ENTREVISTAS
Moullinex
Para dançar mas não só
· 22 Nov 2012 · 00:47 ·
© Nian Canard
Foram vários e distintos os cargos que tens vindo a assumir na música electrónica. O que te traz a este mundo e, particularmente, a este género?
Primeiro atraiu-me a música electrónica em geral pelo aspecto DIY - ser acessível e ser possível, seres tu a fazer tudo - e depois a música de dança numa altura em que finalmente a compreendi. A Discotexas surgiu depois, ingenuamente, de uma vontade conjunta de pôr a música de amigos cá fora, debaixo do mesmo "chapéu".
Foi relativamente curto o tempo entre o teu primeiro trabalho como Moullinex e a remistura de artistas como Sebastien Tellier, Two Door Cinema Club ou Cut Copy. Como surgem estas oportunidades?
Duas palavras: MySpace e Blogs. Naquela altura a dita "indústria" estava perdida, já que o MySpace tinha abalado os alicerces da mesma, os intermediários tinham de repente desaparecido, os artistas chegavam directa e globalmente aos potenciais fãs - os blogs faziam uma recolha activa, uma quase curadoria de coisas novas e os A&R's das editoras estavam bem atentos a um par destes blogs. A minha música foi partilhada nestes blogs e os primeiros interesses para gigs e remisturas surgiram directamente daí. A realidade hoje em dia é infelizmente diferente,. Acho que o Facebook promove a passividade e conferiu de novo um tom "institucional" às banda, o que torna as coisas mais difíceis para quem está a começar.
Assinaste pela Gomma Records em 2009. Desde então quais foram as principais vantagens que tens vindo a sentir ao fazer parte de uma editora alargada?
Respeito muito a Gomma por conservar o edge depois de mais de 10 anos de existência. Acho que qualquer editor, Discotexas incluída, tem muito a aprender com uma editora independente que tem alcance global mas que se sente "de família".
Mudaste-te para Munique. Quais foram as principais diferenças que sentiste a nível de produção musical e de receptividade?
Sinceramente poucas. Digamos que o facto de ter vivido na Europa central me permitiu ver mais concertos com mais frequência e, de certo, beneficiei do facto de ter muita gente à minha volta que estava ocupada a fazer trabalho criativo sem necessariamente passar (muita) fome. Essa infra-estrutura faz falta: a capacidade de correr riscos permite que surjam coisas novas e interessantes que inevitavelmente estimulam outros a correr riscos e a criar a sua própria marca.
O minimal e o techno são sub-géneros soberanos na electrónica alemã. De alguma forma nadas contra a corrente ou chegam a influenciar-se mutuamente?
Não creio estar inserido na corrente. Se fores a Berlim hoje só ouves Deep House, como só ouvirias Minimal há 4 anos atrás. Disco? Nunca chegou a acontecer… Procuro absorver o que é interessante mas não me preocupa em demasia estar inserido nesse circuito.
Desde sempre sentiste essa vontade de internacionalização?
Estaria a mentir se dissesse que não. Comecei a mostrar as minhas coisas online e a noção de "território" não existiu de início, o que, pessoalmente, foi bom. Fico profundamente feliz de saber que, algures no outro lado do mundo, alguém pode esboçar um sorriso a ouvir uma linha de baixo minha. Quiçá até se levantar da cadeira e dar um pézinho de dança.
Compôr e tocar com amigos é sempre uma experiência diferente. O que ressalvas da junção dos artistas da Discotexas como banda? Quais foram as principais dificuldades?
Acho que a melhor parte é que sem a banda seríamos todos eremitas de cavernas escuras (também conhecidas por estúdios). A possibilidade de partilharmos um palco a tocar as nossas próprias coisas é um privilégio enorme. Claro que há dificuldades… Se calhar aquela guitarra naquela malha demorou 230459823 takes a fazer e agora tem que ser tocada sem falhas num só, em palco. Esse desafio, e vencê-lo, é a força motriz.
A música electrónica não está enraizada na cultura portuguesa e é muitas vezes mencionada de forma pejorativa. Como vês a indústria e público portugueses?
Qual indústria!? Acho que esses estigmas tendem a desaparecer, Tal como globalmente já não há fronteiras claras entre pop, electronica e indie, essa noção heterogénea acaba por chegar cá e fazer-nos igualmente bem. A música feita em Portugal está cada vez melhor e, pela primeira vez desde que me lembro, não tem complexos de inferioridade.
Flora é o teu primeiro álbum. É o culminar de toda a tua experiência até aqui? Em quê que diverge essencialmente dos outros trabalhos?
É, mas não é uma "retrospectiva". É mais diverso, creio, porque não existe uma necessidade imediata de ser "para a pista". Mas tentei que tivesse um fio condutor - que seja Moullinex e que idealmente abra portas para o que Moullinex pode ser a seguir.
A tua sonoridade é inevitavelmente dançável. Nas actuações ao vivo sentes que há algo que acresce à tua música?
Gosto de pensar ao contrário. Apesar de ser feita para dançar e para ser consumida em grupo, também procuro dar-lhe um cariz pessoal - ser detalhista, conferir-lhe várias camadas - para que possa ser consumida intimamente. Esse é o objectivo, pelo menos.
Tocaste num festival sueco 'lado-a-lado' com The Cure, M83 ou Justice. O que mais podes esperar da tua carreira neste momento?
Nesta altura, tocar como DJ ou ao vivo ocupa-me os fins de semana até bem dentro de 2013. Ter acabado o álbum permite-me ocupar o resto do tempo a fazer música nova, seja para mim ou para outros, o que é, de certo, a minha actividade favorita. Isto e preparar os singles e vídeos seguintes do Flora.
Alexandra João MartinsPrimeiro atraiu-me a música electrónica em geral pelo aspecto DIY - ser acessível e ser possível, seres tu a fazer tudo - e depois a música de dança numa altura em que finalmente a compreendi. A Discotexas surgiu depois, ingenuamente, de uma vontade conjunta de pôr a música de amigos cá fora, debaixo do mesmo "chapéu".
Foi relativamente curto o tempo entre o teu primeiro trabalho como Moullinex e a remistura de artistas como Sebastien Tellier, Two Door Cinema Club ou Cut Copy. Como surgem estas oportunidades?
Duas palavras: MySpace e Blogs. Naquela altura a dita "indústria" estava perdida, já que o MySpace tinha abalado os alicerces da mesma, os intermediários tinham de repente desaparecido, os artistas chegavam directa e globalmente aos potenciais fãs - os blogs faziam uma recolha activa, uma quase curadoria de coisas novas e os A&R's das editoras estavam bem atentos a um par destes blogs. A minha música foi partilhada nestes blogs e os primeiros interesses para gigs e remisturas surgiram directamente daí. A realidade hoje em dia é infelizmente diferente,. Acho que o Facebook promove a passividade e conferiu de novo um tom "institucional" às banda, o que torna as coisas mais difíceis para quem está a começar.
© Nian Canard
Assinaste pela Gomma Records em 2009. Desde então quais foram as principais vantagens que tens vindo a sentir ao fazer parte de uma editora alargada?
Respeito muito a Gomma por conservar o edge depois de mais de 10 anos de existência. Acho que qualquer editor, Discotexas incluída, tem muito a aprender com uma editora independente que tem alcance global mas que se sente "de família".
Mudaste-te para Munique. Quais foram as principais diferenças que sentiste a nível de produção musical e de receptividade?
Sinceramente poucas. Digamos que o facto de ter vivido na Europa central me permitiu ver mais concertos com mais frequência e, de certo, beneficiei do facto de ter muita gente à minha volta que estava ocupada a fazer trabalho criativo sem necessariamente passar (muita) fome. Essa infra-estrutura faz falta: a capacidade de correr riscos permite que surjam coisas novas e interessantes que inevitavelmente estimulam outros a correr riscos e a criar a sua própria marca.
O minimal e o techno são sub-géneros soberanos na electrónica alemã. De alguma forma nadas contra a corrente ou chegam a influenciar-se mutuamente?
Não creio estar inserido na corrente. Se fores a Berlim hoje só ouves Deep House, como só ouvirias Minimal há 4 anos atrás. Disco? Nunca chegou a acontecer… Procuro absorver o que é interessante mas não me preocupa em demasia estar inserido nesse circuito.
Desde sempre sentiste essa vontade de internacionalização?
Estaria a mentir se dissesse que não. Comecei a mostrar as minhas coisas online e a noção de "território" não existiu de início, o que, pessoalmente, foi bom. Fico profundamente feliz de saber que, algures no outro lado do mundo, alguém pode esboçar um sorriso a ouvir uma linha de baixo minha. Quiçá até se levantar da cadeira e dar um pézinho de dança.
Compôr e tocar com amigos é sempre uma experiência diferente. O que ressalvas da junção dos artistas da Discotexas como banda? Quais foram as principais dificuldades?
Acho que a melhor parte é que sem a banda seríamos todos eremitas de cavernas escuras (também conhecidas por estúdios). A possibilidade de partilharmos um palco a tocar as nossas próprias coisas é um privilégio enorme. Claro que há dificuldades… Se calhar aquela guitarra naquela malha demorou 230459823 takes a fazer e agora tem que ser tocada sem falhas num só, em palco. Esse desafio, e vencê-lo, é a força motriz.
© Nian Canard
A música electrónica não está enraizada na cultura portuguesa e é muitas vezes mencionada de forma pejorativa. Como vês a indústria e público portugueses?
Qual indústria!? Acho que esses estigmas tendem a desaparecer, Tal como globalmente já não há fronteiras claras entre pop, electronica e indie, essa noção heterogénea acaba por chegar cá e fazer-nos igualmente bem. A música feita em Portugal está cada vez melhor e, pela primeira vez desde que me lembro, não tem complexos de inferioridade.
Flora é o teu primeiro álbum. É o culminar de toda a tua experiência até aqui? Em quê que diverge essencialmente dos outros trabalhos?
É, mas não é uma "retrospectiva". É mais diverso, creio, porque não existe uma necessidade imediata de ser "para a pista". Mas tentei que tivesse um fio condutor - que seja Moullinex e que idealmente abra portas para o que Moullinex pode ser a seguir.
A tua sonoridade é inevitavelmente dançável. Nas actuações ao vivo sentes que há algo que acresce à tua música?
Gosto de pensar ao contrário. Apesar de ser feita para dançar e para ser consumida em grupo, também procuro dar-lhe um cariz pessoal - ser detalhista, conferir-lhe várias camadas - para que possa ser consumida intimamente. Esse é o objectivo, pelo menos.
Tocaste num festival sueco 'lado-a-lado' com The Cure, M83 ou Justice. O que mais podes esperar da tua carreira neste momento?
Nesta altura, tocar como DJ ou ao vivo ocupa-me os fins de semana até bem dentro de 2013. Ter acabado o álbum permite-me ocupar o resto do tempo a fazer música nova, seja para mim ou para outros, o que é, de certo, a minha actividade favorita. Isto e preparar os singles e vídeos seguintes do Flora.
alexandrajoaomartins@gmail.com
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