ENTREVISTAS
Linda Martini
Na catedral do fato-de-treino
· 27 Jan 2006 · 08:00 ·
Algures durante a noite, no Centro Comercial Vasco da Gama, um puto senta-se à mesa redonda com os Linda Martini (Pedro Geraldes - guitarra -, André Henriques - guitarra e voz -, Sérgio Lemos - guitarra -, Hélio Morais - bateria - e Cláudia Guerreiro - baixo) e Luís, o responsável da Naked. Antes disso, nas mesas do Pans & Company, baguetes, batatas-fritas, conversas cruzadas sobre livros, a cena indie do Barreiro dos '90s, a Beekeeper, o Happiness de Todd Solondz e a tipa que corta o vizinho aos bocados e o guarda no congelador, o canibal alemão que encontrou um homem para comer (a sério) na internet e os Zao, tudo isto tendo dado origem à expressão "Canibalismo Cristão". Os Linda Martini deram recentemente concertos bem recebidos pelo público com os irlandeses God is an Astronaut, estão prestes a lançar um EP com os temas que lançaram na maqueta-promo que disponibilizaram gratuitamente no seu site e criaram um burburinho à sua volta. Desengane-se quem pense que estamos perante uns Arctic Monkeys ou os Clap Your Hands Say Yeah portugueses, os Linda Martini, para já, disponibilizaram os temas em .wma, não em .mp3, o que é uma diferença enorme, e aliam os instrumentais cheios de guitarras (têm três) e distorção, com crescendos e explosões pós-róquicas, à canção em português. Antes do Festival Um Dia A Caixa Vem Abaixo, e depois de terem estado a escolher canções para passar no programa de Gonçalo Castro da Antena 3, e no dia seguinte à grande desgraça nacional que foi a eleição de Cavaco Silva, os Linda Martini conversaram com o Bodyspace.

Andr�: Boa noite, Vasco da Gama.

Quem � que s�o os Linda Martini agora, aqui, no Vasco da Gama, dia - que dia � hoje? 23? - 23 de Janeiro de 2006 nesta mesa?

Andr�: Eu olho aqui para o pessoal que me rodeia, e lembro-me deles todos mais putos, mais imberbes, e eu tamb�m, com menos uns quilos.

S�rgio: Eu tinha mais, eu tinha mais, p�, eu parecia uma bola, p�.

Cl�udia: J� somos dois...esta vida, p�, esta vida...

H�lio: 't� mais magra agora...

Cl�udia: Eh p�, a s�rio, eu mato-te, meu. Se tu me dizes isso outra vez eu mato-te...

H�lio: N�o, somos os Linda Martini, estamos no Vasco da Gama, e acab�mos de comer.

Andr�: � pressa e mal.

S�rgio: E estamos prontos para as tuas perguntas...

H�lio: Estamos na fase do caf�. Somos uma banda de Queluz em Lisboa.

� uma grande viagem, de Queluz para Lisboa?

H�lio: N�o, o comboio agora � directo, vai logo at� ao Oriente...

Pedro: � directo para ti...

H�lio: Para mim, venho de Queluz directo para aqui para o Oriente, � bom.

Cl�udia: Bom, o comboio era directo.

Andr�: Isso tamb�m depende das horas...eu para Lisboa demoro uma hora com o tr�nsito na IC-19. Mas o longe � relativo.

Precisava era dos vossos nomes todos, para saber depois quando estiver a transcrever isto...

Andr�: Andr�.

S�rgio: S�rgio.

H�lio: H�lio.

Cl�udia: Cl�udia.

Pedro: Pedro.

E tu [viro-me para o Lu�s]?

Lu�s: Eu n�o falo.

H�lio: Ele � o man�ger.

S�rgio: � o m�nage.

Andr�: � a acompanhante.

Cl�udia: N�s � que somos o man�ger dele.

Lu�s: Estou sempre a dizer mal deles.

Cl�udia: 't�s? Ainda n�o te apanhei nessa...

Pedro: Eu gosto que digam mal de n�s.

Cl�udia: Eh, p�, eu tenho que admitir que n�o...sou uma pessoa suscept�vel.

Andr�: Eu sou sempre da opini�o de que n�o se deve ser consensual. � bom n�o agradar a todos.

Cl�udia: Isso � bom, mas lidar com isso � pior. Eu tenho consci�ncia disso, percebes? No entanto, n�o lido l� muito bem...

Andr�: Com o tempo, isso...

Cl�udia: Com o tempo isso n�o vai...passo por isso h� muito tempo com toda a gente e acredita, n�o melhora.

H�lio: Vai l� com calma.

S�rgio: Isto est�-me aparecer aquelas apresenta��es para aquelas pe�as de teatro, cada um 't� a falar para seu lado...

Andr�: V�, mas podemos come�ar a s�rio.

Pedro: Acho que j� come��mos a s�rio... Tamb�m acho que sim...

Cl�udia: Isto est� mais a s�rio que em qualquer outro s�tio, 't�s a falar abertamente sobre n�s...

H�lio: I�...

S�rgio: N�o 't�s a falar para nenhuma direc��o espec�fica...

Cl�udia: Noutro s�tio�

Pedro: Temos de dar a direc��o, � isso, 'tamos a falhar.

Podem dizer o que quiserem.


H�lio: Vais ter que editar de qualquer maneira...

N�o, eu n�o edito.

H�lio: N�o?

N�o tenho limite de palavras, n�o tenho nada...

Cl�udia: 'tamos lixados.

Voc�s 't�o lixados.

Pedro: Mas esfor�a-te, p�.

Andr�: Isso � a vantagem de escrever na 'net. N�o te metem nenhuma restri��o?

Nenhuma.

Andr�: Isso � um espect�culo.

Se quiserem podem passar a entrevista toda a falar, sei l�, do Cavaco Silva ter ganho as elei��es.

Cl�udia: N�o, p�, j� chega ontem.

H�lio: N�o, isso...

Cl�udia: Eh p�, a s�rio, isso � triste...

Andr�: Por acaso fiquei muito surpreso por o Alegre ter ficado em segundo...

Cl�udia: Por acaso...

H�lio: Eu n�o fiquei surpreso�

Cl�udia: Eu fiquei.

Andr�: As �ltimas sondagens j� falavam nisso, mas...

Cl�udia: G'randa cacetada no M�rio Soares...

Andr�: Esperava que o Av� Cantigas chegasse mais perto...

S�rgio: [com falsete infantil]: 't� velhinho.

Pedro: S� se fosse pr� monarquia, mesmo, chavalo. O Rei Soares.

Cl�udia: Mas devia, meu, por 0,6 d�i.

H�lio: O Rei Soares era bom...

Pedro: Soares III.

Andr�: Tu votaste, Lu�s?

Lu�s: N�o, pela primeira vez.

Andr�: Mas se votasses eu sei em quem � que irias votar. Pela primeira vez? J� n�o podes ser presidente...

H�lio: Eu votei mas n�o deu nada, por isso...

Cl�udia: Eu votei e pronto, n�o tinha nada para dar...dobrei a minha folhinha em branco.

Pedro: Mas o Cavaco Silva � fixe a falar, h�? Curto ouvir o gajo falar.

H�lio: A n�o falar!

Cl�udia: � o que se quer, eloqu�ncia.

Andr�: Sabes que de CEO da Naked para Presidente da Rep�blica � um passo, p�. Essa cena agora comprometeu-te ao m�ximo. 't�s bem fodido.

Lu�s: Completamente�

H�lio: � um salto.

Ele � o CEO da Naked [entrevistador ignorante]?

H�lio: Ele � a Naked...

Cl�udia: E a Joana?

H�lio: E a Joana...

Ent�o? Voc�s querem dizer mal da vossa editora?

Cl�udia: Eu por enquanto...por enquanto...

Andr�: ...s� temos a dizer bem. Da minha parte.

Tem-vos tratado bem?

Cl�udia: I�! Tirando a parte, pelos vistos, de ele dizer mal de n�s nas nossas costas...

H�lio: E n�o � por ele 'tar aqui, mas tem tratado bem, sim senhor. E tem sido bem tratado...acho eu.

Cl�udia: N�o � por 'tar aqui, aten��o!

Ent�o foi ele que vos juntou aos God is An Astronaut?

H�lio: Sim, quer dizer, o S�rgio � que podia falar sobre isso...

S�rgio: Foi ele que nos juntou aos God is An Astronaut.

H�lio: O S�rgio � que acho que mostrou os GIAA ao Lu�s...

Lu�s: Sim, sim.

H�lio: O Lu�s depois acabou por distribuir os GIIA c� e acabou por surgir a hip�tese de eles tocarem c� connosco e n�s com eles�

Como � que correram os concertos c�?

H�lio: Correram bastante bem...houve muita gente nos dois concertos...

Cl�udia: Lisboa n�o tanto, Famalic�o acho que foi muito bom...

H�lio: Lisboa n�o tanto, se calhar num ou noutro pormenor t�cnico...

Cl�udia: Para mim, para mim.

H�lio: Partimos uma corda, e mais umas coisinhas pequeninas...

Andr�: Mas isso � punk, � bom.

Cl�udia: Sim, � punk, mas pelo menos a mim n�o me deixa muito � vontade.

S�rgio: � punk mas pouco.

Pedro: Olha onde � que o S�rgio entra...s� para dizer asneiras, caralho.

Olha que isso n�o vai ser editado...

Pedro: Acho bem.

Querem ser vistos como uma banda que diz palavr�es?

Cl�udia: E ent�o?

Pedro: N�o, por isso mesmo...por isso � que ele est� aqui.

Depois n�o passa na MTV...

Pedro: E n�o queremos...n�o, n�o sei se n�o queremos...

H�lio: N�o queremos? Isso � com ele, isso � com o Lu�s...se passarmos, passamos, se n�o passarmos, n�o passamos.

Lu�s: O videoclip [de "Amor Combate"] 't� l�...

H�lio: 't� l�, j�? Bacano.

Pedro: A mim n�o me d�i, � tempo de antena...

H�lio: Correram bem, acho que no geral correram bastante bem, os dois concertos, sinceramente. E n�o estava � espera de uma recep��o t�o boa como em Famalic�o.

Pedro: Em Famalic�o foi muito bom.

H�lio: Estava muito cheio, a sala era muito, muito bonita.

Cl�udia: Mas � um tipo de p�blico completamente diferente, o pessoal estava todo sentado no ch�o, muito estranho.

Pedro: Eu gosto mais do pessoal do Porto.

Andr�: Eu gostei, eu gostei da cena do estarem sentados.

Cl�udia: Mas aquilo foi muito esquisito...o pessoal estava a curtir, mas eu curto mais o pessoal em p�.

H�lio: As pessoas estavam no ch�o...

Pedro: N�o estava a falar disso, mas gostei mais do pessoal do Maus H�bitos do que qualquer outro concerto aqui. N�o sei.

Cl�udia: O do Lounge foi muito bom, meu.

Pedro: No Lounge 'tava l�, tipo, o povo todo, mesmo.

Cl�udia: I�.

H�lio: Sim, mas o de Famalic�o foi diferente, estava um ambiente especial, apesar de estar tudo sentado...

Cl�udia: Uma luzinha diferente...

H�lio: N�o sei. Estava muito familiar.

Andr�: E o som estava bom, � meio caminho andado para te sentires bu� bem.

Cl�udia: Para mim � mais que meio caminho andado...

H�lio: E a n�vel t�cnico acho que esse foi para a� o concerto que nos correu melhor.

Pedro: Porque Linda Martini tem tudo isso, tamb�m, andar �s voltinhas, a passear...

Cl�udia: A ficar com carrinhas paradas no meio do nada.

S�rgio: A 150 km de Lisboa berrar uma carrinha...

Querem desenvolver essa da carrinha?

Lu�s: Basicamente, tivemos dois deslizes. Primeiro foi com a carrinha dos God is an Astronaut, em que cheg�mos � porta da Casa das Artes e berrou.

S�rgio: Morreu.

Cl�udia: V� l� que foi � porta, n�o foi mau...

Lu�s: E depois foi �s 3 e 15 da manh�, est�vamos n�s a sair de Famalic�o e v�nhamos para baixo, par�mos para dormir um bocado, retom�mos a viagem �s 6 da manh� e fic�mos no Pombal. Sa�mos de Famalic�o �s 3 e 15 da manh� e cheg�mos a casa �s 3 da tarde.

H�lio: Correc��o, eu cheguei a casa �s 10 da noite porque depois tive que ir a Pombal buscar o material.

Cl�udia: Foi divertido.

S�rgio: Eu acordei �s 9 da manh� e vi a Cl�udia de colete.

Pedro: Este gajo foi sempre a dormir.

Andr�: Pens�mos: "O que � que se passa?" Foi lindo, meu. "Ah, isto avariou e o camandro."

Pedro: Foi logo, como � que era? A correia trapezoidal ou l� o que foi.

Andr�: A correia trapezoidal, i�.

Pedro: "Mas o que � que � isso, voc�s sabem o que � que � isso?"

Cl�udia: P�, eu sei que aquilo tinha uma correia e uma correia � importante no carro, agora se era trapezoidal ou n�o...

H�lio: E rebentou e fic�mos na estrada.

Pedro: Mas lemos o manual de instru��es, foi fixe...

Isso foi a coisa mais interessante ou estranha que vos aconteceu como banda?

Pedro: Sem d�vida.

H�lio: Foi a mais esquisita, pelo menos.

Cl�udia: Foi a mais desagrad�vel, eu acho.

H�lio: E ao mesmo tempo n�o...

Cl�udia: "Ao mesmo tempo n�o"? Fala por ti, meu.

E em cima do palco?

H�lio: Em cima do palco?

Cl�udia: O que � que nos aconteceu?

H�lio: Assim de muito esquisito acho que nada.

Lu�s: P�, foi nos Maus H�bitos.

H�lio: Nos Maus H�bitos? O que � que aconteceu? Ah! Mas isso foi no soundcheck?

Cl�udia: Qual qu�? No soundcheck o qu�?

Andr�: Foi enganar-me a meio e recome�ar. Isso eu acho bem, p�, se for a meio, mesmo a meio, se calhar � um bocado chato voltar tudo atr�s, mas como foi no in�cio, tu come�as a pensar: "Eh p�, n�o vou dar a m�sica a estes gajos assim m�, ent�o vou recome�ar..." Acho que o pessoal percebeu.

H�lio: I� i� i�.

Pedro: � a cena da confidencialidade, foda-se, "j� que 'tou a dar dou bem".

Andr�: � ser honesto. "P�, olha, correu mal. V�, siga." Eu acho isso perfeitamente confort�vel.

Cl�udia: Desde que n�o se fa�a muitas vezes...

H�lio: Acho que ainda n�o houve assim nada...

Cl�udia: Ainda n�o houve nenhum esc�ndalo, mas havemos de ter um.

Andr�: Isso � engra�ado, uma banda pequena ou uma banda da nossa escala, uma banda com um bocadinho de exposi��o, se algu�m for ver o concerto e acontecer uma cena dessas, podes ter v�rios coment�rios diferentes em rela��o a isso. H� pessoal que pode interpretar isso como inexperi�ncia, ou pessoal que pode interpretar isso como qualquer outra coisa. Se forem, por exemplo, os Coldplay, n�o fui ao concerto, mas ouvi na cr�tica que o gajo se enganou l� no concerto e fartaram-se de rir e voltaram e tocaram a m�sica de in�cio. E o pessoal - eles s�o adorados - vai l� todo j� babado com o dinheiro a apostar que vai ser um g'randa concerto mesmo que n�o seja. E o pessoal mija-se todo nem que o gajo mande tudo ao lado. Isso tamb�m depende um bocadinho da expectativa da pessoa e a forma como j� acarinhou a banda. Se for uma banda mais pequena a fazer uma coisa dessas...� tida como inexperiente.

Pedro: N�s somos uma banda carinhosa.

Andr�: Eu acho que sim. Considero-me afectuoso.

Pedro: Eu tamb�m, acho que todos somos.

Mas voc�s t�m sido bem recebidos sempre que v�o a algum lado...

Cl�udia: Por agora...

H�lio: At� agora, sim. N�o temos raz�o de queixa.

Do que ouvi do concerto no Santiago Alquimista, muita gente diz que voc�s abafaram completamente a segunda banda...

Pedro: Acho que isso tem a ver com o estilo de m�sica e com o que cada banda d� ao vivo.

H�lio: Eram coisas diferentes, tamb�m. A cena passa mais pela cena ao vivo, n�o sei, eles t�m o apoio dos v�deos, para j�, que n�s n�o temos, ent�o acho que n�s temos que dar mais de cada indiv�duo do que eles, porque n�o temos o v�deo atr�s para ajudar.

S�rgio: Mas h� que ter uma coisa aqui em considera��o, que �: n�o n�s estamos nem estivemos a competir com eles. N�s toc�mos o nosso set, eles tocaram o set deles. Agora se eles abafaram ou n�o...

Cl�udia: Os gajos levam um n�vel de profissionalismo para os palcos que � uma cena.

Pedro: Eles s�o bu� profissionais.

Cl�udia: S� o tocarem com metr�meno...

Andr�: H� outra cena que � um facto que � assim: se calhar a maior parte do pessoal que 'teve l� nesse concerto, em termos percentuais, eram mais as pessoas que nos conheciam a n�s do que conheciam os gajos, temos essa percep��o. Portanto, � normal que a opini�o das pessoas tamb�m fosse para a�. E � diferente, eu acho que n�o s�o coisas compar�veis. Se fosse uma banda com um estilo similar ao nosso, ent�o, p�, a� percebo que o pessoal pudesse chegar l� e dizer "Voc�s 'tiveram melhor que eles em determinado aspecto", mas aquilo � radicalmente diferente, apesar de o pessoal aplicar aquelas semelhan�as...

Pedro: H� sempre a compara��o, num concerto, duas bandas tocam e as pessoas dizem "Estes estiveram melhor..."

Andr�: ...de termos uma componente instrumental, eles tamb�m t�m, e h� compara��o por causa disso. At� porque eles s�o muito mais met�dicos, eles tocam com metr�meno, as coisas deles s�o muito mais certas. E n�s ao vivo - tu se calhar n�o tiveste tanto essa sensa��o porque viste pouco do concerto, pelo que me disseste foi s� aquele da FLUL [concerto na faculdade do escriba, no qual s� se tocaram dois temas antes da luz ir abaixo, e que j� foi narrado nesta webzine] -, mas quem ouve a maqueta e nos ouve ao vivo, a coisa que chama mais a aten��o � isso. Pensam que de facto era mais calminho, em rela��o � maqueta � a ideia com que o pessoal fica. Por isso somos capazes de ter surpreendido algumas das pessoas que s� conheciam a maqueta e n�o nos tinham visto ao vivo, da� falarem nisso...

H�lio: Ou que s� conheciam o "Amor Combate". Eu acho que � mais isso. H� muita gente que s� conhece o "Amor Combate" e se calhar n�o est� � espera de levar com metade do set instrumental...

"Amor Combate" � o vosso single, passa na r�dio, n�o passa?

H�lio: Sim.

� um bocado...tem um apelo radiof�nico, mas n�o tem muito a ver com o que passa na r�dio, � uma coisa esquisita...

H�lio: Ainda hoje estivemos a falar sobre isso, tem-nos surpreendido bastante por causa disso, quer a Antena 3, agora a Best Rock tamb�m tem estado a passar.

Resto da banda: A s�rio?

Cl�udia: A Best Rock tem estado a passar mas bem...

Andr�: N�s na altura at� pensamos que se metiam aquelas quest�es, que se come�amos na r�dio as coisas t�m que ser um bocado mais formatadas e, p�, se a m�sica n�o tiver 3 minutos e pouco e n�o tiver um refr�o e repetir, eles torcem um bocado o nariz. E, p�, por acaso n�o esper�vamos essa aceita��o da parte deles...p�, passar no Henrique Amaro � uma coisa, porque � o programa dele, o gajo passa aquilo que quer, � um programa de autor e passa � noite, agora, por exemplo, passar a meio da tarde e passar a seguir a Coldplay ou outra coisa qualquer mais mainstream...n�o encaixa nos moldes da r�dio. Isso tamb�m nos d� algum tipo de contentamento, porque sabemos que fazemos o som que queremos e, n�o fazendo ced�ncias, conseguimos chegar a esse canal que � mais aberto, em termos de exposi��o, e isso d�-nos algum gozo pessoal.

H�lio: Acho que isso talvez tamb�m aconte�a por ser cantado em portugu�s, n�o sei. Se fosse cantado em ingl�s n�o acho que tivesse metade ou um quarto sequer da aceita��o, nomeadamente dos meios radiof�nicos, n�o sei.

Foi por causa disso que voc�s come�aram a cantar em portugu�s?

H�lio: N�o...

Cl�udia: Foi mesmo por coincid�ncia.

H�lio: ...n�s ach�mos, quando decidimos come�ar a cantar em portugu�s, at� que ia ser mais dif�cil para as pessoas digerirem a coisa, mas entretanto aconteceu exactamente o contr�rio, ainda bem.

Andr�: Ali�s, n�s pr�prios, e j� fal�mos disto em v�rias entrevistas, � quase um lugar-comum, mas quando fazem essa pergunta temos de responder assim porque foi assim que se passou...na altura, quando n�s form�mos a banda, j� toc�vamos h� uns tempos, o projecto sofreu v�rias muta��es porque est�vamos a tentar chegar ali a algum consenso em termos de som e no in�cio era de facto tudo instrumental. N�o havia voz. E depois come��mos a falar entre n�s, e de facto havia ali a necessidade - pelo menos a maior parte de n�s sentia - de haver ali algum elemento distintivo, e na altura falou-se da possibilidade, ou de meter samples ou voz ou outros elementos que pudessem distinguir tamb�m um bocadinho. E, quando se come�ou a falar na voz, ou, neste caso, na l�ngua, de ser em ingl�s ou em portugu�s, os outros projectos que t�nhamos tido anteriormente, todos n�s, eram em ingl�s. E, para n�s, digo sinceramente que representava um desafio maior. Em que sentido? Isso � um facto, n�s olhamos hoje em dia para as bandas portuguesas e a maior parte delas, em termos de rock mais moderno e assim, alternativo ou o que seja, � tudo em ingl�s, c� em Portugal. Ent�o parece que � estranho, por exemplo, eu se disser a uma pessoa que eu conhe�o mas n�o sabe que eu tenho uma banda, �s vezes pessoas em conversas dizem "Ah, tens uma banda? Ent�o, e cantam em ingl�s ou em portugu�s?" E � engra�ado porque quando eu digo que � em portugu�s, as pessoas perguntam: "� tudo em portugu�s?" Acham estranho o facto de ser em portugu�s. P�, e n�s n�o somos daquelas bandas panflet�rias, nem erguemos nenhuma bandeira a dizer "Somos portugueses, temos que cantar em portugu�s", mas para n�s, n�s cheg�mos a uma altura em que ach�mos que fazia mais sentido, porque � aquela coisa, eu sou portugu�s, eu penso em portugu�s, se estiver a escrever uma letra em ingl�s - j� o fiz, noutras bandas que tivemos -, vou estar a traduzir os meus pensamentos para ingl�s. Ent�o n�s saltamos esse passo interm�dio e passamos para o papel aquilo que � a nossa l�ngua. E esse desafio � maior porqu�? Porque, tu se calhar tamb�m tens essa percep��o, e as pessoas que ouvem projectos cantados em portugu�s t�m, eu acho que n�s somos muito mais cr�ticos em rela��o ao que � portugu�s, porque � a tua l�ngua, tu sentes aquilo como teu. E se o gajo manda ali uma palavra ao lado ou uma frase de que tu n�o gostas muito ou um excerto, um poema ou o que seja, tu se calhar achas que n�o encaixa bem, que n�o foi bem conseguido. Enquanto o ingl�s, mais ou vez, digo, n�o estou a defender que se deva cantar em portugu�s, mas eu acho que o ingl�s acaba por ser um bocadinho mais f�cil de encaixar porque a l�ngua � mais redonda, n�o �? Tu dizeres, sei l�, uma coisa como "eu amo-te" em portugu�s ou ingl�s tem impactos completamente diferentes. E � mais dif�cil, acho eu, e � engra�ado, para os portugueses aceitar uma coisa como v�lida na l�ngua deles, porque eles s�o mais cr�ticos. � assim que eles falam. P�, � a mesma coisa com os filmes. Tu vais ver um filme em ingl�s e os gajos at� podem n�o representar muito bem, e os figurantes tamb�m, mas aquilo � ingl�s, ent�o a realidade � sempre distante. Se vires um filme em portugu�s e aparecer l� um figurante que manda uma cena ao lado, "Ah, ele disse 'merda', se fosse na vida real ele dizia 'foda-se', ele n�o 't� a ser verdadeiro". E acho que somos muito mais cr�ticos em rela��o ao que � em portugu�s. Da� n�s querermos de facto ter esse desafio. N�o no sentido de acharmos que o portugu�s nos poderia abrir mais portas, como o H�lio disse, at� ach�mos que podia ser um entrave, para as pessoas serem mais cr�ticas, mas o facto � que aconteceu ao contr�rio, as pessoas gostaram, aceitaram bem a onda, e a forma como est� encaixado.

Cl�udia: Tem desvantagens, � que �s constantemente comparado com...

H�lio: ...as poucas bandas que h� em portugu�s.

Cl�udia: ...as bandas apenas porque s�o cantadas em portugu�s, porque se pensares a s�rio nisso, e conscientemente, percebes que de facto � isso que acontece. Se aquilo n�o fosse cantado, se aquilo n�o fosse em portugu�s, n�o se comparava.

Pedro: Mas � que as refer�ncias s�o muito poucas...

Cl�udia: Pois �, h� muito pouco rock em Portugal, cantado em portugu�s...

H�lio: Rock assim mais alternativo...

Cl�udia: I�, sim, tens coisas, mas o que � que dessas coisas � cantado em portugu�s?

Pedro: Eu acho que pode ser, acho que Linda Martini pode ser comparado com Ornatos, at� a Toranja, 't�s a ver. Porqu�? S�o as refer�ncias, � aquilo que est�s habituado a ouvir, e quando vais ouvir outra coisa comparas com aquilo, e sim, de certeza que tem influ�ncia, mas n�o � uma coisa...

H�lio: O instrumental acho que n�o tem nada a ver...

Cl�udia: Mas sabes uma coisa engra�ada? No outro dia 'tava a passar o "Amor Combate"...n�o, uma m�sica de Ornatos bu� conhecida, de que eu n�o sei o nome, aquela com o Victor Espadinha, 'tava a passar isso na Antena 3...

Pedro: "Ouvi dizer"...

Cl�udia: Eu 'tava a ouvir isso e a minha m�e 'tava ao meu lado. E eu disse, "Olha, m�e, esta � uma daquelas bandas com quem dizem que n�s somos parecidos." E a minha m�e 'tava a ouvir e disse, "Eh, p�, mas a voz n�o tem nada a ver", e eu, "N�o tem nada a ver, de facto, e ele mete muitas palavras, n�o tem nada a ver com isto", chega a parte das guitarras e a minha m�e diz isto, "Ah, mas aqui j� est� parecido", e eu "P�, s�o guitarras, � rock, podes meter tudo de alguma maneira no mesmo saco, mas dentro de todo o tipo de rock distingues muita coisa, n�o �?" Portanto n�o � porque tem uma guitarra el�ctrica ou porque tem alguma coisa que consegues enfiar num saco.

S�rgio: E � porque, basicamente, qualquer banda que surja a� tem que ser comparada a algo. Ser logo comparada. Mas tem que ser.

Andr�: Sim, por exemplo, eu telefono-te, e digo: "J� ouviste isto?"; "I�, � tipo qu�?"; "� na onda disto..:", e � normal, um gajo fala sempre nisso. E as refer�ncias s�o importantes para tu situares mais ou menos. Mas agora, eu concordo exactamente com aquilo que 'tavam a dizer, por exemplo, e quando falam em bandas com que nos querem comparar e relacionar, falam muito em Ornatos e Toranja. Se fores ver, as pr�prias bandas entre si...

Cl�udia: ...t�m nada a ver...

Andr�: Ningu�m se lembraria de comparar Ornatos nem Toranja.

H�lio: Tirando o primeiro single de Toranja...eu lembro-me de ouvir o primeiro single de Toranja e soava a Ornatos.

Pedro: Era bem mais rock...

H�lio: Hoje em dia acho que o som de uma n�o tem nada a ver com a outra.

Andr�: Mas h� aquela pergunta fatal, quando nos falam nisso, "Ah, Ornatos-Toranja", e n�s a seguir dizemos, "Mas diz-nos outras bandas, portuguesas, que cantem em portugu�s rock actual, o que � tens? Ornatos, Toranja...tens Cl�..."

H�lio: Tens Pluto.

Andr�: ...mas s�o coisas que se calhar n�o s�o compar�veis.

Supernada...

H�lio: Mesa, p�.

Andr�: Vem da mesma cabe�a...j� ouviste Supernada?

Ouvi uns mp3 de m� qualidade...

Andr�: Mas dizem que aquilo � mais punk, mas cru, tiveste essa sensa��o?

Lu�s: Dizem que tem mais can��es, mais do que os Pluto.

H�lio: Sei que � com pessoal de Mesa, tamb�m, se n�o me engano, que era de Zen.

� com o baterista dos Pluto a tocar guitarra...

Andr�: I�, mas, por exemplo, Ornatos...se calhar nem todos n�s gostamos...

H�lio: Acho que toda a gente gosta aqui...

Cl�udia: I�, toda a gente gosta. Mas n�o tenho nenhuma fixa��o especial por eles.

Andr�: P�, � uma banda que respeitamos, que tem um trabalho muito fixe, e gostamos de coisas deles...

S�rgio: Passam-me um bocadinho ao lado.

Andr�: Agora, em termos sonoros, da nossa parte, n�o tem influ�ncia absolutamente nenhuma. N�o h� l� nada que seja puxado a Ornatos. Eu, por exemplo, no meu caso, se eu for eleger, se me pedissem para escolher uma banda portuguesa de refer�ncia, eu escolhia M�o Morta.

H�lio: M�o Morta, i�.

Andr�: Acho que ningu�m nos compara a M�o Morta...

H�lio: Acho que isso � consensual na banda, a banda portuguesa...

Bem, t�m uma baixista feminina...

Cl�udia: Eh, p�, isso...� daquelas coisas que se dizes outra vez eu aperto-te o pesco�o.

S�rgio: Isso � cruel da tua parte. � cruel da tua parte.

Cl�udia: Eu n�o tenho culpa de ter ido parar ao baixo.

H�lio: Ela j� tocou guitarra noutra.

'tava a tentar arranjar pontos comuns...

Andr�: Esse �, definitivamente.

Usam guitarras, usam bateria...

S�rgio: Somos de Braga...

Cl�udia: Sabes que para mim � estranho conseguir imaginar uma banda sem guitarras e sem bateria. � uma coisa esquisita.

H�lio: Tamb�m j� ouvi falar em rela��o a Sonic Youth, tamb�m...por causa de termos uma baixista. Mas ela tocava guitarra na outra banda que t�nhamos, por isso tamb�m...a� j� era diferente.

Andr�: Mas mais de tr�s [guitarras] j� era demais aqui...tr�s j� � barulho suficiente.

Cl�udia: Na altura s� havia duas. Mas eu aqui n�o tocava guitarra...

Andr�: Mas a ideia de tu tocares e de a gente trocar ainda est� de p�, se quiseres...

Cl�udia: Sim, s� que isso faz sentido na altura em que eu aparecer com uma coisa de guitarra feita, apareci mas nunca se chegou a fazer nada disso...

Andr�: I�, somos muito cal�es, muito cal�es. A ideia de in�cio era "Ah, n�o sei qu�, vamos cantar." E ent�o um gajo pensava "Quem � que vai cantar?" Ningu�m queria. Ent�o "Ah, vou eu, tenho aqui uma cena, eu canto, mas depois se tu fizeres uma cena cantas tu." S� que depois a coisa vai andando, vai andando, um gajo acaba por se habituar e fazes as coisas e metes.

Cl�udia: Eu n�o fa�o nada porque n�o consigo. Tenho medo de me aproximar do microfone, custa-me muito.

Andr�: A ideia era tamb�m, guitarra, tocar a Cl�udia e depois eu baixo e trocar, mas somos muito cal�es, aquilo est� ali e depois...enfim...

H�lio: Mas foi mesmo acidente, i�, na altura t�nhamos j� duas guitarras, o baixista da altura saiu, ele n�o tocava com os dedos, p�. Para o som que n�s est�vamos a querer fazer era um bocado...

Cl�udia: � engra�ado, porque era para ser uma cena muito mais experimental do que aquela em que se tornou. S� que fomo-nos acomodando um bocadinho...

S�rgio: Sim, mas isso faz parte...faz parte da constru��o musical de uma banda...come�as com uma ideia, vais juntando as ideias e a partir da�...

Andr�: Aquilo afunila, tu come�as com o projecto, "vamos fazer isto, vamos fazer aquilo" e o caralho, mas depois toda a gente tem o seu grau de conformismo e segue, segue ali um bocado a ideia e depois �s vezes as coisas acabam por afunilar. Se bem que a ideia inicial era fazermos isto, fazermos aquilo e depois trocar, necessariamente tu acabas por afunilar e chegar �quilo que...

Pedro: Mas tamb�m nunca fica...

Andr�: Sim, n�o est� fechado, a ideia est� l�...isso � bom, isso � bom, n�o termos a cena formatada, n�o pensarmos nos pap�is de cada um. Isso acho que � uma coisa que me faz sentir muito confort�vel, n�o termos esse limite ou essa barreira...

H�lio: Se calhar at� foi bom tu ires para o baixo, sen�o n�o havia "A Severa", por exemplo...

O que � "A Severa"?

H�lio: � uma das m�sicas que n�s temos...

Cl�udia: Olha, foi aquela m�sica que ficou a meio na Faculdade de Letras em que ficou s� ele [H�lio] a tocar sozinho.

O "Eye of the Tiger"...

Cl�udia: I�, isso n�o faz parte da m�sica, mas pod�amos adaptar...

H�lio: Pod�amos fazer um sample e p�r a� nessa parte.

Andr�: Isso em termos de royalties 'tavas bem lixado...

H�lio: Mas depois os samples tamb�m iam soar muito �s bandas que h� no nosso espectro, ent�o...acab�mos por n�o p�r samples...temos uma m�sica com samples, mas tamb�m � surpresa.

Quais s�o as bandas "do vosso espectro"?

H�lio: Do nosso espectro?

Cl�udia: Ainda hoje estivemos a passar m�sica na Antena 3.

Andr�: Olha, podemos falar daquilo que pass�mos na Antena 3...

Reciclar ideias, 't� bem, eu n�o me ofendo.

Andr�: Na Antena 3 estivemos a passar, a ideia inicial era trazermos 5 CDs, e se houvesse tempo cada um de n�s escolhia ali umas malhas...p�, s� houve tempo para cada um de n�s passar duas m�sicas, p�, e a� v�-se um bocadinho a heterogeneidade que h� em termos de gostos. Posso ter passado coisas que voc�s n�o conhecem t�o bem ou n�o ouvem tanto em casa.

Cl�udia: I�, aquela coisa que tu passaste eu n�o conhecia, Papa M.

Andr�: Eu passei Sannyasin, p�, porque � aquela raiz de tudo, do punk. 'Tava h� bocado a falar com o Pedro, e deu-me muito gozo, p�, desde mi�do, desde os 15 anos que ia a concertos de X-Acto, e os gajos naquela altura, para mim, eram os reis. Qual pessoal l� fora, qual qu�. Eu queria era ter uma banda punk e ir tocar ao Ritz no fim-de-semana a seguir.

Cl�udia: E foram, i�.

Andr�: Mas isso foi o princ�pio de tudo, deu-me um gozo do cara�as, p�, nunca imaginei, passado uns tempos, ter esta banda e darem-nos a oportunidade de ir � r�dio e passar o que quisesse. E eu passar uma cena que foi mesmo aquilo que me influenciou. Podia chegar ali e passar os Mogwai ou os Godspeed [You! Black Emperor] ou aquelas cenas cenas todas do p�s-rock com as quais normalmente tamb�m nos identificam, p�, mas a influ�ncia que isso teve em mim e no meu processo de crescimento n�o s� enquanto m�sico mas tamb�m enquanto puto, no que eu ouvia, � muito reduzido em rela��o � cena toda que n�s apanh�mos de tr�s. Deu-me um gozo tamb�m, eu passei Sannyasin e passei Papa M, um CD que comprei h� pouco tempo, tamb�m muito bom.

H�lio: O Pedro passou Operation Ivy...

Pedro: Eu tamb�m passei na base de Sannyasin, de X-Acto, passei Operation Ivy, tamb�m s�o as ra�zes, foi aquilo que na altura realmente tocou e fez querer seguir em frente.

Andr�: Querias ter uma banda ska, chavalo...

Pedro: I�, eram os Skapatola...

Andr�: Toda a banda de ska que se preze tem de ter um trocadilho com a palavra "ska"...Skamioneta do Lixo, Skapatola, Skapula...

H�lio: Skanevass ["Se c� Nevasse", dos Salada de Frutas]

Cl�udia: Eh p�, Skanevass, isso � Lena D'�gua, meu... Acho que a Lena D'�gua j� tinha sa�do nessa altura...

Cl�udia: H�? Acho que a Lena D'�gua j� tinha sa�do dos Salada de Frutas nessa altura...

Cl�udia: N�o sabia.

Andr�: O homem conhece, o homem conhece...

H�lio: E tu, o que � que passaste, S�rgio? O S�rgio passou Zao e mais o qu�?

S�rgio: E Pixies.

Ent�o voc�s s�o todos uns punks...

H�lio: Eh p�, � a base.

Cl�udia: Eu passei Logh.

H�lio: P�, a nossa escola � essa.

Cl�udia: Mas queria ter passado Nirvana, s� que depois havia bu� cenas para passar...

Andr�: Esse r�tulo do punk...imagina, quem for ler o teu texto, e n�o tiver crescido com isso pensa em gajos com cristas e "no future" e bebedeiras de manh� � noite. Mas para n�s o punk foi mesmo a coisa do esp�rito...

H�lio: Do-it-yourself.

Andr�: O punk � das coisas mais fixes para se come�ar, � um pontap� de sa�da em grande, porque tu v�s que aquilo s�o tr�s ou quatro acordes, juntas um gajo que sabe tocar bateria, que manda l� umas pantufadas, e desde que fa�a aquele ritmo "tacutacuta" aquilo 't� na boa e vamos tocar a seguir quando os amigos organizarem um concerto...por isso � que, p�, no outro dia est�vamos a falar nisso j� n�o sei a que prop�sito, por isso � que tu v�s hoje em dia, se fores ver o hist�rico das bandas que agora s�o associadas ao p�s-rock e aos estilos assim mais progressivos dentro do rock, muitas delas tamb�m t�m aquele passado ligado ao punk e ao hardcore, acho que isso aconteceu connosco. P�, tu entras naquela escola, p�, quando n�s come��mos com 15 anos, n�o � que hoje seja um grande virtuoso, ali�s, n�o sou, nem de perto nem de longe, nenhum de n�s tem escola de m�sica, � mesmo chegar ali e descobrir as coisas por n�s, mas isso ajudou-nos... p�, e ajudou-nos a come�ar e a partir da�, enfim, h� pessoal que escolhe ficar ali no punk e fazer a cena porque � mesmo aquilo de que gosta e depois h� pessoal que gosta de passar um bocadinho a fronteira e ir para outro tipo de coisas. Por isso � que se fala do p�s-punk e do p�s-rock e dos "p�s" todos. � o pessoal que j� est� farto dos tr�s acordes...em vez de teres refr�o n�o fazes nada...

Pedro: P�, mas a cena do punk em termos musicais � um bocado isso, mas depois tamb�m tens a ideologia...

H�lio: Essa mant�ns...

Pedro: ...n�o de andar todo fodido com crista, acho que isso tamb�m � aquele estere�tipo que s� mesmo aquele pessoal que n�o conhece � que associa a isso, h� tudo o resto, que � um bocado a ideologia da coisa, de como fazes e o sentimento que tens na coisa.

H�lio: E a vontade que tens de fazer as coisas por ti mesmo, l� est�...porque � tudo diferente.

Pedro: � um bocado isso, � a sinceridade.

H�lio: � a diferen�a do punk e do hardcore, � que as coisas acontecem. C�, por exemplo, tinhas um circuito punk e hardcore, havia concertos, havia sempre gente, � volta de 100 pessoas em cada concerto, umas vezes menos, umas vezes mais, mas tinhas...

Andr�: 200 e 300...

H�lio: Tinhas sempre aquele circuito em que podias tocar e sabias que ia l� sempre gente ver...agora n�o sei...o circuito indie, as cenas mais alternativas, se calhar agora j� come�a a haver mais, mas aqui h� uns anos as bandas que tocassem rock se calhar n�o tinham um circuito t�o constante.

As coisas de que o Lu�s estava a falar antes, da BeeKeeper e tal...

H�lio: Pronto, houve essa altura, l� no Barreiro, n�o sei como � que eram as coisas l�, mas eram pouco, e se calhar eram n�cleos pequenos. Eu lembro-me de X-Acto ir tocar ao Algarve, isto em '97 e '98, ir tocar ao Porto... pronto, haviam pequenos n�cleos em todo o lado e era poss�vel haver concertos em cada s�tio. N�s tamb�m com as outras bandas fomos tocar ao Algarve, tocar a uma s�rie de s�tios, com os meios, outros tipos de m�sica, rock mais normal, mais FM, seja l� o que for, ou est�s apoiado por uma grande editora ou ent�o acabas por ter poucos concertos e ter poucos s�tios onde tocar...pelo menos com condi��es de p�blico aceit�veis.

Andr�: E a cena das maquetas, p�, e das 'zines, h� um circuito, p�, h� pessoal que se mexe... p�, isso � um feeling do cara�as, � incompar�vel a qualquer outra coisa... no fundo � um bocadinho contradit�rio, n�o � o prazer de ser diferente, mas acabas depois por tirar um certo gozo daquilo, por saberes que fazes as coisas por ti, que tu e os teus amigos organizam os concertos, que as bandas que v�o tocar s�o dos amigos ou dos amigos dos amigos, e o feeling � totalmente diferente. � diferente ires para um cartaz e serem bandas a tocar que n�o conheces de lado nenhum, nesse sentido � muito mais, e nesse sentido � muito mais puro...

Mas tu, H�lio, continuas ligado ao hardcore, com os If Lucy Fell...

H�lio: Eh, p�, eu n�o chamaria �quilo hardcore...sinceramente...eu acho � que n�s ultimamente temos tocado, agora n�o tanto, com bastante bandas ligadas ao hardcore, porque se eu ouvir aquele som n�o acho que aquilo seja hardcore. Acho que aquilo � rock, pronto, tem influ�ncias �bvias, tem um groove que se calhar fomos buscar ao hardcore, mas acho que aquilo n�o � hardcore, sinceramente. Mas, apesar de tudo, pronto, estamos ligados ao meio hardcore, bem como Linda Martini tem muita gente do hardcore que vai aos nosso concertos, continua ligado...os Vicious Five, tamb�m, que � uma banda que tamb�m tem ra�zes profundas no hardcore, tem o Sega, que era de X-Acto...

Andr�: � muito bom tu referires isso, mas essa cena, tamb�m h� aquela ideia, e � normal, em qualquer circuito que haja, seja no punk, seja no hip-hop, parece que as pessoas t�m aquela tend�ncia para serem fechadas e, eh p�, a tudo o que seja fora disso, torcem o nariz. "N�o gosto. N�o � hardcore, n�o � punk, n�o � c� da cena." Por acaso tamb�m foi uma cena porreira, porque n�s n�o nos chate�mos com o hardcore, n�o dissemos: "ponto final, agora vamos cantar em portugu�s e vamos aparecer na r�dio". Deu-nos para aquilo e saiu aquilo. E � imposs�vel tu formatares as coisas, quer dizer, � poss�vel, mas no nosso caso n�o aconteceu. E deu-nos tamb�m um certo gozo perceber que muitas dessas pessoas que estavam no hardcore perceberam a cena e continuaram. E n�o � por n�s agora estarmos a fazer um som n�o t�o ligado a essa cena que v�o deixar de ouvir...

H�lio: O p�blico tamb�m mudou. De gostos e n�o sei, mas � isso...acho que estas bandas de que se falaram t�m todas ra�zes profundas no hardcore, t�m, porque foi l� que come��mos a tocar...

Cl�udia: Acho que o p�blico do hardcore tamb�m est� um bocado diferente, j� n�o ouve s� hardcore, e as pessoas agora ouvem muito mais coisas, ouvem tudo e mais alguma coisa...

H�lio: Por exemplo, a maior parte do pessoal do hardcore, aquele que ouve mesmo s� hardcore, com umas palas mais pr� frente, n�o gosta de If Lucy Fell...e nem t�o pouco aceita que se fale de hardcore...

Cl�udia: � m�sica frique...

H�lio: Se tu fazes alguma coisa, sais do meio do hardcore, atinges outros meios, e n�o falas do hardcore, �s sell-out, �s vendido, o que seja, se falares...

Andr�: Est�s-te a aproveitar...

H�lio: Est�s-te a aproveitar. "Isto � hardcore? Nunca na vida! Isto n�o � hardcore, n�o venhas falar de hardcore!" Por isso ent�o � um bocado amb�guo, n�o sei, acho que mais vale dizer que temos ra�zes profundas, � um facto, mas o som j� n�o tem a ver com o hardcore.

Cl�udia: E quem � que tem? �s tu e o Makoto, porque o Rui e o Gaza ent�o...

H�lio: Sim, mas eu estava a generalizar a coisa, estava a falar de Linda Martini, tamb�m, e de Vicious Five, por exemplo, que acho que s�o as bandas que vieram do hardcore emergentes agora.

Voltando � quest�o da l�ngua, estavam a falar de como achavam que a l�ngua podia ser uma barreira...o vosso disco vai ser distribu�do l� fora, n�o vai?

H�lio: Sim.

E voc�s v�o tocar agora com os GIIA l� fora, n�o v�o? Como � que o cantar em portugu�s ajuda na internacionaliza��o?

H�lio: Isso foi outra surpresa...

Cl�udia: � que houve um irland�s que achou que n�s est�vamos a cantar em ingl�s...

H�lio: Mas os irlandeses gozam um bocado com a pron�ncia dos ingleses...

Cl�udia: N�o, o gajo pensou mesmo..."Ent�o, meu, acorda, � portugu�s!"

Andr�: I�, mas o gajo disse isso porque estava habituado a ver malta com pron�ncia manhosa, ouviu l� assim uma vozinha ao fundo, e pensou que se calhar estar�amos a cantar em ingl�s...p�, eu tinha imensa curiosidade, quando o Torsten [dos GIIA] esteve c�, a pergunta que lhe fiz, est�vamos a falar de Linda Martini, foi: "Como � que voc�s ouvem a nossa l�ngua?", que eu acho que aquilo deve soar a romeno ou assim...

H�lio: A russo, a russo, meu...

Andr�: I�, por causa dos "r" ou dos "s", meu, � completamente diferente...p�, e o gajo disse que era na boa, que parecia que era um bocado ex�tico e assim, p�, e eu dou sempre o exemplo: o "Cavalos de Corrida" dos UHF...chegou ao Top of The Pops, n�o foi?

Lu�s: Foi.

Andr�: Chegou para a� ao top ten, que foi uma cena que...quando eu soube disso caiu tudo ao ch�o...como? Como � que UHF alguma vez na vida 'teve no top ingl�s? � engra�ado...

H�lio: Eram outros tempos...

Andr�: Mas eu acho que acaba por acontecer um bocado isso...se pensares nisso por outro lado, �s vezes h� muitas bandas portuguesas que acham que o ingl�s abre mais portas l� fora, o que � facto � que muitas bandas dizem isso e n�o abriram portas nenhumas l� fora por causa disso. Porqu�? Porque j� h� muita coisa l� fora com um som semelhante a cantar em ingl�s, e as pessoas preferem ouvir e consumir aquilo que � na l�ngua deles a estar a ouvir um estrangeiro a cantar outra coisa na l�ngua deles. � como acontece com Madredeus e assim, aquilo para eles n�o lhes diz nada...

Cl�udia: � como a Am�lia, p�...

Andr�: ...mas l� encontram nada parecido. Tenho a certeza de que se um ingl�s ouvir a nossa cena pode ir buscar as refer�ncias todas de bandas estrangeiras em termos de som, mas em termos de l�ngua n�o deve ter ouvido nada semelhantes, porque est�o habituados a consumir m�sica na l�ngua deles. Portanto, isso, por outro prisma, at� pode ser um factor distintivo l� fora...

H�lio: Um chamariz...

Andr�: Estou muito curioso, quando a gente for l� para a Irlanda, n�o fa�o puto de ideia de como � que eles v�o receber aquilo...estou mesmo...o que for, ser�.

H�lio: Se houver uma pessoa a cantar eu vou ficar bu� contente...

Est�vamos a falar das bandas que falam em ingl�s e tal, uma cena que se costuma perguntar, nesta coisa das entrevistas, �: como � que voc�s v�m o panorama musical portugu�s, agora, hoje em dia, aquela coisa das quotas da r�dio e tal? Falem um bocado disso, fica sempre bem...

H�lio: P�, essa cena das quotas da r�dio, acho que seria desej�vel que n�o fosse obrigat�rio, n�o �? Acabou por ter que ser assim porque se calhar n�o se chegou ao que seria desej�vel de outra maneira... por livre vontade. Se calhar vai ser positivo, se calhar n�o, se calhar v�o aparecer muitas bandas m�s s� para preencher quotas, n�o sei, sinceramente.

Cl�udia: P�, que apare�am, mas tamb�m as pessoas logo escolhem o que lhes agrada e o que � que n�o agrada...

H�lio: Acho que tem um lado positivo e um lado negativo...

Andr�: Acho que o tempo acaba por filtrar as coisas.

Cl�udia: Acho que no panorama portugu�s o que � mau � aquilo em que se pega e aquilo que se deixa para tr�s. Porque bandas... acho que sempre houve. Se calhar talvez se estejam a conseguir mexer melhor agora, talvez estejam a conseguir chegar a mais s�tios agora, mas acho que bandas sempre houve, acho � que n�o h� grande interesse ou coragem por parte das editoras.

Andr�: Porque as pessoas est�o pouco habituadas...por exemplo, houve um gajo que veio falar comigo em Famalic�o e disse: "Eh p�, gostei muito do vosso som e n�o-sei-qu�, p�, e digo-te uma coisa sinceramente, n�o gosto de m�sica portuguesa." "N�o gosto de m�sica portuguesa." Em m�sica portuguesa tens coisas para todo o gosto, tens desde a m�sica de dan�a dos Santamaria at� ao gajo mais alternativo e mais frique l� em Vila-Nova do Raio-que-o-parta...

Pedro: Viseu.

Andr�: Em Viseu, p�, e um gajo dizer taxativamente "eu n�o gosto de m�sica portuguesa" �, para mim...

Cl�udia: ...est�pido.

Andr�: Mas acho que h� um bocadinho falta de...� aquela coisa, � um lugar-comum mas � verdade, h� um bocadinho aquela coisa de aquilo que se faz c� dentro � porreirinho mas l� fora h� mais coisas, a informa��o chega-nos mais depressa, hoje em dia com a internet e n�o-sei-qu� � muito mais f�cil consumir isto...por exemplo, uma banda como M�o Morta j� nem se fala, � uma banda com 20 e tal anos de carreira, t�m quase tantos anos como os Xutos, p�, se eles fossem uma banda estrangeira, p�, os gajos tinham um culto tipo Einst�rzende Neubauten ou uma porcaria assim qualquer muito fora, com montes de seguidores. Como � uma cena c� dentro, acaba por ser ali um p�blico muito restrito e n�o passa muito daquilo... p�, sei l�, tens tipo Quinteto Tati, que eu adoro, o disco saiu e ouvi aquilo montes de vezes. P�, o disco � muito bom, acho que o JP Sim�es � um g'anda letrista, um g'anda m�sico, acho que o disco 't� muito bem conseguido e aquilo at� tem um som que tu podes considerar mais ou menos mainstream, � acess�vel, se n�s passamos na r�dio, ent�o aquilo devia andar a� a rodar todos os dias. E tu falas com algu�m que esteja habituado mais ou menos s� a ouvir as coisas em termos mais comerciais e ningu�m conhece. � uma coisa que se calhar noutro pa�s poderia ter um impacto muito maior.

Pedro: P�, mas � por estarmos em Portugal, tamb�m.

H�lio: Mas isso � um s�ndrome dos portugueses em geral com tu, n�o � s� com a m�sica.

Pedro: Eh, p�, mas o meio � que � pequeno, agora se a culpa � de n�o haver pessoas como o Lu�s ou haver poucas...� verdade, nesse aspecto � verdade, porque tens um exemplo de mudan�a, n�o se v�em assim muitas editoras a pegar numa banda da qual se ouve uma promo e a apostar nele. � isso que faz o meio portugu�s ser o que �.

Cl�udia: O meio portugu�s investe naquilo que vende...

Andr�: Basta veres pelo n�mero de editoras independentes que h� c�, que s�o pouqu�ssimas, comparado com Espanha que est� ali ao lado...

Pedro: A cena �, se calhar se tu apostares tamb�m consegues fazer vender, o problema � aquele passo...

Cl�udia: Claro, claro, para qu� se podes ter uma coisa certa?

Andr�: Agora fala o S�rgio.

Cl�udia: I�, agora n�o falamos. S�rgio, �s tu que abres a boca ou ent�o...

Andr�: O S�rgio disse bu� piadas, gastou o repert�rio todo na Antena 3. O gajo 'tava sempre p�-p�-p�-p�-p�...

Podes repetir, se quiseres...

S�rgio: N�o, p�...

Cl�udia: Podes dizer aquela tua palavra preferida...

Qual � a tua palavra preferida, S�rgio?

S�rgio: Eles gozam muito comigo porque eu 'tou sempre a dizer "basicamente".

H�lio: N�o gozamos, achamos piada, que � diferente...n�o � pejorativo.

S�rgio: Basicamente, basicamente.

Voc�s estavam a falar da cena musical...v�o tocar agora - sexta ou s�bado? S�bado? - com os CAVEIRA e os Loosers, no Festival Um dia a Caixa vem Abaixo, Caixa Econ�mica Oper�ria, que s�o bandas que n�o t�m muito a ver convosco...

H�lio: Mas isso � bom e � desej�vel.

S�rgio: Eu acho que o dia mais indicado para n�s seria o primeiro...porque a n�vel sonoro e a n�vel musical ficamos bem l�...mas fico muito contente por ficar ali enfiado entre CAVEIRA e Loosers, a chamada �m�sica livre�...

H�lio: Eu prefiro, sinceramente...

S�rgio: Porque n�o tem nada a ver. CAVEIRA a traineira do noise que n�s conhecemos, free-rock e tal. E depois temos algo mais dan��vel, Gang Gang Dance ali pelos Loosers, o que � �ptimo, porque as pessoas que v�o ver aquele concerto, no s�bado, v�o apanhar ali com tr�s bandas que n�o t�m nada a ver umas com as outras...

H�lio: N�s temos muitas partes do barulho, do noise, nas m�sicas que estamos a tocar. Tu ainda n�o apanhaste porque nunca viste um concerto inteiro, se calhar...

Andr�: Se tu fores ver um concerto nosso, n�s tocamos com tr�s guitarras, todos n�s, � engra�ado, s�o tr�s guitarras e temos estilos de tocar completamente diferentes, cada um de n�s entra ali com algumas partes diferentes. N�s temos tamb�m muita componente de improvisa��o, tanto na maqueta como ao vivo, na maqueta se calhar nota-se menos, tens ali quatro m�sicas, o espa�o � sempre restritivo, � �bvio que ao vivo fazes o caga�al que quiseres, p�, eu por exemplo, no meu caso, desde a altura do punk, n�o concebo um concerto de rock, de rock mesmo energia, sem feedback, sem caga�al, gosto que haja coisas que s�o incertas, gosto de chegar ali e dar a nota ao lado� eu gosto, deste gajo se virar para o amplificador e ficar ali a fazer ru�do e a bater com a m�o nas cordas. Gosto disso, gosto desse esp�rito livre. Se � nesse sentido, livre, consigo encontrar alguns pontos em comum connosco e essas bandas. Claro que o produto final, e isso � inteiramente discut�vel, � um bocadinho diferente.

Cl�udia: E de facto as m�sicas n�o s�o livres do princ�pio ao fim.

Pedro: Eu acho que nem faz sentido haver essa diferen�a, de certa forma n�o � igual, acho que s�o bandas que se enquadram na perfei��o, eu acho.

H�lio: Acho que h� pontos em comum, mas s�o op��es.

Andr�: Um gajo vai por ali, outro gajo vai por ali. Se formos falar da pertin�ncia de estarmos no cartaz nesse dia com eles, o S�rgio estava a dizer que se calhar em termos sonoros encaix�vamos mais no primeiro dia, eu at� sou capaz de discordar dele. Acho que fazemos sentido no primeiro, no segundo, com qualquer banda que apare�a. Gosto muito de ir a um concerto e ver coisas diferentes. Por exemplo, est�vamos a falar h� pouco do OutFest [festival de m�sica � margem realizado no Barreiro em Outubro e n�o um festival gay em S�o Francisco], gosto de ru�do, gosto de noise, gosto de alguns desses projectos novos que t�m aparecer, mas sinceramente, como espectador, quando fui ao OutFest, s� fui um dia, ao dia de CAVEIRA, de Frango e de Lobster. P�, e gostei, de uns mais do que de outros, enfim, tamb�m, isso s�o op��es. Se falares com o S�rgio ou outra pessoa eles preferem uns ou outros� mas eu gosto de ver alguma heterogeneidade no cartaz. Por exemplo, se falares nisso, no OutFest, eu acho que � positivo ver uma cena assim mais alternativa, mostrar bandas desse tipo, mas eu gosto muito, e no hardcore eu sentia falta disso, que se misturem outro tipo de bandas. No hardcore chegas a um ponto em que as bandas punk que tocam, tocam sempre punk, � sempre punk, � sempre aquilo. � tudo igual. E tu vais ver um concerto, pagas 5 euros, pagas 8 euros, e �s tantas aquilo j� n�o te surpreende tanto porque os gajos que estiveram atr�s fizeram exactamente o mesmo. Se eu estiver a ver um concerto dos gajos A, que fazem barulho do in�cio ao fim, e for ver um concerto dos gajos B, que fazem barulho do in�cio ao fim, o barulho que ele fez � diferente, o feedback que ele sacou � mais agudo, mas, para mim, e l� est�, isto � uma quest�o pessoal, n�o estou a falar por eles, mas para mim � prefer�vel ver um concerto com mais heterogeneidade. D�-me gozo, sei l�, ir a um festival e ver bandas diferentes a tocar, mesmo que o som n�o tenha absolutamente coer�ncia nenhuma.

H�lio: Eu tamb�m senti isso no festival. Eu fui ao outro dia, a que tu n�o foste, e tamb�m senti isso. Mas eu j� vejo as coisas de outra maneira. Por exemplo, o S�rgio gosta mais desse tipo de coisas do que eu, eu gosto bu� de noise, mas eu acho que h� um limite. Tamb�m, �s tantas, para mim, obviamente que � para mim, toda aquela massa acaba por perder sentido. Eu vejo a m�sica com mais crescendos e decrescendos e acho que o barulho faz mais sentido se tiveres ali uma parte de barulho mesmo barulho e aquilo toca-te de outra maneira. Se tu est�s a fazer barulho, barulho, barulho durante 10 minutos, �s tantas n�o � barulho, � zumbido.

Uma banda paradigm�tica disso � Sonic Youth [mesmo que tenham muitos escapes para �barulho, barulho, barulho�].

Andr�: Por exemplo, estava-me a lembrar disso. Um gajo ouve o disco, tu metes o Sonic Nurse a tocar, bu� softzinho no in�cio, Kim Gordon a cantar, muito fixe, chegas a meio da m�sica e aquilo � um caga�al do caralho, podia ser uma malha de CAVEIRA. �t�s a ver? Eu curto muito mais isso, porque quando entra tem um impacto do caralho, porque um gajo v� aquilo�

H�lio: Mas isso s�o gostos pessoais, por exemplo, o S�rgio gosta mesmo de barulho, barulho, barulho. Eu gosto que haja mais variedade dentro de cada m�sica.

Andr�: Mas se calhar � por causa disso, j� viste que n�s temos opini�es diferentes em rela��o isso, se calhar � por isso que o nosso som final acaba por se calhar tocar nalguns desses elementos mas n�o ir tanto por a�, porque se calhar n�s damos uma din�mica diferente. P�, se calhar metemos ali mais uns elementos de estrutura, porque n�s ouvimos coisas de ru�do, sim, tudo bem, mas h� uma coisa que � preciso perceber, � que n�s n�o come��mos a ouvir m�sica agora. E n�o somos s� influenciados ou pelas bandas do noise ou pelas bandas do p�s-rock, eh p�, eu quando era puto e tinha 14 ou 15 anos n�o ouvia coisas s�, s� noise, podia ouvir coisas mais barulhentas mas ouvia tamb�m coisas de can��o. E obviamente que isso influencia.

Pedro: E ouv�amos Metallica.

Andr�: P�, e isso acaba tamb�m por definir um bocadinho a tua personalidade a tocar. � uma quest�o de direc��o. Mas n�o me chocava nada, e at� gostava de ter um projecto ou uma experi�ncia qualquer que fosse mesmo noise puro e duro e experimenta��o ali, porque � um gozo do cara�as. E quem toca sabe isso, tu �t�s em frente a um amplificador e est�s ali sacar malhas mesmo estares ali a tentar apanhar cenas ao acaso e ru�dos�

Tens de estar de joelhos. � obrigat�rio.

Andr�: De joelhos.

Cl�udia: Conv�m, conv�m, porque os dedos dos p�s�

H�lio: Ainda n�o desenvolvemos os dedos dos p�s o suficiente para manipular os pedais, porque eu n�o estou a ver outra maneira de manipular os pedais sem estar de joelhos, s� se estivermos de c�coras, que � uma posi��o n�o muito agrad�vel.

Cl�udia: Ficas de cu para o ar�

Andr�: Eu, pessoalmente, nos concertos aproveito para conhecer um bocadinho melhor os pedais, p�, h� pedais pelos quais dei dinheiro e um gajo ensaia tipo duas vezes por m�s ou assim�

Cl�udia: Eh, at� parece�

Andr�: N�o, agora estamos a ensaiar mais...eh p�, e �s vezes h� coisas que me surpreendem, estou ali no concerto e mexo naquele bot�o e penso que aquilo � bu� giro e fico ali meia hora. P�, e isso � uma coisa que quem come�a em bandas punk... h� pouco est�vamos a falar do punk, quem come�a em bandas punk, n�s quando toc�vamos em bandas punk... eu n�o tinha um pedal, ali�s, toda a gente tinha um pedal na altura que era a distor��o, aquilo nem havia canal limpo, um gajo ia tocar ao Ritz e os t�cnicos de som eram sempre, �Som da distor��o�, e um gajo fazia e depois era, �Som limpo�, e um gajo �N�o temos.� Era s� ligar e �dshhhh�, e depois era aquela distor��o que era �zzzzzzzzzzzzz� do in�cio ao fim, era mesmo�

H�lio: Era s� zumbido.

Andr�: E depois chega uma altura em que um gajo come�a a ouvir outras merdas, novos barulhos, e eh p�, espera l�, como � que o gajo faz isto? Eh, pedais e o caralho, e come�as a procurar e a descobrir pedais e a ver que cada um faz isto e aquilo� quando descobrimos os delays, ent�o� �� giro, carregas aqui e o gajo faz isto�, pronto, foi um descalabro.

H�lio: Eu tamb�m tenho de ver se come�o a tocar de p�, um dia destes, �t� muito na moda, tamb�m, um baterista a tocar sentado � um bocado demasiado na moda.

Cl�udia: Olha que ainda te confundem com Bunnyranch�

Andr�: Olha que se tu fores ver um ensaio nosso, n�s temos muitos ensaios muito free mesmo, mas bota free naquilo, porque se a um lhe apetece entrar ali a mexer num pedal novo, �t� tudo fodido, �t� tudo lixado, mesmo.

Voc�s v�o lan�ar o disco agora em Fevereiro?

H�lio: O EP�

O EP em Fevereiro?

Cl�udia: �.

E o disco � quando?

S�rgio: Em Abril, em princ�pio est� programado para o final de Abril.

E como � que vai ser o disco?

S�rgio: O �lbum dos Linda Martini vai ser uma continua��o do som que n�s temos feito at� agora, claro que agora continuamos a seguir em frente e sempre a procurar novos tipos de som e de ru�do e de m�sicas e de acordes, mas � o continuar da promo, da maqueta, do EP que vem a�.

H�lio: Continua meio instrumental, meio cantado.

S�rgio: N�o h� mudan�as radicais no �lbum. � simplesmente um continuar do nosso trabalho.

Andr�: Ali�s, das m�sicas que vamos ter no �lbum, algumas delas surgiram at� antes daquelas que foram gravadas na maqueta e depois � que peg�mos na ideia delas mais tarde, outras s�o mais ou menos contempor�neas dessas m�sicas, mas na altura nem sab�amos se aquilo ia sair em �lbum, se ia sair uma maqueta, seja o que fosse. Por isso n�o houve nenhuma restri��o da nossa parte em dizer �isto vai para o �lbum, isto vai para o �lbum porque tem refr�o�, ou �esta n�o vai para o �lbum porque tem mais barulho� ou isto ou aquilo. P�, foi no fundo� � quase um apurar do som.

Pedro: Estamos a materializar agora no �lbum aquilo que fizemos na promo, no fundo � o seguimento positivo da coisa. Grav�mos a promo, gostaram, o pessoal aceitou e apoiou, agora estamos a gravar um �lbum, mas � a continua��o.

Andr�: N�o sei se j� assististe a alguma grava��o�

J�.

Andr�: Por exemplo, podes fazer v�rias coisas, podes gravar em take directo e toda a gente junta ou podes gravar em separado. N�s, por exemplo, as guitarras, estamos a gravar em separado. J� h� gravada a base de bateria e baixo, e depois cada um entra com a nossa cena. Nas grava��es, eu gravava uma guitarra e n�o estava a ouvir as cenas deles, por isso se me apetecesse fazer uma merda eu fazia, o Geraldes [Pedro] se lhe apetecesse fazer uma cena tamb�m fazia, tamb�m n�o estava a ouvir a minha, eu disse, p�, �fiz isto, fiz aquilo�, e depois ele foi l� p�r o elemento dele, o S�rgio a seguir foi p�r a guitarra dele e foi fazer outra merda diferente. N�s pr�prios estamos aqui a falar contigo, muitas coisas j� est�o gravadas, n�s n�o sabemos como � que aquilo vai. Aquele bolo tem l� os ingredientes todos mas n�o sabemos como � que vai sair.

Pedro: Eu sinceramente acho que vai ficar menos limado do que a promo.

Cl�udia: At� porque n�s nos vamos esfor�ar para que isso aconte�a, n�o �?

Pedro: Mas mesmo sem ser em termos de produ��o, mesmo em termos do que est� tocado acho que vai estar muito menos limado�

H�lio: Sim, o baixo tem distor��o�

Pedro: �na promo est� tudo muito certinho, at� era um bocado contradit�rio com o nosso estilo de m�sica, porque n�s somos, acho que somos, acho que sim, queremos ser uma banda experimental e ao vivo somos, e depois a promo estava um bocado cert�ssima, n�o sei, acho que as coisas v�o estar certas � mesma mas de outra forma, acho que vai melhorar assim.

H�lio: N�o �t� t�o linear, acho eu.

Andr�: At� porque quando gravas uma coisa, no final apontas sempre: �Fazia isto de maneira diferente�; �Se voltasse atr�s n�o fazia isto assim�� uma das coisas que ach�mos todos quando a maqueta saiu, p�, gost�mos do som, o som para maqueta est� porreiro, fizemos a coisa caseira, quem nos gravou � um amigo nosso, grav�mos no est�dio onde n�s ensaiamos, isso tamb�m nos diz muito, porque n�o � o mesmo que querermos gravar um disco e chamarmos um produtor muito cromo, ou irmos para um est�dio pagar n�o-sei-quanto. N�o, fizemos a cena onde n�s ensaiamos, com pessoal amigo. P�, e quando acab�mos de gravar a maqueta, das coisas que ficaram que querer�amos mudar era de facto isso, era o som, o produto final, em termos de masteriza��o e mistura n�o estar t�o limado. Se calhar algumas coisas vamos tentar acertar, porque nos fugiu um bocadinho, � normal, depois as coisas seguem um rumo, e � uma das coisas que vamos tentar acertar e p�r mais como estamos ao vivo. � um bocadinho dif�cil porque s�o experi�ncias diferentes, mas queremos ao m�ximo tentar exportar um bocadinho aquilo que fazemos ao vivo para o disco.

Pedro: Mas estamos a falar um bocado do nada, porque n�o sabemos ainda como a coisa vai ficar.

H�lio: Est� quase tudo gravado, mas�

Pedro: Sim, �t� quase tudo gravado mas ainda n�o ouvimos tudo junto.

H�lio: Falta a mistura. Acho que o Fernando [produtor] estava a editar as pistas e a limp�-las.

Andr�: Falei com o gajo a semana passada e ele �tava a editar, sim.

H�lio: � o Fernando Matias, � o vocalista de [F.E.V.E.R.].

Andr�: E de Bloody Television, mete l� isso que ele vai gostar. � o novo projecto dele.

H�lio: Foi ele que gravou a promo, tamb�m.

[segue-se conversa sobre nomes, que descamba, de alguma forma, em Manuel Jo�o Vieira e em fatos-de-treino]

Andr�: Essa � a diferen�a entre o pessoal de Lisboa e do Porto, meu, a cena do fato-de-treino.

P�, tu est�s aqui, isto � a catedral do fato-de-treino.


Andr�: Voc�s j� reparam que se tu fores ao Porto, mesmo centro do Porto, o pessoal ao fim-de-semana, os cotas, o pessoal mais velho, veste-se de fato, n�o v�o trabalhar, � mesmo assim, vestem-se com fato de fim-de-semana.

Pedro: � pessoal mais chique.

Andr�: E em Lisboa, p�, o pessoal � todo do fato-de-treino. Eu acho que aquilo � uma coisa cultural.

H�lio: Eles tamb�m t�m mais dinheiro, p�, no norte...n�o sei se passa por a� ou n�o�

Cl�udia: Tirando aquele pessoal que vai meter pr� veia nas portas de toda a gente�

H�lio: Sim, essa parte j�

Mas isso tamb�m acontece c�

Cl�udia: Sim, mas c� nunca vi, e l� j�

Andr�: Vamos falar sobre o Porto, o Porto � muito fixe.

Se quiserem falar sobre o Porto�

Cl�udia: Eu n�o conhe�o bem o Porto para falar sobre o Porto�

H�lio: Conhe�o o p�blico do Porto e agrada-me bastante. Acho dos melhores concertos que dei com qualquer uma das bandas que tenho foi no Porto.

Andr�: P�, a minha m�e � do Porto e saiu de l� muito nova, portanto, a minha fam�lia toda veio para c� do Porto e eu nunca conheci aquilo como deve ser. E agora, por causa dos concertos e em trabalho tamb�m tive de ir l� umas vezes, adorei, adorei a cidade. � completamente diferente de Lisboa, � mais escura, mais cinzenta, mas eu, p�, adoro aquilo. Tamb�m pela cena banda, somos sempre muito bem recebidos quando vamos l�, e aquilo tamb�m tem um carinho especial porque o primeiro concerto que demos foi l�. Era para ter sido na tua faculdade [a FLUL], era um concerto tamb�m com Vicious Five, acho que era antes do Ver�o.

H�lio: Mas depois foi adiado.

Andr�: I�, foi adiado para a altura em que aconteceu esse.

Cl�udia: Ou que n�o aconteceu�

Andr�: E logo no dia a seguir, no fim-de-semana a seguir, �amos ao Porto tocar no Hard Club. Como esse n�o aconteceu, o nosso primeiro concerto acabou por ser no Hard Club. Eh p�, e foi do cara�as. E um gajo tocar fora ser a primeira experi�ncia�

Cl�udia: E foi muito bom�

Andr�: Com aqueles nervos iniciais, porque nunca sabes o que � que vai sair dali, a coisa pode n�o soar bem�

H�lio: No Hard Club fomos bem recebidos.

Pedro: Pelo pessoal do Hard Club n�o.

Cl�udia: O pessoal do Hard Club� mesmo manhosos� sacanas, meu, nem um c�ntimo.

Andr�: Para o pessoal da banda nem sequer davam senhas para beber, v� l�. Nem sequer isso.

Cl�udia: Nem sequer tivemos direito a convidados, p�, porque cheg�mos depois da hora. Nem sequer tiveram a dec�ncia de nos mandar um e-mail a perguntar o nome das pessoas que quer�amos levar l�. Tivemos amigos que fizeram a viagem de c� para l� e tiveram de pagar a porcaria da entrada.

H�lio: Aquilo tamb�m foi um bocado falta de comunica��o entre o promotor e a sala.

Cl�udia: Falta de comunica��o conveniente, diga-se de passagem�

H�lio: Mas a sala tamb�m n�o foi muito compreensiva�

Andr�: Eles t�m s�tios do cara�as, os gajos t�m salas do cara�as. Quem nos dera aqui ter salas dessas�

H�lio: N�s temos duas salas boas, para mim, c�. Temos o Santiago [Alquimista] e temos a ZDB, que eu gosto da ZDB tamb�m. H� quem n�o goste mas eu gosto.

Cl�udia: Temos o Mercado, o Mercado � fixe, meu, eu acho o s�tio muito fixe, o som � que n�o � grande coisa�

Andr�: O Santiago� n�o podes fazer tudo l�. � uma cena grande, � tamb�m naquela perspectiva de bar� enquanto no Porto tens s�tios mais pequenos, tens s�tios maiores, para outro tipo de coisas� p�, e tens muito mais facilidade�

H�lio: Tens mais s�tios mais acess�veis�

S�rgio: P�, eu relativamente a esta conversa agora dos espa�os� o Santiago � um �ptimo espa�o, o Mercado tamb�m � um bom espa�o, a ZDB� n�o� � um buraco que est� ali�

Cl�udia: A ZDB � fixe porque tem vidros, � a cena que eu acho�

S�rgio: �e ganhou um g�randa nome em termos de bandas e agora tem um g�randa culto.

H�lio: N�o concordo. Tens ido l� ultimamente?

S�rgio: � um s�tio bom, � um s�tio engra�ado� mas eu n�o vejo aquilo como uma grande sala, � um buraco que est� ali�

H�lio: Eu n�o disse uma �grande sala�� eu disse uma boa sala, para mim � uma boa sala de concertos�

S�rgio: Para mim uma boa sala � o Santiago Alquimista�

Andr�: Se fores ao CBGB�s ficas desiludido, que aquilo também é um buraco…as cenas não são só o sítio físico, também são o que se faz à volta daquilo. Por exemplo, se a ZDB está a ter a exposição que tem é pela programação… pelas bandas que vão lá e pelo circuito que se cria.

Sérgio: Não, mas eu estou a comparar em termos de sala para tocar… se formos falar em termos míticos…

Pedro: Uma boa sala? A Kasa Okupada da Praça de Espanha era uma boa sala?

Cláudia: Eww… aquele colchão pulguento…

Pedro: Mas era um meio, ‘tás a ver? Pelo que acontecia lá…

André: Chegaste a ir à Kasa Okupada da Praça de Espanha?

Não, mas ouvi muitas histórias…


André: Aquilo era uma garagem, um gajo tocava numa garagem…aquilo cheirava a cagalhões de cão.

Cláudia: A electricidade sacada da rua…

André: Tinhas colchões atrás de ti…o palco era para aí do tamanho desta mesa…

Cláudia: E As Good As Dead ali em cima, meu?

André: Tu batias no tecto, pá, um gajo mais alto apanhava com cada carolada ali…

Cláudia: Eu não.

Hélio: O primeiro passo a tomar quando chegávamos lá era varrer os cagalhões dos cães.

Pedro: E as seringas…

Sérgio: É verdade, e tirar as seringas…

Hélio: E depois havia t-shirts straight edge penduradas ao lado de punks a chutarem prá veia. Também era lindo, meu. Era muito boa, a Kasa Okupada.

André: Kasa Okupada, electricidade roubada à Câmara.

Sérgio: E o colchão de pulgas atrás do baterista, a tapar uma entrada…

Cláudia: Iá, esse colchão era medonho.

Sérgio: Um gajo tocava e coçava, e não tinha espaço, mandavas um encontrão caía-te tudo em cima.

Cláudia: Geraldes [Pedro], pá, tu tocaste lá? Com quem?

Pedro: Shuffled, com Albert Fish.

André: E depois comias refeições vegetarianas com os talheres dos punks que não estavam desinfectados, que experiência alucinante. Arriscámos bué a vida ali.

Hélio: Foram bons tempos, mas eu curti à brava naquela sala… naquele quarto… naquela cena…

Cláudia: Naquela coisa, naquilo…

Hélio: Muito bom, muito bom. Ainda hoje vi uma foto de As Good as Dead que me mandaram lá na Kasa Okupada. Sala toda podre…

Cláudia: Quando? ‘tava eu a tocar?

Hélio: Era podre, mas era agradável.

Com que bandas é que vocês tocaram lá?


Hélio: As Good as Dead, minha e da Cláudia, o Geraldes foi lá com Shuffled, e eu, o Sérgio e o André fomos lá com Shoal, que foi a banda que deu origem a Linda Martini, fizemos o projecto paralelo ainda com o baixista de Shoal…

André: Que agora ‘tá em Day of the Dead…

Hélio: Depois ele saiu… em As Good as Dead ‘tava também o Edgar de Vicious Five e pronto.

André: Aliás, no último concerto de Shoal chegámos a tocar o “Efémera”.

Cláudia: Era o “Efémera”? Não era o “Este Mar”?

Sérgio: Era o “Efémera”.

André: Tocámos um excerto do “Efémera”.

Hélio: A ideia na altura era, onde uma banda acabasse a outra começava. Então era para irmos dando um cheirinho já do que vinha a seguir. Depois a coisa acabou por se arrastar e arrastar e demorámos muito tempo. Depois o Geraldes e a Cláudia fizeram Erasmus em Barcelona no mesmo ano em alturas diferentes, e isso atrasou bastante o primeiro concerto, e por isso as coisas acabaram por demorar uma série de tempo. As coisas agora parecem estar a acontecer muito rápido…

Pedro: As coisas parecem estar a acontecer bué rápido, mas nós já estivemos bué tempo antes… mesmo sem falar no resto das bandas, mesmo nós juntos já andávamos um bocado fartos de tocar sem dar concertos…

Cláudia: E depois também a cena de não termos o nome logo definido também atrasou um bocado a cena, não queríamos avançar com um nome do qual não tivéssemos bem a certeza para não queimar logo tudo…

Luís: E em 6 meses…

Hélio: E em 6 meses aconteceu isto que está a acontecer…

Chegaram a uma mesa no Vasco da Gama… Como é que vocês vêem a recepção…

Hélio: Do público?

Não, porque eu não liguei quase nada às perguntas que eu tinha aqui… para aí a primeira que eu tinha aqui era: como é que vocês reagem, sei lá, à aposta que muita gente fez em vocês como uma das grandes esperanças para 2006 do rock português?

Hélio: Para já com um obrigado e depois sabe bastante bem, como é óbvio, pronto, temos o Y, que achou que seríamos uma das bandas mais promissoras para este ano, ficámos muito contentes, como é óbvio…

Cláudia: Temos o Henrique Amaro…

Hélio: O Henrique Amaro também tem dado um apoio bastante grande e, claro, mais pessoas dentro da Antena 3, claro. O Luís da Naked, e a Joana têm dado bastante apoio, deram desde o início, aliás, isto tudo não estaria a acontecer – pelo menos desta forma – se não fossem eles os dois, o público tem-nos dado bastante apoio também, mas acho que temos recebido as coisas com o peito aberto, com bastante carinho e sabe bem, as pessoas estarem a dar algo delas para nos ajudar.

André: Pá, e a cena é boa – e eu não me canso de referir isso - é um gajo ver que aquelas pessoas que falam não estão a fazê-lo por favor, percebes? Nós não pagámos a ninguém nem temos connections ao mais alto nível…pá, as coisas chegaram-lhes e eles gostaram, e se apostaram é porque gostaram mesmo, e isso deixa-nos contentes.

Cláudia: E é fixe porque vão passando palavra uns aos outros…

André: Há bocado eu estava a dizer que éramos todos um bocado calões e preguiçosos, eh pá, e somos, às vezes isso até acaba por ser retroactivo e puxar-nos também para a frente. Às vezes estás a fazer as coisas porque gostas e te dá gozo. E o facto de saberes também que as pessoas estão ali com expectativas para ouvir a música que fazes também te motiva para investires naquilo e dares um bocado de ti, é muito bom. Eu falo por mim, mas em termos de banda as nossas aspirações são sempre um bocado relativas, no meu caso gosto mesmo de fazer música e do tipo de música que estamos a fazer e do caminho que estamos a seguir. E mais uma vez pegando no exemplo dos Mão Morta, se eu me quisesse identificar com alguma banda, eu gostava de chegar, sei lá, aos 30 ou aos 40 e ter uma banda assim do género. Eles sempre fizeram a cena deles, não fizeram cedências de nenhum tipo, sempre fizeram o som de que eles gostaram, e o resto veio por acréscimo. Pá os gajos fizeram o álbum Mutantes S:21, com o “Budapeste”, que teve um boom do caraças porque aquilo era mais catchy ou era mais acessível, o pessoal comprou por causa daquilo mas depois esquece. Aliás, já ouvi o Adolfo [Luxúria Canibal] que a ideia deles foi mesmo essa, “OK, tivemos estes gajos todos, agora vamos cortar isto e o próximo álbum vai ser mesmo duro, então as pessoas que têm o álbum em casa já não vão comprar o próximo, só mesmo aquelas que gostam mesmo de paixão”, e isso é uma coisa com que me identifico muito. Pá, o facto de não fazer música por necessidade ou por ter de viver da música, mas fazer a música porque dá gozo… é uma actividade paralela, é como chegares a casa e fazeres um desenho ou escreveres uma coisa qualquer, pá, é uma coisa que sai de ti, não tem nenhum objectivo social ou o que seja. Claro que se vender, eh pá, qualquer músico é hipócrita se disser que não gosta que as pessoas recebam bem a sua música, qualquer banda, por mais independente que seja, gosta de dar um concerto em que estejam lá pessoas que ouçam, não é? Senão ‘tava toda a gente fechada a tocar no quarto… pela música fechados em si. Claro que no processo de construção estás lá sozinho, não está lá ninguém, por muito que imagines a reacção das pessoas é muito relativa, porque ela está a sair naquele momento. Pá, mas depois é muito bom tu sentires o feedback das pessoas…

Hélio: Sim, mas tu estavas a dizer por exemplo que se calhar não gostavas de viver só da música. Eu, por exemplo, gostava, sinceramente. Gostava de poder fazer outras coisas…

Pedro: Utopicamente...

Hélio: Porque eu vejo as coisas de outra maneira. Se tu só viveres da música, por outro lado, tu tens muito mais tempo para criar. Porque tens, meu, e no final acabas por chegar…

André: E depois há as cedências que essas bandas depois têm de fazer…

Pedro: …depois já não fazes tanto pelo prazer, mas fazes porque tens de sustentar, e logo aí já estás a mudar mesmo só dentro ti. Uma coisa é tu chegares ali e foderes aquilo tudo mas estares-te a cagar…

André: “Eu não preciso disto para pagar a renda…”

Pedro: Outra coisa é sentires que vais ter de fazer alguma coisa…claro que se isso sair sempre naturalmente…

Hélio: Se tu não tiveres de fazer cedências e puderes viver disso, pá, é o ideal…

Cláudia: Mas isso parece-me um bocado difícil demais…

Hélio: Cá é difícil…

André: No nosso mercado, acho que é muito difícil teres uma carreira assim duradoura… sei lá, ‘tares sempre na boca das pessoas sem fazeres algumas cedências… eu acho, é a minha opinião pessoal. Chega a um determinado momento em que sabes que as pessoas estão à espera de algo de ti, se calhar se fizeres outras coisas vendes menos discos…

Hélio: Pode haver uma primeira vez, também…

André: Acho que quando um gajo começa a entrar aí, por mais independente que o gajo seja começa a reflectir que se calhar é melhor usar menos ruído ou não ligar o pedal em certas partes…

Hélio: Claro que quando eu falo em viver da música é sem fazer essas cedências…

André: Claro que eu também gostava, toda a gente gostava… se me disseram que estou à vontade, que estou desafogado e que vivo só daquilo que gosto de fazer… é a coisa que me dá mais prazer. Quando vou trabalhar não vou tão motivado como quando vou ter um ensaio convosco ou um concerto… dá-me aquela pica por dentro… quando acordo para o trabalho penso: “Foda-se, são 7 e meia, ou são 6, tenho que me levantar.” Pá, é completamente diferente… mas também acho que é importante teres esse escape, teres o teu trabalho, fazeres aquilo e teres o escape. Não centrares a tua vida toda, porque nós não somos só os Linda Martini, ‘tás a ver? Isto é aquilo que nos junta aqui nesta mesa, mas se não fosse isso podíamos estar noutro sítio qualquer…

Cláudia: Por acaso isso anda-me a chatear um bocado, porque a banda está a invadir aquilo que deveria ser a outra parte da minha vida.

André: A sério? Eu não sinto isso…

Cláudia: Eu às vezes estou a sentir um pouco, isso chateia-me. Eu gosto de ser uma pessoa independentemente disso.

Pedro: Não, mas tu tens a possibilidade de mudar.

André: Só não és uma pessoa independentemente disso para quem não te conhece… quem te conhece como membro dos Linda Martini, quem te vê numa revista ou noutro sítio qualquer…

Pedro: Na TV Guia

Na Caras

André: …vai pensar em ti como… perdes um bocadinho a individualidade, mas quem te conhece… eu estou com os meus amigos, eles sabem lá o que é Linda Martini, alguns deles nunca ouviram aquilo na vida deles nem tenho necessidade de lhes dizer, percebes? É uma coisa que eu faço à parte. Tenho amigos meus, pá, de longa data, que sabem que tenho uma banda, que ouviram uma malha ou outra, iá, é fixe, mas eu quando estou com eles quase nunca falo da minha banda. Ou quando falo é por eles perguntarem… por isso a nossa vida não gira à volta da banda. Se calhar agora estamos a perder um bocadinho mais tempo, por causa da exposição, mas a nossa vida não se esgota aí, nem de perto nem de longe.

Pedro: Felizmente, também…é bom ter outras cenas…

Cláudia: Então não é? Ter opções é o melhor…

Pedro: Por isso também essa conversa de um gajo viver só da música faz com que o teu pensamento tenha que estar muito mais aí…

Hélio: Mas não é isso… por exemplo, tu tens vontade de trabalhar no que estás a tirar? Eu estou a acabar Engenharia e não tenho vontade nenhuma, neste momento, de trabalhar em Engenharia, tenho muito mais vontade de fazer música.

Pedro: Mas eu não vejo a minha vida só como um profissional do curso que estou a tirar, e como um Linda Martini. Não, caralho, um gajo tem bué portas abertas, ou pelo menos tem muitas por abrir.

Hélio: O ideal é dares explicações e tocares nas horas vagas…

Cláudia: Eu é que não dava explicações de livre vontade…

Vá, acabo já com isto, só mais uma pergunta, que acho que fica bem, qual foi o último disco que cada um de vocês comprou?

Pedro: Comprou? E se sacou? Ou assim?

OK, roubaram ou espancaram uma velhinha para comprar…

Hélio: O disco que eu tenho estado a ouvir mais e que é recente é Minus The Bear, o Menos El Oso, que é uma banda americana com o guitarrista que tocava em Botch também, mas já não tem nada a ver… é uma cena completamente sem distorção, é a última cena que tenho estado a ouvir.

Cláudia: A última cena que eu arranjei foi mesmo These Arms are Snakes, entretanto parei um bocado, fiquei-me por aí.

Sérgio: A última coisa que estou a ouvir incessantemente são os Puppille, que são espanhóis e têm um álbum excelente chamado Himnos Olímpicos. Não sei porquê, há três dias atrás peguei num álbum que não ouvia há dois anos ou há ano e meio e estou a ouvir que é uma coisa… que é o White Pony dos Deftones… não sei porquê, estou a ouvir aquilo, continuo maravilhado.

André: Foi muito recente, fui ontem à FNAC e levei-me aqui pelo hype do Sérgio, o gajo ‘tava sempre a falar de The National, nós estivemos em Paredes de Coura e por estupidez perdemos o concerto, ‘távamos aí a comer farturas ou qualquer merda, pá, e na altura…

Luís: Estávamos a jazzar na relva…

André: ...não liguei muito, e depois ouvi o single deles, ontem ‘tava na FNAC, comprei aquilo, ‘távamos agora a ouvir no carro. Foi a última cena que comprei.

Pedro: O último CD de mp3 que eu gravei… tem Aretha Franklin, tem Beck, tem Beastie Boys, tem Calexico, tem Isis…

André: Pá, e ando a ouvir bué Cat Power, o You Are Free

Cláudia: Ena pá, o meu CD mais novo é o de If Lucy Fell, foi o último…

André: …muito bom, grande disco, grande disco mesmo, gostas de Cat Power?

Sim.

André: Já ouviste o novo?

O novo não é assim muito bom…

André: Mas tem tido boas reviews, ou não?

Eu gosto mais ou menos do novo mas não tanto quanto do You Are Free


André: Mas é na mesma onda… ou é mais acústico?

Aquilo é com os tipos que gravavam com o Al Green e o caraças… aquilo é mais country com um bocado de soul

André: E ando a ouvir M.I.A., mas isso foi sacado, arranjaram-me…

Rodrigo Nogueira
rodrigo.nogueira@bodyspace.net
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