenta, tenebrosa. Início revelador: não se espere, portanto, apenas mais um tomo do virtuosismo de Norberto, este mundo é inconfundivelmente outro. Isto é terra, música de campo, onde não há hierarquias, as pequenas percussões têm tanta importância como as guitarras - ou os outros instrumentos, que servem a música. Por vezes é o vibrafone (pelo multifacetado Mendonza) a controlar as cores, com as cordas em fundo. Outras vezes são as guitarras (e a tambura) que, apesar das sonoridades diferentes entre si - Lobo e Canhão são oriundos de mundos distintos - se entrelaçam, deixando em fundo percussões leves que vão marcando o ritmo com a discrição do vento.
Deste saudável flirt inter-instrumental, explorado nas suas diversas combinações e variações possíveis, resulta uma música simples, que no fundo evidencia meia dúzia de melodias, de ambientes. Entramos na música e somos absorvidos num ritualismo oriental, pouco depois sentimos retalhos de extrema portugalidade. O disco tem a curiosidade de, à sexta faixa, incluir um dos mais extensos títulos de que há memória: “Aunque no sepa cantar mi corazón es lleno como una ola que se levanta temprano conectada a los misterios primordiales más profundos.” Bonito. Ainda que não saibamos bem ao certo o que temos por aqui, sabemos que estamos a ouvir uma música pura, que ataca directamente as emoções, que não se perde em voltas desnecessárias. No final voltam as vozes assombradas, mas por essa altura já não temos medo, sabemos bem que isto é a verdadeira música da terra.
nunocatarino@gmail.com
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