Linda Martini / The Strugglers / Maquiladora - Kid City
Clube Mercado, Lisboa
22 Abr 2006
Para aqueles que nasceram nos anos 80, o nome "Lecas" estará eternamente ligado a José Jorge Duarte, apresentador de concursos para crianças da RTP como Gugu Dada, entre outros, que se auto-intitulava assim. A Kid City é a noite dos putos, dos miúdos, das crianças, com residência mensal no Clube Mercado, em Lisboa, que procura devolver a criancice a muitas dessas crianças dos anos 80 e 70, e também tentar esconder o facto que os membros da sua organização já passaram a barreira dos 20. Era inevitável, portanto, que José Jorge Duarte, o Lecas da televisão, figura incontornável da idade infantil, voz e presença inconfundíveis, um dia viesse a pôr os pés numa destas noites. A espera acabou: Lecas apareceu finalmente.

Era a festa dedicada aos slows, noite de putos lentos para putos lentos, e, logo a seguir à primeira actuação, a dos Linda Martini num espaço algo composto mas não esgotado, como tinha acontecido ainda duas semanas antes na ZDB, num concerto da mesma banda, do sistema de som sai Chingon, a banda do realizador mexicano Robert Rodriguez. Em cima do pequeno palco, com um microfone na mão, Joaquim Albergaria, organizador e membro tanto dos Vicious Five como dos CAVEIRA, anunciava as próximas bandas, desta feita americanas: The Strugglers e Maquiladora. Parecia um anunciante de feira, a anunciar as próximas voltas na montanha russa ou no carrossel, a animar os carrinhos de choque, com música a condizer.

Ainda falta um bocado para os Linda Martini deixarem de ser uma promessa para serem uma confirmação, mas está quase lá. Os novos temas (tradução: que não estão na maqueta/EP) são mais variados, bem compostos, e a banda está a caminhar a passos largos para um bom espectáculo ao vivo. Até lá, temos o poder das três guitarras, que não é pouco mas podia ser ainda melhor (e a culpa não é só do sistema de som do Mercado, há riffs hard-rock, há baixo quase groovy e por vezes as coisas perdem o controlo da melhor forma possível), as palavras que ainda não querem dizer muito mais ecoam bem nos ouvidos de todas as raparigas adolescentes e pós-adolescentes que adoram essas coisas e usam óculos de massa e franjinha e algumas até são bem giras e tal, por isso valem mais ou menos a pena, mas são um bocado aborrecidas e estragam tudo, cantando em coro ou assim. E é por isso que há muitos detractores da banda, por causa dos e das fãs que estão mais preocupados com arranjar frases fortes para o seu espaço no MySpace ou assim. Mas aí a culpa não é da banda, é de quem a ouve, e mesmo assim algumas dessas frases fortes funcionam na perfeição, mesmo que a voz estivesse muita baixa (não sendo uma boa voz, funciona perfeitamente dentro do contexto, ao contrário do que dizem as más línguas).

Um ano e pouco tinha passado da última (e primeira?) actuação dos americanos The Strugglers em Portugal. Era aquele tipo de guitarra acústica que aborreceu toda a gente entre os Frog Eyes e os Destroyer na ZDB. Um ano passou, um disco novo se editou, uma banda arranjou, de aborrecido para indiferente passou. Aproximações a Will Oldham, canções vagamente interessantes, rapariga vagamente gira nos teclados (mais gira sem óculos, coisa rara), portanto ganham alguns pontos. Ainda falta algum elemento distintivo que os eleve das massas, mas, verdade seja dita, os Coldplay também precisam disso há anos e não se podem queixar de forma alguma.

Algures entre o eurodance e o baile funk, muito longe da noite dos slows prometida pela organização, as miúdas emo vão improvisando alguns passos de dança antes ou depois dos Maquiladora, a segunda banda norte-americana. Três tipos, sem bateria (um deles vai tocando no prato de vez em quando), com rotatividade qb, tanto nos instrumentos quanto na voz, fazem jus à noite dos slows, com "lalala" à mistura, mas sem grande substância. São aborrecidos como eram os Strugglers há um ano, fazendo com que os putos com um short attention span não se consigam concentrar, mesmo que Lecas, herói dos putos há mais de 10 anos, já se tivesse ido embora.

. O Lecas, os carrinhos de choque, um ou uma qualquer fã de Linda Martini que insistia em bater palmas (no tempo) com braços no ar em cada tema durante um ou dois compassos, para depois baixar os braços inexplicavelmente e o tipo com ar de estrangeiro que tirou literalmente o chapéu aos Strugglers estavam lá. Estava lá alguma gente, inclusivamente aqueles que iam ver Linda Martini e chegaram a tempo dos Maquiladora, sendo Linda Martini a banda mais esperada (encheram, duas semanas antes, a ZDB, totalmente sozinhos, coisa que os Strugglers, com os Frog Eyes e os Destroyer não conseguiram, de todo, fazer, daí ser legítimo pensar que são, das três bandas, aquela que movimenta mais gente em Lisboa), mas nada que se comparasse à enchente ZDB, talvez pelo pouco tempo passado entre as duas datas e pela imensa oferta dessa noite em Lisboa (relativamente perto do Mercado havia, no Maxime, Pop Dell'Arte e, na ZDB, Braço e Jan Jelinek). Mas, como já foi dito, havia uma presença que valia mais que todas as outras juntas: o Lecas foi à Kid City e nunca esqueceremos isso.
· 22 Abr 2006 · 08:00 ·
Rodrigo Nogueira
rodrigo.nogueira@bodyspace.net
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