ENTREVISTAS
The Parkinsons
Regresso à vida
· 02 Nov 2012 · 17:23 ·
© Garagem
Para quem gosta de rock 'n' roll português - em inglês - certamente dispensam apresentações. Pedro Chau (que respondeu às perguntas desta entrevista), Victor Torpedo, Afonso Pinto e Kaló nascidos em Coimbra na época de 70, semearam desde sempre o espírito rebelde através da música ainda debaixo de um ambiente socio-cultural retrógrado. Em 2000 mudam-se para Londres e formam os The Parkinsons. Os ares londrinos de uma Inglaterra avançada musicalmente, nomeadamente no movimento punk, deram-lhes uma agitação que acabaria por vir a ser muitas vezes polémica e controversa. Tocam no Reading Festival em 2001 e são reconhecidos pela irreverência caótica ao vivo. Entre o frenesim de concertos, festas e empregos detestados, lançam o primeiro álbum em 2002, intitulado A Long Way to Nowhere, que é bem recebido pela crítica britânica. Dois anos mais tarde é a vez de New Wave e em 2005 regressam às origens para editar Down with the Old World, pela Rastilho. Passados oito anos estão de volta, como insinua o próprio nome do disco, Back To Life. Apesar de amadurecidos, há coisas que nunca mudam.
O que estiveram a fazer nestes oitos anos em que não gravaram?

O Victor e eu tivemos os Blood Safari. O Afonso teve os Johnny Throttle, tocou bateria nos Phobics e tocou também com uma banda que já não me lembro do nome, em que fazia parte o Dave Treguna (baixista original dos Sham 69 e Lords of the New Church). Depois o Victor teve os Tiguana Bibles e ao mesmo tempo o projecto de Artes plásticas Sardine & Tobleroni.

Depois de "Down To the Old World" e "A Long Way To Nowhere" como é regressar a estúdio? As canções foram acumulando na bagagem ou foram compostas agora de rajada?

Regressar a estúdio foi uma boa surpresa e inesperada, tendo em conta que a proposta para gravar um novo disco também surgiu de repente. Apesar de os Parkinsons serem um grupo com um maior impacto em concertos ao vivo, agrada-nos a ideia de estar em estúdio e experimentar novas possibilidades, overdubs e outras ideias que possam ocorrer no processo de gravação. Por um lado não gostamos de produções demoradas e excessivas, por outro, não gostamos de ficar apenas pela captação da banda a tocar em tempo real. As músicas foram compostas pelo Victor de rajada, é mesmo essa a palavra.

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Estão mais maduros e a irreverência é quase intrínseca à jovialidade. Quais são as principais diferenças entre os The Parkinsons de agora e os de há uma década atrás?

O passar de alguns anos deu-nos uma maior experiência e como evitar conflitos desnecessários. Sabemos lidar com o exterior com mais calma, mas isso não significa que estejamos interiormente mais calmos porque a irreverência, o inconformismo, a raiva e a angústia de viver num mundo como este, está bem presente em nós. No início, em Londres tudo era ao acaso, acidental, as coisas surgiam a um ritmo tão rápido que nem tínhamos tempo para pensar nas nossas acções. Agora é diferente, em Portugal tudo é tão lento que chegamos a pensar demasiado.

A vossa estadia em Londres marcou indelevelmente a vossa música e o modo como a fazem. O que vos ofereceu a capital britânica em termos de experiências sonoras?

Ofereceu-nos uma variedade de experiências que nos marcou definitivamente a nível individual e como banda. Os primeiros anos do grupo foram marcados por imensos episódios de loucura e aventura após os concertos em que algumas vezes chegaram mesmo a acabar em conflito. As festas, os clubes, as lojas de discos, os mercados em segunda mão e os empregos que detestávamos e nos faziam explodir ao fim de semana, eram o nosso circuito. Ao princípio eramos como um gang e, talvez por isso, chamávamos tanta atenção. Lembro-me de fazer a primeira parte dos Suicide no ICA e de quando estávamos a acabar de gravar o primeiro disco em casa do Jim Reid e o Ben Lurie, ambos dos Jesus & Mary Chain. Foi muito bom termos tido acesso a essa gente que nos marcou. Mas, em geral, todas as semanas íamos a concertos e convivíamos com pessoas ligadas à música.

Os Tédio Boys, dos quais fizeram parte dois de vocês, explodiram nos Estados Unidos da América. Os Parkinsons vociferaram em Inglaterra. Encontram alguma explicação para o facto de não ter resultado em Portugal como resultou além fronteiras?

Resultar ou não resultar é uma palavra perversa neste contexto. Nós, estejamos onde quer que estejamos, representamos aquilo que somos e dá sentido às nossas vidas, depois se tem efeito ou não, depende do exterior. Em Portugal as coisas ocorrem de outra forma porque as condições sociais e culturais são outras.
Num país conservador, católico, de mentalidade salazarista como Portugal não admira que um grupo como o nosso, de agitação e provocação, seja mantido a um canto pelas instituições que dominam. Penso que os ideais de contra cultura dos anos 60 e a mensagem do punk do final dos 70 já foram esquecidos neste país, mas com a situação de desespero que agora estamos a viver, espero que isso venha a mudar.

Andam neste momento em digressão por cá. Como está a correr?

A digressão está a correr bem, em todos os concertos temos tido uma boa reação ou feedback.
Esperávamos que os concertos pudessem ter algum efeito libertador e de agitação para a vida das pessoas e tiveram, acho, tendo em conta as reacções. Mas não vamos ficar por aí. Em breve, vamos anunciar mais datas em Portugal.

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A vossa geração foi de facto muito frutífera em termos musicais em Coimbra, desde JP Simões a Sean Riley. O que pensam sobre a actual actividade cultural em Coimbra?

Creio que a maior parte dessa geração já não vive em Coimbra. Para mim é difícil e triste falar de Coimbra. Vejo a cidade com pessimismo e frustração. Existem os aborrecidos espectáculos culturais direcionados para o povo provinciano-burguês, apoiados pelas Instituições e, existem as artes marginalizadas, que não podem contar com apoio de ninguém porque não geram lucro. Sinto Coimbra como um fantasma eternamente amaldiçoado por uma tradição universitária que infantiliza, estupidifica e corrompe a juventude e a sociedade.

Sobre este Back to Life, todo o trabalho é feito por vocês, inclusive videoclips e artwork, levando à letra o lema "Do It Yourself". Acreditam que há coisas que nunca mudam?

Há coisas que não podem mudar senão deixam de fazer sentido quebrando a essência da banda. A decisão sobre o lado criativo do grupo será sempre feita pelos mesmos de forma independente.

Já disponibilizaram o single "Good Reality" para download gratuito. Qual a vossa posição em relação à partilha de ficheiros na internet?

Não dizemos que não à pirataria porque gostamos de piratas Sabemos no entanto que é um assunto bastante complexo que suscita diferentes pontos de vista. É uma forma eficaz de um artista mostrar o seu trabalho ou divulgá-lo. A Internet veio democratizar a informação, portanto não podemos criminalizar a partilha de ficheiros. Há pessoas que não compram música e isso já tem a ver com a ética e moral de cada um. Eu partilho ficheiros na internet porque antes de comprar gosto de ouvir para saber se é mesmo o que quero. Obviamente que o nosso formato favorito e de culto é o vinil, tanto pela beleza estética como pela pureza e autenticidade do som.

Como descreveriam este disco em três palavras? Rock, punk e suor não contam.

Romântico, imediato e merecido.
Alexandra João Martins
alexandrajoaomartins@gmail.com

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