ENTREVISTAS
The Lionheart Brothers
Patchwork
· 26 Nov 2007 · 08:00 ·
Os Lionheart Brothers fizeram um álbum repleto de sol não obstante esse ser um cenário pouco provável na sua nativa Noruega. O bodyspace falou com o vocalista, Marcus Forsgren, que, entre outras coisas, nos explicou como fazer um disco coeso a partir de retalhos.
Ao ouvir Dizzy Kiss, o álbum de estreia dos noruegueses Lionheart Brothers, é-nos difícil pensar num país frio e pardacento; é-nos também bastante complicado pensar em Dizzy Kiss enquanto um primeiro álbum, tal é o grau de maturidade que carrega em cada canção. Marcus explica-nos a sua fórmula: "Ouço música desde que me conheço; vários tipos de música, de diferentes proveniências e épocas. Gosto muito dos CAN e dos Stereolab, mas também dos Beach Boys, Cocteau Twins, The Cure, The Stooges e do Steve Reich. Neste momento ando embrenhado no Edward Grieg; é um compositor erudito norueguês que conseguiu combinar a tradição norueguesa com a vanguarda da época [mostrámos-lhe Fernando Lopes-Graça e gostou]. Também costumo ouvir, embora menos assiduamente, Gavin Bryars, Henry Cowell, Dimitri Shostakovich… imensa música erudita. Depois pego nos elementos que me interessam e começo a compor. Não penso em fronteiras estéticas; não gostaria de me reger apenas por um único rótulo e dizer "nós tocamos pós-rock" ou "nós tocamos shoegazing…". Penso que, tal como faz a maior parte dos artistas que admiro, devemos procurar as nossas influências em vários contextos porque um desafio só o é verdadeiramente quando o enfrentamos pela primeira vez".


Mas se os Lionheart Brothers se fazem de várias influências, o resultado não poderia ser mais coeso. Afunilando a variedade apresentada por Marcus ser-nos-ia possível apontar para as mais óbvias: Beach Boys, Strawberry Alarm Clock, Zombies, Tahiti 80 e Stereolab. O músico escapa-se aos demais e avança com uma memória que permanece translúcida nas palavras que utiliza. Lembra-se perfeitamente do dia em que descobriu Pet Sounds, dos Beach Boys: "Foi num dia cinzento, já se sabe. Era miúdo e andava à procura da minha identidade. Acontece-nos a todos, suponho. Naquela idade, os ídolos são importantíssimos; e uns tipos que viviam sob a imagem do surf, dos carros e das miúdas… bem, tudo aquilo me agradava. Foi nesse dia cinzento que comecei a gostar realmente de música. Ouvi o disco e, durante aqueles quarenta minutos, saí de mim, tive uma epifania. Penso que foi a partir desse momento que desejei ser músico e, com alguma sorte, poder provocar com a minha música uma reacção em tudo semelhante àquela que eu próprio tive da primeira vez que ouvi esse álbum".

Marcus passou à acção. Convenceu dois amigos a juntarem-se-lhe na aventura e, pouco depois, adoptando o nome de um conto da escritora Astrid Lindgren ("É uma história da qual todos gostávamos e pensámos que seria um bom nome para a banda".), nasciam os Lionheart Brothers. A formação actual, porém, apenas se estabeleceria dois anos mais tarde. "Os Lionheart Brothers já existiam antes do Audun [Storset, guitarrista] se juntar a nós. Ele era nosso fã e nós éramos fãs dele, pelo que, quando o nosso guitarrista desistiu, não foi difícil convencê-lo a juntar-se a nós. Eu já o tinha ouvido várias vezes ao vivo; saía de lá completamente estupefacto. Ele utilizava afinações pouco convencionais e a forma como distorcia ligeiramente a voz era muito sofisticada e agradável ao ouvido. Soube desde logo que, com ele, tínhamos pernas para andar". E tinham, de facto. Desde a edição de Dizzy Kiss, os Lionheart Brothers não mais deram descanso às pernas. Depois de encabeçarem os tops de vendas na Noruega («Bem, a Noruega é um país pequeno, pelo que não é preciso vender muitos discos...»), partiram para Austin, Texas, a fim de participarem no conceituado festival South by Southwest ("Foi estupendo! Não sou um grande fã de festivais: a oferta acaba sempre por se sobrepor ao tempo e à atenção dispensada a cada concerto – e o South by Southwest é, nesse aspecto, um festival levado ao seu extremo. Todavia, é sempre bom participar neste tipo de eventos: gosto de tocar para públicos diferentes".), e, após uma pequena digressão pela Noruega, viram editado o seu registo de estreia no Reino Unido e o primeiro single, “Hero Anthem”, ser eleito pela Q Magazine como "Track of the Day", no passado mês de Outubro.


Não é, portanto, de estranhar que o grupo sonhe com o futuro: "Estamos a planear fazer uma paragem para escrevermos canções novas. Mas antes ainda temos umas datas na Suécia, na Dinamarca e no Reino Unido. Talvez depois disso… A escrita e os ensaios são as partes que mais nos agradam. O processo de ver um álbum a tomar forma interessa-nos muito mais do que a vida de estrelas de rock – somos noruegueses e, talvez por isso, muito caseiros".
Samuel Pereira
an_american@paris.com
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