ENTREVISTAS
Osso Vaidoso
Osso duo de roer
· 09 Fev 2012 · 00:55 ·
Vocês já não editavam discos há bastante tempo. O que andaram a fazer entretanto?
De propósito ou por vício de fazer, andei à procura de formas mais simples onde reencontrasse a ligação com as palavras. Coisas mais disparadas, rítmicas. Encontrei textos de Ernesto Melo e Castro e Alberto Pimenta que me ajudaram a fazer esse desvio, e fiz alguns espectáculos só com voz, ou com pequenas fontes sonoras. Também trabalhei com pessoal do teatro e nas rotinas desses espectáculos perdi algum medo do palco. Em suma, andei a aprender e a fazer disparates que também fazem bem.
O que vos levou a reencontrarem-se e a criarem um projecto tão diferente do que tinham feito nos Três Tristes Tigres?
Foi um acaso, mas ainda bem. Reencontrámo-nos num espectáculo dos Dead Combo no Plano B, tocámos duas ou três músicas, correu bem e ficou a vontade de fazermos outra vez qualquer coisa. Entretanto já tinha alguns textos para fazer e fazer diferente, que era o que eu queria, e como o Alexandre também não gosta de bater sempre na mesma corda o processo foi andando naturalmente.
Voltaram a juntar-se para um espectáculo no Cinema São Jorge, há quase dois anos, seguindo-se mais de um ano de actuações, antes de surgir este disco. Quais são as principais diferenças que encontram, ao nível das músicas, entre as primeiras vezes que tocaram os temas ao vivo e a gravação de estúdio?
Alguns ficaram pelo caminho, outros foram nascendo, e a gravação é só mais um take ao vivo, pois gravámos quase tudo a tocar ao mesmo tempo, cada um na sua salinha. Entre o nascimento desse registo e os concertos há sempre diferenças e as músicas vão-se compondo, têm alguma vida própria. Ficam mais fluidas.
Neste disco os textos estão no centro das composições e nota-se o cuidado de os instrumentos respeitarem o papel do que se canta. É o gosto de fazer as palavras dançarem ao sabor da música que está na base disto?
Foi o que começou primeiro. No princípio era o Verbo, já dizia o avô cantigas! Os textos deram o mote, a guitarra deu-lhes... o resto. E sim, quando a coisa está bem cosida é delicioso de cantar, meter as palavras no sítio e dar-lhes corda.
O nome da banda foi arranjado à pressa e foi ficando. Mas também é um nome que acaba por ser adequado a uma época em que a carne acabou e temos que roer os ossos para matar a fome, não? Podemos até imaginar uma certa metáfora na imagem da capa, com a mosca que paira sobre um osso descarnado…
O tempo é austero mas sempre vivi assim, pouco gosto por luxos mas muito por um estar à vontade que não tem preço. E a mosca é o animal pequeno que sobrevive e vive da morte... e havia muitas vezes uma mosquinha à volta do meu microfone durante as gravações...
O disco é muito depurado em termos sonoros, sem grandes aparatos. Quase como descarnar o Osso até ao essencial?
Eu sei que as músicas são simples, mas para mim está o que é preciso. Ao invés de descarnar foi não tapar, não maquilhar. E também não precisar de mais ninguém, não perder mais tempo. Ser o mais leve possível e fiel ao que se quer.
O single (e tema-título) “Animal” é uma brincadeira sobre a dualidade que existe entre uma certa alergia ao mundo e os vossos/nossos vícios animais e carnais?
Pois, é uma brincadeira mesmo. Somos cada vez mais alérgicos ao mundo e o mundo a nós, com tanta porcaria que fazemos. Parece que perdemos a ligação e que somos feitos de plástico. Valhe-nos o Santo Sexo que nos põe no sítio!
Existem letras de Regina Guimarães, Alberto Pimenta e Valter Hugo Mãe – foram à procura de algo concreto quando pegaram em letras destes autores?
As letras tinham que agradar aos dois, algumas foram à vida. Umas foram mais ou menos "encomendadas", como a “Poligamia”, do Valter Hugo Mãe, o “Elogio da Pobreza” e o “Bem Mal”, adaptações feitas pela Regina Guimarães de uma canção da Nina Simone e de um poema de Charles Cros; outras surgiram na Leitura Furiosa e as do Alberto Pimenta são poemas encontrados na Obra Quase Incompleta. Tem a ver com o assunto e a forma como estão escritas. Não escolhi poemas difíceis de cantar. Têm muito ritmo, o que à partida já lhes dá lanço. No caso do Alberto Pimenta, a estrutura do poema foi tão determinante que não têm refrão, são canções em linha recta que crescem em intensidade.
Alguns temas do disco surgiram de conversas com jovens, emigrantes e escritores. Como despontaram estas ideias? E como trabalharam essa matéria-prima?
Nós não estivemos presentes nessas conversas. A Leitura Furiosa, que é o nome desses encontros, tem um funcionamento muito especial. Só os escritores é que estão nas conversas com os grupos de "zangados com a leitura". Mas sabemos que é um espaço de liberdade onde quem escreve vai ao encontro das palavras dos que não escrevem, sem moralizar ou regular. Nós recebemos os textos e fizemos canções de alguns. Outros são apenas lidos. Dessas canções que fizemos, escolhemos as que nos pareceram melhores para o Animal. E não é por acaso que são as três da Regina, apesar de haver outros escritores, os dela já vinham "cantáveis".
Concordam se disser que este é um disco bastante avesso a rótulos, tanto musical como liricamente?
Pois...
Hugo Rocha PereiraDe propósito ou por vício de fazer, andei à procura de formas mais simples onde reencontrasse a ligação com as palavras. Coisas mais disparadas, rítmicas. Encontrei textos de Ernesto Melo e Castro e Alberto Pimenta que me ajudaram a fazer esse desvio, e fiz alguns espectáculos só com voz, ou com pequenas fontes sonoras. Também trabalhei com pessoal do teatro e nas rotinas desses espectáculos perdi algum medo do palco. Em suma, andei a aprender e a fazer disparates que também fazem bem.
O que vos levou a reencontrarem-se e a criarem um projecto tão diferente do que tinham feito nos Três Tristes Tigres?
Foi um acaso, mas ainda bem. Reencontrámo-nos num espectáculo dos Dead Combo no Plano B, tocámos duas ou três músicas, correu bem e ficou a vontade de fazermos outra vez qualquer coisa. Entretanto já tinha alguns textos para fazer e fazer diferente, que era o que eu queria, e como o Alexandre também não gosta de bater sempre na mesma corda o processo foi andando naturalmente.
Voltaram a juntar-se para um espectáculo no Cinema São Jorge, há quase dois anos, seguindo-se mais de um ano de actuações, antes de surgir este disco. Quais são as principais diferenças que encontram, ao nível das músicas, entre as primeiras vezes que tocaram os temas ao vivo e a gravação de estúdio?
Alguns ficaram pelo caminho, outros foram nascendo, e a gravação é só mais um take ao vivo, pois gravámos quase tudo a tocar ao mesmo tempo, cada um na sua salinha. Entre o nascimento desse registo e os concertos há sempre diferenças e as músicas vão-se compondo, têm alguma vida própria. Ficam mais fluidas.
Neste disco os textos estão no centro das composições e nota-se o cuidado de os instrumentos respeitarem o papel do que se canta. É o gosto de fazer as palavras dançarem ao sabor da música que está na base disto?
Foi o que começou primeiro. No princípio era o Verbo, já dizia o avô cantigas! Os textos deram o mote, a guitarra deu-lhes... o resto. E sim, quando a coisa está bem cosida é delicioso de cantar, meter as palavras no sítio e dar-lhes corda.
O nome da banda foi arranjado à pressa e foi ficando. Mas também é um nome que acaba por ser adequado a uma época em que a carne acabou e temos que roer os ossos para matar a fome, não? Podemos até imaginar uma certa metáfora na imagem da capa, com a mosca que paira sobre um osso descarnado…
O tempo é austero mas sempre vivi assim, pouco gosto por luxos mas muito por um estar à vontade que não tem preço. E a mosca é o animal pequeno que sobrevive e vive da morte... e havia muitas vezes uma mosquinha à volta do meu microfone durante as gravações...
O disco é muito depurado em termos sonoros, sem grandes aparatos. Quase como descarnar o Osso até ao essencial?
Eu sei que as músicas são simples, mas para mim está o que é preciso. Ao invés de descarnar foi não tapar, não maquilhar. E também não precisar de mais ninguém, não perder mais tempo. Ser o mais leve possível e fiel ao que se quer.
O single (e tema-título) “Animal” é uma brincadeira sobre a dualidade que existe entre uma certa alergia ao mundo e os vossos/nossos vícios animais e carnais?
Pois, é uma brincadeira mesmo. Somos cada vez mais alérgicos ao mundo e o mundo a nós, com tanta porcaria que fazemos. Parece que perdemos a ligação e que somos feitos de plástico. Valhe-nos o Santo Sexo que nos põe no sítio!
Existem letras de Regina Guimarães, Alberto Pimenta e Valter Hugo Mãe – foram à procura de algo concreto quando pegaram em letras destes autores?
As letras tinham que agradar aos dois, algumas foram à vida. Umas foram mais ou menos "encomendadas", como a “Poligamia”, do Valter Hugo Mãe, o “Elogio da Pobreza” e o “Bem Mal”, adaptações feitas pela Regina Guimarães de uma canção da Nina Simone e de um poema de Charles Cros; outras surgiram na Leitura Furiosa e as do Alberto Pimenta são poemas encontrados na Obra Quase Incompleta. Tem a ver com o assunto e a forma como estão escritas. Não escolhi poemas difíceis de cantar. Têm muito ritmo, o que à partida já lhes dá lanço. No caso do Alberto Pimenta, a estrutura do poema foi tão determinante que não têm refrão, são canções em linha recta que crescem em intensidade.
Alguns temas do disco surgiram de conversas com jovens, emigrantes e escritores. Como despontaram estas ideias? E como trabalharam essa matéria-prima?
Nós não estivemos presentes nessas conversas. A Leitura Furiosa, que é o nome desses encontros, tem um funcionamento muito especial. Só os escritores é que estão nas conversas com os grupos de "zangados com a leitura". Mas sabemos que é um espaço de liberdade onde quem escreve vai ao encontro das palavras dos que não escrevem, sem moralizar ou regular. Nós recebemos os textos e fizemos canções de alguns. Outros são apenas lidos. Dessas canções que fizemos, escolhemos as que nos pareceram melhores para o Animal. E não é por acaso que são as três da Regina, apesar de haver outros escritores, os dela já vinham "cantáveis".
Concordam se disser que este é um disco bastante avesso a rótulos, tanto musical como liricamente?
Pois...
hrochapereira@bodyspace.net
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