ENTREVISTAS
A Jigsaw
Convite aos blues
· 08 Mar 2012 · 23:04 ·
Cinco anos após o vosso primeiro disco, como encaram o percurso trilhado até agora? Há algo que queiram destacar?
JR: Tem sido um percurso sem dúvida bastante interessante, desde a edição do Letters From The Boatman. Julgamos que um dos principais destaques seja o momento da nossa internacionalização, quando editámos o nosso segundo álbum, Like The Wolf, em 2009. Foi um momento bastante importante, porque começámos a receber bastante feedback positivo da crítica especializada internacional, desde os EUA, Holanda, França, Espanha, Itália.
Sendo que vocês são um grupo de multi-instrumentistas, é-vos relativamente fácil entrar num estúdio com ideias para canções? As três peças do vosso puzzle encaixam bem umas nas outras?
JR: É um processo que temos vindo a refinar ao longo dos anos, mas a questão das ideias para canções é trabalhada muito antes de entrarmos em estúdio. Antes dessa parte da gravação, nós isolamo-nos sempre na nossa Casa Azul, o nosso porto de abrigo, onde os três, munidos de mil e um instrumentos, vamos compondo as canções. É das partes mais importantes do nosso processo de composição de um álbum, pois é aí que estudamos a estética que vamos seguir e onde temos espaço e tempo; sobretudo tempo, para escolher muito bem que instrumentos serão usados e em que músicas, porque a intenção é sempre que eles sirvam a canção e não o oposto. É aí que encontramos a forma de encaixar as peças do nosso puzzle. Quando entramos em estúdio já sabemos muito bem como vai soar o álbum. Acaba por ser um processo de decalque onde tentamos que a técnica e a emoção sejam capturadas da forma mais fiel pelos microfones.
Muito se escreve sobre as raízes da vossa música na americana, o que é notório ao escutar-vos. Este fascínio pela América vem apenas das canções de que gostam ou é algo mais?
JR: Essas palavras que se dizem acerca da nossa música reflectem as nossas raízes, que começam nos blues. É aí que começa toda a música. E talvez não sejam só as canções, mas também a forma como elas surgiram e evoluíram. No nosso caso é uma questão de nunca esquecermos as raízes da música que fazemos. Isto depois traduz-se na nossa forma de fazer as coisas, de procurar a pureza do som original dos instrumentos. O nosso fascínio acaba por ser uma paixão por raízes. Pelas raízes da música que fazemos e pelas nossas próprias raízes. Mas se formos mais fundo ainda, acabamos por perceber que mesmo a maior parte dessas raízes vêm da Europa, de África, etc.. A América, no final, é onde essas raízes se acabaram por estabelecer e só muito superficialmente diríamos que é aí que elas nascem.
Em 2011 lançaram o vosso terceiro disco, Drunken Sailors & Happy Pirates. Qual foi o estado de espírito durante as gravações? Que têm achado da recepção dos ouvintes ao mesmo, e até mesmo da imprensa, com a Les Inrockuptibles a considerar-vos uma das bandas a seguir em 2012?
JR: Durante as gravações o nosso estado de espírito não poderia ter sido melhor. Sabíamos que tínhamos entre mãos das melhores canções que havíamos composto. E não há nada melhor do que essa sensação de que o que se vai gravar é realmente algo muito importante. Quanto à recepção da nossa música pelos ouvintes e pela imprensa, não poderia ser melhor. Nós sabíamos que este seria um álbum denso, negro e quiçá até complicado em termos comerciais, mas a verdade é que parece ter tido o efeito inverso ao que esperávamos, pois tem atraído bastante a atenção tanto dentro de portas como fora delas.
Tal como Letters From The Boatman e Like The Wolf, Drunken... é um disco conceptual, correcto? Para vocês, os melhores discos são também aqueles que contam as melhores histórias? Que se não desviam de uma temática principal?
JR: Talvez seja um pouco redutor afirmar que os melhores discos serão os que não se desviam de uma temática principal. Há tantos discos que fogem desta linha e que nós tanto gostamos, que não seria correcto dizer que esses são os melhores simplesmente porque também os fazemos. Mas para nós enquanto criadores o formato de álbum conceptual é o que mais faz sentido, porque escrevemos os álbuns como se estivéssemos a escrever um livro, onde a coesão é algo que tem de partir desde a raíz, ou seja, a partir de uma ideia basilar, de um conceito. Se assim o não fizéssemos, os álbuns seriam apenas um conjunto de canções unidas temporalmente e não conceptualmente.
Logo de seguida, fizeram também uma homenagem em formato cassete ao Nuno Ávila, que há 12 anos passou, na RUC, a vossa primeira canção. I Have Been Away For So Long é um tributo, uma forma de descansar do processo criativo (já que é um EP essencialmente de versões), um lado B do Drunken... ou todas/nenhuma destas coisas?
JR: Esta cassete é uma das 12 edições que vamos lançar que estão relacionadas com o Drunken... e com os nossos 12 anos. Não diríamos que é uma forma de descansar do processo criativo porque quando construímos uma versão de outro artista gostamos de o transformar até ao ponto em que podemos dizer: agora esta canção poderia ter sido escrita por nós. E este é naturalmente um processo moroso que obriga a uma dedicação igual à escrita de uma canção. Mas cremos que seja a melhor forma de homenagear o coração de uma canção. E como esta edição relacionada com o Drunken... era também ela uma dedicação ao Nuno Ávila, não nos poupámos a esforços para encontrar a coesão e espaço destas canções dentro da estética do Drunken Sailors & Happy Pirates.
JR: Em Março e Abril irão estar francamente ocupados, com uma tour pela Espanha, Alemanha, Holanda... Não sendo a vossa primeira digressão por países europeus, o que esperam desta que não tenha acontecido antes? Sentem que conseguiram construir uma audiência lá fora, como por exemplo o Tigerman em França?
JR: Não sendo a nossa primeira tour fora de Portugal, já começamos a sentir os efeitos do nosso regresso a países onde já estivemos, nomeadamente através do feedback e interesse da imprensa. E depois dependendo do país e à nossa presença física nele, esse feedback é mais intenso, nomeadamente em Espanha, onde por exemplo o primeiro concerto desta tour estava esgotado. Já o havíamos sentido durante a tour de promoção por Espanha com as salas sempre lotadas. Espanha talvez seja mesmo neste momento o país que melhor nos tem recebido nesses termos. Tanto pelo apoio que temos da rádio nacional Rádio 3, como de uma das mais importantes revistas - Ruta 66 - e mesmo da Gibson. E temos conseguido chegar a cada vez mais público. Naturalmente que isto não era assim quando começámos a tocar em Espanha em 2010, até porque era a primeira vez que apresentávamos a nossa música no país vizinho. É certo que havia já algum burburinho na imprensa e em algum público devido à excelente aceitação que teve lá o Like The Wolf, mas esta evolução que houve para o novo álbum deixa-nos bastante animados agora com o nosso regresso à Europa.
Já que nessa tour estão incluídos workshops de como escrever uma canção, têm alguma dica para dar a quem estiver a ler ou o melhor é mesmo ir ver-vos?
JR: Esses workshops serão sem dúvida curiosos. É algo intangível, o processo de escrita de uma canção. Não há métodos correctos ou errados. No final, se a canção emerge sabe-se lá de onde, o método acaba por ser menos importante. De dicas... como dizia o Saramago, para escrever é necessário ler. Para escrever música é necessário ouvir também, para além de ler. E nesta sequência de ideias, não seria mau ir ver-nos. A nós, como a outros grupos, é claro.
Paulo CecílioJR: Tem sido um percurso sem dúvida bastante interessante, desde a edição do Letters From The Boatman. Julgamos que um dos principais destaques seja o momento da nossa internacionalização, quando editámos o nosso segundo álbum, Like The Wolf, em 2009. Foi um momento bastante importante, porque começámos a receber bastante feedback positivo da crítica especializada internacional, desde os EUA, Holanda, França, Espanha, Itália.
Sendo que vocês são um grupo de multi-instrumentistas, é-vos relativamente fácil entrar num estúdio com ideias para canções? As três peças do vosso puzzle encaixam bem umas nas outras?
JR: É um processo que temos vindo a refinar ao longo dos anos, mas a questão das ideias para canções é trabalhada muito antes de entrarmos em estúdio. Antes dessa parte da gravação, nós isolamo-nos sempre na nossa Casa Azul, o nosso porto de abrigo, onde os três, munidos de mil e um instrumentos, vamos compondo as canções. É das partes mais importantes do nosso processo de composição de um álbum, pois é aí que estudamos a estética que vamos seguir e onde temos espaço e tempo; sobretudo tempo, para escolher muito bem que instrumentos serão usados e em que músicas, porque a intenção é sempre que eles sirvam a canção e não o oposto. É aí que encontramos a forma de encaixar as peças do nosso puzzle. Quando entramos em estúdio já sabemos muito bem como vai soar o álbum. Acaba por ser um processo de decalque onde tentamos que a técnica e a emoção sejam capturadas da forma mais fiel pelos microfones.
Muito se escreve sobre as raízes da vossa música na americana, o que é notório ao escutar-vos. Este fascínio pela América vem apenas das canções de que gostam ou é algo mais?
JR: Essas palavras que se dizem acerca da nossa música reflectem as nossas raízes, que começam nos blues. É aí que começa toda a música. E talvez não sejam só as canções, mas também a forma como elas surgiram e evoluíram. No nosso caso é uma questão de nunca esquecermos as raízes da música que fazemos. Isto depois traduz-se na nossa forma de fazer as coisas, de procurar a pureza do som original dos instrumentos. O nosso fascínio acaba por ser uma paixão por raízes. Pelas raízes da música que fazemos e pelas nossas próprias raízes. Mas se formos mais fundo ainda, acabamos por perceber que mesmo a maior parte dessas raízes vêm da Europa, de África, etc.. A América, no final, é onde essas raízes se acabaram por estabelecer e só muito superficialmente diríamos que é aí que elas nascem.
Em 2011 lançaram o vosso terceiro disco, Drunken Sailors & Happy Pirates. Qual foi o estado de espírito durante as gravações? Que têm achado da recepção dos ouvintes ao mesmo, e até mesmo da imprensa, com a Les Inrockuptibles a considerar-vos uma das bandas a seguir em 2012?
JR: Durante as gravações o nosso estado de espírito não poderia ter sido melhor. Sabíamos que tínhamos entre mãos das melhores canções que havíamos composto. E não há nada melhor do que essa sensação de que o que se vai gravar é realmente algo muito importante. Quanto à recepção da nossa música pelos ouvintes e pela imprensa, não poderia ser melhor. Nós sabíamos que este seria um álbum denso, negro e quiçá até complicado em termos comerciais, mas a verdade é que parece ter tido o efeito inverso ao que esperávamos, pois tem atraído bastante a atenção tanto dentro de portas como fora delas.
Tal como Letters From The Boatman e Like The Wolf, Drunken... é um disco conceptual, correcto? Para vocês, os melhores discos são também aqueles que contam as melhores histórias? Que se não desviam de uma temática principal?
JR: Talvez seja um pouco redutor afirmar que os melhores discos serão os que não se desviam de uma temática principal. Há tantos discos que fogem desta linha e que nós tanto gostamos, que não seria correcto dizer que esses são os melhores simplesmente porque também os fazemos. Mas para nós enquanto criadores o formato de álbum conceptual é o que mais faz sentido, porque escrevemos os álbuns como se estivéssemos a escrever um livro, onde a coesão é algo que tem de partir desde a raíz, ou seja, a partir de uma ideia basilar, de um conceito. Se assim o não fizéssemos, os álbuns seriam apenas um conjunto de canções unidas temporalmente e não conceptualmente.
Logo de seguida, fizeram também uma homenagem em formato cassete ao Nuno Ávila, que há 12 anos passou, na RUC, a vossa primeira canção. I Have Been Away For So Long é um tributo, uma forma de descansar do processo criativo (já que é um EP essencialmente de versões), um lado B do Drunken... ou todas/nenhuma destas coisas?
JR: Esta cassete é uma das 12 edições que vamos lançar que estão relacionadas com o Drunken... e com os nossos 12 anos. Não diríamos que é uma forma de descansar do processo criativo porque quando construímos uma versão de outro artista gostamos de o transformar até ao ponto em que podemos dizer: agora esta canção poderia ter sido escrita por nós. E este é naturalmente um processo moroso que obriga a uma dedicação igual à escrita de uma canção. Mas cremos que seja a melhor forma de homenagear o coração de uma canção. E como esta edição relacionada com o Drunken... era também ela uma dedicação ao Nuno Ávila, não nos poupámos a esforços para encontrar a coesão e espaço destas canções dentro da estética do Drunken Sailors & Happy Pirates.
JR: Em Março e Abril irão estar francamente ocupados, com uma tour pela Espanha, Alemanha, Holanda... Não sendo a vossa primeira digressão por países europeus, o que esperam desta que não tenha acontecido antes? Sentem que conseguiram construir uma audiência lá fora, como por exemplo o Tigerman em França?
JR: Não sendo a nossa primeira tour fora de Portugal, já começamos a sentir os efeitos do nosso regresso a países onde já estivemos, nomeadamente através do feedback e interesse da imprensa. E depois dependendo do país e à nossa presença física nele, esse feedback é mais intenso, nomeadamente em Espanha, onde por exemplo o primeiro concerto desta tour estava esgotado. Já o havíamos sentido durante a tour de promoção por Espanha com as salas sempre lotadas. Espanha talvez seja mesmo neste momento o país que melhor nos tem recebido nesses termos. Tanto pelo apoio que temos da rádio nacional Rádio 3, como de uma das mais importantes revistas - Ruta 66 - e mesmo da Gibson. E temos conseguido chegar a cada vez mais público. Naturalmente que isto não era assim quando começámos a tocar em Espanha em 2010, até porque era a primeira vez que apresentávamos a nossa música no país vizinho. É certo que havia já algum burburinho na imprensa e em algum público devido à excelente aceitação que teve lá o Like The Wolf, mas esta evolução que houve para o novo álbum deixa-nos bastante animados agora com o nosso regresso à Europa.
Já que nessa tour estão incluídos workshops de como escrever uma canção, têm alguma dica para dar a quem estiver a ler ou o melhor é mesmo ir ver-vos?
JR: Esses workshops serão sem dúvida curiosos. É algo intangível, o processo de escrita de uma canção. Não há métodos correctos ou errados. No final, se a canção emerge sabe-se lá de onde, o método acaba por ser menos importante. De dicas... como dizia o Saramago, para escrever é necessário ler. Para escrever música é necessário ouvir também, para além de ler. E nesta sequência de ideias, não seria mau ir ver-nos. A nós, como a outros grupos, é claro.
pauloandrececilio@gmail.com
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